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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ PT X PSDB
Articulador político do governo busca abrir negociação com tucanos e diz que oposição erra ao apostar no prolongamento das investigações
Wagner propõe fim da "guerra" nas CPIs
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ministro Jaques Wagner (Relações Institucionais) diz que o
ex-tesoureiro Delúbio Soares
"traiu a alma" do PT. Cobra "responsabilidade política" do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu,
mas não vê "fato concreto" que o
ligue ao "mensalão". Articulador
político do governo numa hora
em que PT e PSDB se digladiam,
Wagner propõe, em entrevista à
Folha, uma "pacificação" com a
oposição. Diz que uma guerra entre petistas e tucanos favorece
conservadores. Sugere que as investigações das três CPIs do Congresso sejam encerradas por acordo até 15 de dezembro e enviadas
ao Ministério Público, à Justiça e à
Polícia Federal. Afirma que o desgaste de Lula e do PT já "está consolidado" e que não deverá aumentar. Diz que será "equívoco" a
oposição estender mais as investigações para minar o PT por conta
da sucessão presidencial de 2006.
Acha que terá "efeito reverso".
Wagner diz que PT e PSDB têm
"elementos de identidade" e que
deveriam se entender em torno de
"agenda comum" para restaurar
o "bom senso" no Congresso.
Defende que Lula seja candidato à reeleição. Afirma que seria
"honra" receber convite para participar da campanha do presidente no ano que vem. Diz, porém,
que Lula não decidiu.
Aos 54 anos, Wagner se diz um
"judeu eclético". Acredita no candomblé (seu orixá é Oxalá, o pai
de todos os deuses dessa religião
afro-brasileira). E revela que, no
dia da eleição para o novo presidente da Câmara, ligou para um
primo que é monge budista no Japão e pediu "uma oração". Elegeu
Aldo Rebelo (PC do B-SP) presidente da Casa. A seguir trechos da
entrevista, dada na quinta-feira.
Folha - O pior da crise passou?
Jaques Wagner - Não gosto dessa
idéia. Enquanto houver turbulência política, que não chamo de crise, é ruim para todos.
Folha - O governo Lula e o PT já
pagaram o preço da crise ou ainda
se desgastarão mais?
Wagner - Do ponto de vista do
PT e do governo, está consolidado
o desgaste. Alguns da oposição
tentam prolongar mais o processo de investigação, acreditando
que isso pode desgastar mais ainda. É um equívoco. Sou suspeito
para falar, mas chega a um ponto
no qual a própria população se dá
conta de que o interesse maior
não é esclarecer e investigar. Vira
guerra política. Tem de investigar
e punir quem tem de ser punido.
Mas é ruim esse ambiente de muita tensão na Câmara e no Senado
entre governo e oposição. Perde-se o bom senso.
Folha - Qual é a saída?
Wagner - Enviar para o Ministério Público, a Justiça e a Polícia
Federal o que já está consolidado
das investigações. Concluir as investigações. Até 15 de dezembro
seria bom para todo mundo.
Folha - Não é dificílimo acordo
para encerrar as CPIs nesse prazo
no atual clima entre PT e PSDB?
Wagner - Na última semana, liguei
para o senador Eduardo Azeredo
e falei com o senador Arthur Virgílio [ambos do PSDB]. Na próxima, não terei dificuldade de procurar outros membros da oposição. Ultrapassada a convenção do
PSDB [dia 18], creio que o presidente do PT, Ricardo Berzoini,
não terá dificuldade para conversar com o novo presidente do
PSDB, o senador Tasso Jereissati.
Acima da disputa de 2006, há interesses nacionais. Falta um ano
para as eleições. Se o objetivo da
oposição era, em parte e dentro
do jogo político, desgastar a imagem do PT, o desgaste está consolidado. Se tentar aumentar o desgaste, haverá efeito reverso.
Folha - A oposição diz que o presidente e o PT estimulam esse clima
de guerra.
Wagner - Se eu estou como articulador político do presidente colocando essa posição, evidentemente reflito o que escuto dele.
Folha - O que o sr. escuta?
Wagner - Que é preciso criar um
clima para as coisas funcionarem
normalmente. Evidentemente,
após meses no qual ele e o PT apanharam muito, o presidente,
quando perguntado, tem dito que
os petistas precisam fazer disputa
política, defender o governo, defender as coisas boas que a gente
fez e se defender das acusações.
Alguns tentam carimbar o PT como o partido da corrupção, o que
nenhuma das investigações mostrou ser verdadeiro.
Folha - Se Lula estimula disputa
política, não é contraditório o sr.
falar em pacificação?
Wagner - No Parlamento, é absolutamente legítima a disputa
política. O ruim é a disputa deixar
de ser a respeito de projetos e virar luta pessoal, campeonato de
quem é mais ou menos honesto.
Folha - O ministro Luiz Dulci (Secretaria Geral) disse que FHC teve
ação antidemocrática na crise. O sr.
concorda?
Wagner - Na minha estratégia de
pacificação, prefiro não falar.
Quando o clima fica quente demais, qualquer opinião pode ser
mal interpretada. PT e PSDB têm
elementos de identidade na sua
origem e história. O PT se formou
abrindo espaço para segmentos
que não tinham participação na
política, com bandeira de justiça
social e de melhora das condições
de vida da população. O PSDB
também seguiu esse caminho. É
boa a luta de superação de um pelo outro. Alguém provar perante a
sociedade que seu projeto é melhor, que sua gestão é melhor.
Quando alguém para dizer que é
bom precisa provar que o outro é
ruim, faz guerra de destruição e
prejudica a democracia.
Folha - O sr. propõe, então, é um
limite para a luta política?
Wagner - Ou se estabelece um limite ou vira luta fratricida na qual
os dois morrem.
Folha - Se continuar a guerra, o
sr. vê espaço para uma terceira força conquistar a Presidência, um Anthony Garotinho (PMDB)?
Wagner - Se os dois partidos
mais fortes para 2006 se fragilizam, não tenho dúvida de que
mais de uma força se beneficiará.
É vantajoso para as outras forças
que trabalham em torno do PT,
do PSDB e que podem ter candidatura própria.
Folha - A guerra PT-PSDB favorece os conservadores? Aumenta a
dependência do governo do PMDB
e fortalece o PFL na aliança com o
PSDB?
Wagner - Favorece, mas não
quero transmitir arrogância. Respeito todos os candidatos e todos
os partidos. Todos têm legitimidade para concorrer com seu projeto político. No entanto, a busca
por aliados será mais difícil e custosa se PT e PSDB se fragilizarem.
Folha - A médio e longo prazos,
PT e PSDB não deveriam se entender numa aliança eleitoral?
Wagner - Insisto que, do ponto
de vista programático, eles têm
mais afinidades do que discordâncias. Quando entra na disputa
eleitoral, destacam-se as distâncias e não as proximidades.
Folha - O presidente do PSDB, José Serra, diz que o caso Azeredo
não se compara ao "mensalão". Ele
tem razão?
Wagner - Essa linha de argumentação é apostar no esquentamento do conflito. Depois de cinco meses de investigação, "mensalão" nos termos em que foi colocado não existe. Rede de corrupção não existe. Comprovou-se
uma corrupção nos Correios.
Houve uma tentativa de honrar
compromissos de campanha de
forma atabalhoada e com um preço político muito alto.
Folha - Mais do que atabalhoada,
não foi de forma criminosa para um
partido que tinha a ética como
principal valor?
Wagner - Para mim é a mesma
coisa. Os dois cometeram o crime
do caixa dois. É uma ilegalidade
que virou corriqueira, mas afronta as pessoas que pagam seus impostos decentemente. A diferença
que pesa mais para o PT é que o
pecado do pecador não assusta
mais as pessoas. Já o pecado do
pregador desgasta muito mais,
pois há a quebra da expectativa da
pregação feita. Não se pode é generalizar. Se o PT não é o partido
dos anjos, o que eu nunca disse
que era, seguramente não é o partido dos demônios ou corruptos.
Vejo exagero da oposição ao tentar fazer linchamento público do
PT pelo erro de alguns, que têm
de pagar e já estão pagando.
Folha - A oposição diz que é impossível que Lula não soubesse do
"mensalão". Ex-petistas, como a
senadora Heloísa Helena, disseram
que Lula sempre soube o que se
passava no PT. O sr. acredita que
ele não sabia?
Wagner - Totalmente. Se soubesse, seguramente não admitiria
que no seu governo e no seu partido fosse operado algo desse tipo.
O que mais constrange o presidente é a revelação de que alguns
do PT se deixaram absorver por
uma máquina podre que existia.
Folha - O presidente se disse indignado e traído. Indignado por
quê? Traído por quem?
Wagner - Indignado pelo que
acabei de falar. Sobre traição, ele
nunca citou nomes para mim.
Folha - O sr., que convive com ele
diariamente, não tem idéia?
Wagner - Ele se sente traído por
quem operou dessa forma sem
lhe dar conhecimento. Tem uma
frase dele que é a seguinte: "Nunca imaginei que a gente pudesse
pagar um preço nessa esfera que a
gente está pagando". Então, a traição é a traição às convicções dele.
Folha - Seriam o Delúbio e o José
Dirceu?
Wagner - Não sei. Não posso falar pelo presidente.
Folha - Na sua opinião, o Delúbio
é um traidor?
Wagner - É. Como o Delúbio fez
essa operação, não tenho dúvida
de que ele traiu a alma do PT.
Folha - E o José Dirceu?
Wagner - Como sou amigo do Zé
Dirceu, não busco nele culpa, mas
busco responsabilidade. O sistema político que ele adotou para
ter a maioria dentro do PT, e que
eventualmente transbordou na
operação das construções de
maioria, é um sistema monolítico.
Foi um sistema político que estressou muito as relações dentro
do PT. A responsabilidade é sobre
essa constituição de maioria. De
resto ["mensalão"], até agora não
apareceu nenhum fato concreto
contra ele.
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