São Paulo, terça-feira, 31 de janeiro de 2006

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/EMPRÉSTIMO OBSCURO

CPI não terá acesso a dados de Paulo Okamotto, que diz ter pago dívida feita pelo presidente

Liminar no STF barra quebra dos sigilos de amigo de Lula

RUBENS VALENTE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim, suspendeu, por meio de liminar (decisão provisória), a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Paulo Okamotto, amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A CPI dos Bingos havia aprovado a quebra dos sigilos porque quer investigar se Okamotto falou a verdade ao afirmar que pagou do próprio bolso uma dívida de R$ 29,4 mil que o presidente mantinha com a direção nacional do PT. Como a data do pagamento de uma parcela dessa dívida é posterior a um saque do PT nacional no esquema do "valerioduto", a CPI quer saber se o dinheiro que quitou a dívida de Lula tem ou não como origem o esquema de caixa dois abastecido pelo publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza.
A decisão do ministro foi comunicada à comissão, por fax, às 19h53 da última sexta-feira. Com a medida, todos os dados relativos às quebras que já tenham chegado à comissão deverão ser lacrados -não há confirmação se algo havia chegado até ontem. Os senadores não poderão ter acesso às informações.
"Eventuais dados obtidos pela CPI em decorrência do cumprimento do requerimento impugnado devem permanecer lacrados e sob custódia da CPI até ulterior do STF", decidiu o presidente do STF, que já anunciou que deixará o cargo para concorrer na eleição de outubro deste ano. Especula-se que ele poderá ser candidato a presidente da República, embora até no Palácio do Planalto há quem defenda seu nome como vice na chapa de Lula.
Jobim alegou inconsistência na decisão tomada pela CPI no dia 18, por 11 votos a 2, a partir de requerimento do senador Antero Paes (PSDB-MT).
"O requerimento indica fatos com suporte apenas nas matérias jornalísticas e no depoimento do impetrante [Okamotto]. E esta corte veda a quebra de sigilos bancários com base em matéria jornalística", afirmou Jobim, em sua decisão.
O ministro citou duas decisões anteriores do STF, que, segundo ele, sustentam a tese de que reportagens da imprensa não podem servir de base a uma quebra de sigilo. Mas nada falou sobre o depoimento de Okamotto - no qual ele voltou a dizer que pagou a dívida de Lula com recursos próprios, embora não tenha apresentado nenhum documento bancário ou comprovante emitido pelo PT nacional.
"O depoimento do Okamotto precisa ser explicado. Só a quebra explicará", defendeu Antero.
Jobim acolheu os argumentos do advogado de Okamotto, Marcos Augusto Perez, segundo o qual a quebra do sigilo daria "às comissões de inquérito a prerrogativa para, a pretexto de apurar o ocorrido em 2005, quebrar o sigilo de cidadão dos últimos cinco ou dez anos para saciar a curiosidade dos senadores que a compõem e a imprensa".
Ontem, em entrevista à Folha, Perez disse que a CPI dos Bingos "quer fazer um circo" e que Okamotto não deve explicações nem a ela nem à imprensa (veja texto nesta página).
Citando um colega seu, o ministro Celso de Mello, Jobim disse que o requerimento da quebra não apresenta "a existência concreta de causa provável que legitime a medida excepcional".
Okamotto foi tesoureiro da campanha presidencial de Lula em 1989. Em agosto, apresentou-se como o responsável pelo pagamento de R$ 29,4 mil de uma dívida que o PT cobrara de Lula. A oposição havia detectado esses pagamentos "em dinheiro".
A origem da dívida seriam viagens internacionais anteriores a 2003 durante as quais Lula, então presidente de honra do PT, fizera gastos pessoais do Fundo Partidário, mas não ressarcira o partido. A dívida foi paga entre dezembro de 2003 e março de 2004.
Okamotto afirmou que o dinheiro usado para os pagamentos foi sacado de sua conta pessoal de agências de Brasília. Contudo, os depósitos para o PT ocorreram em quatro agências do Banco do Brasil localizadas em três bairros distintos de São Paulo.
Os saques de Okamotto, segundo ele contou, ocorreram em datas não coincidentes com os pagamentos das parcelas. O presidente do Sebrae afirmou não ter meios de provar esses pagamentos.
O presidente da CPI, Efraim Morais (PFL-PB), disse que a CPI deverá votar "um novo requerimento que convença o Supremo".
"Acho que [a decisão] não é boa para o Poder Legislativo. O Supremo deveria facilitar, em vez de dificultar o trabalho da CPI", disse.


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