São Paulo, segunda-feira, 30 de setembro de 2002

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POLÍTICA DA IMAGEM

O vermelho e o azul

RENATA LO PRETE

Pouco antes do horário gratuito de 1998, a equipe que então cuidava do marketing de Lula decidiu "desavermelhar" a propaganda do candidato. Usou a cor histórica do partido apenas para pintar o número 13 e foi ao ar com muito branco, acrescido de toques de verde-e-amarelo.
"O que não queremos é apresentar um Lula raivoso e assim reforçar o preconceito contra ele", justificou à época um dos publicitários da campanha.
A diretriz durou um programa. Forte reação, dentro do PT, ao que se considerou uma descaracterização de imagem determinou a ressurreição do vermelho.
Com uma cor ou com outra, aquela foi uma disputa em tudo desfavorável ao petista, derrotado já no primeiro turno.
Hoje, filtrado pela lente de Duda Mendonça, o vermelho domina a propaganda de Lula. Não está apenas na estrela e nas bandeiras, mas em toda a ambiência dos programas de televisão.
Dá o tom da sala onde os "notáveis" se reúnem para ajudar Lula -e, desde a semana passada, também para aplaudi-lo, inflexão reveladora do cenário com que trabalha o marqueteiro. É a cor do fundo sobre o qual são projetados itens do "programa de governo", quadro de presença obrigatória no horário petista.
Preservando, de forma reciclada, a simbologia do partido, Duda Mendonça encontrou outros meios para suavizar a imagem de Lula e vaciná-la contra: a) preconceitos, na visão de simpatizantes; b) pontos fracos do candidato, no entender de adversários.
Para isso contribuiu, sem dúvida, o talento do marqueteiro. Mas seria equivocado enaltecer a comunicação e esquecer que a campanha petista é realizada em condições políticas ótimas.
Fala a um eleitorado majoritariamente desejoso de mudança e que viu seguidas opções não-lulistas caírem pelo caminho.
Enquanto seu principal adversário se enreda na tentativa de explicar que é governo, mas não muito, Lula está à vontade para vender na TV um futuro sem conflitos. No mundo encantado da propaganda petista, empresários e trabalhadores estarão sempre do mesmo lado, as invasões de terras vão acabar e o país, prometeu o candidato em debate recente, "não vai quebrar".
Nesse contexto, o vermelho dos programas não transmite "raiva", como se temia quatro anos atrás, mas calor e um sentimento "para cima". No horário de Lula não há sinal do Brasil triste, confinado às propagandas de Garotinho e principalmente de Ciro.
Em comparação, o azul tucano, que bem serviu FHC em 1994 e 1998, parece agora frio e "para baixo". A despeito do esforço publicitário, não está fácil achar quem acredite que "a mudança é azul", como canta Nana Caymmi em um dos jingles de Serra.
A culpa obviamente não é da cor, cuja principal função é dar à propaganda uma unidade visual, fazendo com que o eleitor a reconheça no mar de ofertas do horário gratuito. Mas o contraste ilustra bem a diferença de circunstâncias, tão favoráveis a Lula quanto adversas para Serra.
No fundo, a propaganda é julgada exclusivamente com base na situação do candidato na disputa. Os políticos tucanos que haviam aplaudido a ofensiva anti-Lula se voltaram contra os marqueteiros uma vez constatado o prejuízo nas pesquisas.
E os marqueteiros, que anunciaram com entusiasmo à imprensa o "início da guerra total", agora se consideram mal-interpretados, pois queriam apenas "debater idéias" e "apontar contradições". Como diz a peça teatral, assim é, se lhe parece.


A repórter RENATA LO PRETE escreve às segundas-feiras nesta coluna


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