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ENTREVISTA DA 2ª
Canadense diz que SP deve
ser o pólo financeiro da AL
``SP já é conhecida como pólo financeiro importante na América
Latina. Isso é o que se deve vender aos investidores de fora. Seria
importante vender a cidade como
ponto de partida para a América
Latina. É bom lugar para investir
em bens, serviços, para depois exportar pelo Brasil e Mercosul''
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JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
da Reportagem Local
Apesar de presidir a associação
de brasilianistas canadenses, Ted
Hewitt pode ser chamado de
``paulistanista''.
Doutorado em sociologia com
uma tese sobre o engajamento político das Comunidades Eclesiais
de Base na periferia de São Paulo,
estudou os movimentos políticos
urbanos do Brasil por 20 anos.
Em 1993, Hewitt mudou o enfoque de suas pesquisas: vem se dedicando ao intercâmbio municipal, em especial o acordo entre São
Paulo e Toronto, no Canadá.
Professor na Universidade de
West Ontario, ele conta -nesta
entrevista via Internet- como as
duas cidades vêm trocando informações há anos e implementando,
com êxito, o que apreenderam da
experiência uma da outra.
Hewitt acha que São Paulo deve
se apresentar como o pólo financeiro da América Latina para vender sua imagem no exterior e atrair
investidores estrangeiros.
Na era da globalização, diz, ``é
preciso incentivar a elevação do
capital humano da cidade''. Para
os paulistanos se adequarem aos
empregos que exigem habilidades
específicas, como em informática.
Sua mais recente visita ao Brasil
ocorreu há duas semanas, quando,
em português fluente, teve a primeira conversa com a Folha. A seguir, trechos da entrevista.
Folha - Por que o interesse específico por São Paulo?
Ted Hewitt - Venho para São
Paulo desde 73. Nunca vi cidade
tão exuberante, mas também tão
desconhecida lá fora. O que me
atrai é que São Paulo consegue
funcionar apesar de todos os problemas. É uma maravilha!
O movimento de gente no
dia-a-dia é inacreditável: a cada
ano, quase 2,6 bilhões de pessoas
(metade da população do mundo)
são servidas pelo sistema de ônibus e metrô. E chegam a quase 3,3
bilhões na região metropolitana.
Folha - Qual o resultado até agora da troca de experiências entre
Toronto e São Paulo?
Hewitt - Os técnicos de Toronto e São Paulo têm trabalhado juntos para solucionar vários problemas urbanos desde 1987. Já foram
discutidos dezenas de projetos.
Em certos casos, não deram certo
por falta de técnicos em Toronto
para ajudar, mudanças de prioridades de administrações (por
exemplo, entre os governos Erundina e Maluf). Porém, no geral, o
intercâmbio tem tido êxito.
Há exemplos de projetos
bem-sucedidos em pelo menos
três áreas de atividade. a) Planejamento - o maior sucesso neste setor, sem dúvida, são as ``operações interligadas''. Funciona assim: São Paulo tem leis de zoneamento que regulam a altura de
prédios que podem ser construídos em um lugar. Baseadas num
programa que já funcionava em
Toronto, as ``operações interligadas'' permitem a uma construtora
pedir licença para construir um
prédio mais alto. Se for concedida, a construtora paga
uma ``multa''
por cada andar
construído a
mais. Até agora, a prefeitura
já arrecadou
mais de US$ 70
milhões. Este
dinheiro tem
sido aplicado
na construção
de casas populares. No passado, nas Cohabs e mutirões. Agora, todo o dinheiro coletado (cerca de US$ 40
milhões em 96) vai para o financiamento do Projeto Cingapura.
b) Serviços de emergência - há
quase dez anos, uma vez por ano,
equipes de Toronto vêm dando
treinamento aos gerentes de enfermagem em São Paulo (sobre como
tratar fraturas, parada cardíaca,
sangramento, etc.). Depois, os gerentes dão aulas aos auxiliares de
enfermagem e motoristas das ambulâncias. Trabalhando juntos,
equipes das duas cidades têm estabelecido um sistema de triagem
para atender chamadas de emergência (por grau de seriedade).
Através disso, o tempo de resposta
das ambulâncias de São Paulo tem
caído bastante (embora ainda seja
bem mais alto do que Toronto, que
tem média de 6 minutos). A estimativa é que o tempo de resposta
agora é de 30 minutos ou menos.
No passado, podia chegar a uma
hora. O maior problema agora é o
trânsito que prende a ambulância.
c) Parque Cidade de Toronto -
equipes de São Paulo e Toronto
colaboram desde 87 no planejamento e construção de um parque
grande na região nordeste de São
Paulo (Pirituba). O parque foi
inaugurado em 92 e custou US$ 1,5
milhão. Toronto doou US$ 200
mil, em parte para comprar equipamentos de lazer para as crianças.
Folha - A cidade de São Paulo
tem algo a ensinar aos canadenses, ao chamado Primeiro Mundo?
Hewitt - Não é exatamente ensinar. Certas práticas daqui têm sido adaptadas para uso em Toronto. Em 92, um grupo afiliado ao
Department of Public Health do
município de Toronto quis incentivar um programa de fornecimento de comida aos pobres da cidade. Um dos participantes, que já
tinha conhecimento do acordo
Toronto-São Paulo, mencionou
que o ``sacolão'' podia servir como modelo. Agora, o programa
atende 15 mil
famílias/mês.
Num outro
caso, em 1991,
o conselho de
educação do
município quis
incentivar um
programa de
almoço e lanches para os
alunos mais
carentes nas
escolas primárias. Dentro do
conselho, havia muitas dúvidas sobre a
possibilidade de se montar isso.
Um dos técnicos que havia visitado São Paulo relatou que já existia
um programa semelhante aqui,
que atende mais de 1 milhão crianças. Depois de estudar o programa
paulistano, o conselho andou com
mais confiança, sabendo que um
programa assim pode funcionar
razoavelmente bem.
Desde 89, o pessoal da Comissão
de Trânsito de Toronto vem observando o metrô de São Paulo. Eles
têm forte interesse no sistema de
entrada e saída de passageiros dos
trens na estação da Sé (o sistema de
plataforma central de embarque/desembarque), que facilita a
transferência de passageiros. Já
mudaram a estação principal do
metrô e decidiram também que as
estações principais das novas linhas terão o mesmo sistema.
Folha - Em sua visita ao Brasil,
qual mudança mais o impressionou desde a sua viagem anterior?
Hewitt - É sempre impressionante como a cidade muda de cara.
Desde 1993, muita coisa mudou:
novos prédios, avenidas, túneis.
Mas o trânsito piorou. A cidade está bem mais limpa do que no passado. De certa forma, parece mais
"rica". Muitas pessoas andam
com celular (que sempre está tocando!). Tem uma oferta bem
maior de bens importados, especialmente carros. Porém, os velhos
problemas persistem: meninos de
rua, criminalidade, moradia precária. Mas devo dizer que a periferia, pelo menos as áreas que eu conheço bem (sul de Santa Amaro e a
região leste), têm melhorado muito, com a chegada de luz, água, asfalto, esgoto, shoppings etc.
Folha - E o Projeto Cingapura?
Hewitt - Eu já visitei vários e falei com várias pessoas ligadas ao
Cingapura -de arquitetos a moradores. Claro que muitos vão ser
beneficiadas pelo projeto, mas tem
muito trabalho pela frente. Embora a prefeitura vá investir R$ 300
milhões nele este ano, o Cingapura
não trata do problema global, dado os números de favelados e encortiçados na cidade. Talvez seja
preciso juntar o Cingapura a outros programas: mutirão; programas de pequenos empréstimos para quem está construindo ou para
cooperativas de moradores; descontos no IPTU para proprietários
que melhoram imóveis para alugar
para pessoas de baixa renda.
Folha - Qual a principal virtude
de São Paulo e que poderia ajudar
a cidade na era da globalização?
Hewitt - São Paulo já é conhecida como pólo financeiro importante na América Latina. Isso é o
que se deve vender aos investidores de fora para atrair mais atividade econômica. Seria importante
vender a cidade como um ponto
de partida para a América Latina. É
um bom lugar para investir em
bens ou serviços para depois exportar pelo Brasil e Mercosul.
Folha - Qual o problema que a cidade deveria priorizar?
Hewitt - A questão social em
geral. Saúde, moradia, cesta básica, educação têm de entrar na
frente da fila. Não só para melhorar as condições de vida, mas porque é preciso incentivar a elevação
da ``capital humano''. Para as pessoas se habilitarem para as ocupações da ``nova economia'', em serviços e informática. Claro que o
trânsito é uma tragédia também. O
município deve achar um jeito de
aumentar os ``custos'' de tirar o
carro da garagem e baixar os de pegar uma carona com uma outra
pessoa, ou pegar ônibus ou metrô.
Em saúde e educação, além de dar
mais recursos, a cidade tem que
incentivar uma descentralização
de serviços, para assegurar que todas os cidadãos tenham acesso a
uma escola ou hospital na sua região. Acima de tudo, é preciso ter
um corpo de servidores municipais dedicado à solução dos problemas básicos. Em minhas visitas
às secretarias municipais, vi muitos jovens dedicados à luta. Isso é
um bom sinal para o futuro.
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