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Deságios foram 'pornográficos', diz Maluf
MARTA AVANCINI
de Paris
O ex-prefeito
Paulo Maluf
afirmou ontem
que houve ``crime'' na emissão
de precatórios
nos Estados de
Santa Catarina,
Alagoas e Pernambuco.
Segundo ele, nesses Estados houve venda de títulos com deságios
``pornográfico'', o que não teria
ocorrido na cidade de São Paulo.
A diferença fundamental entre
os casos, segundo ele, seria o fato
de os Estados teriam recorrido a
empresas de consultoria para conseguir emitir seus títulos.
Quatro assessores da prefeitura
auxiliaram os Estados nesse trabalho. Mas Maluf afirma que o então
secretário de Finanças, Celso Pitta,
hoje prefeito de São Paulo, nada
sabia. ``Ponho minha mão no fogo
pelo sr. Celso Pitta.''
Para Maluf, se houve erro no caso de São Paulo, a responsabilidade tem que ser repartida com o
Banco Central e o Senado, que
aprovaram as emissões.
Maluf concedeu entrevista à Folha na tarde de ontem no hotel Plaza Athénée, em Paris, onde está
hospedado após uma visita de dez
dias aos Emirados Árabes.
Folha - Qual é a opinião do sr. a
respeito dos trabalhos da CPI dos
Precatórios? Como o sr. vê a possibilidade de a CPI aprovar a quebra
do sigilo telefônico dos ex-prefeitos supostamente envolvidos, o
que afetaria diretamente o sr.?
Paulo Maluf - Em primeiro lugar, eu fiz uma viagem com muito
sucesso ao Oriente Médio. Posso
lhe dizer que não estou exatamente a par do que está acontecendo.
Entretanto, quero dizer que minha vida é um livro aberto. Foram
quatro anos em que fizemos a mais
competente e bem sucedida administração à frente da prefeitura.
Não tivemos um só escândalo, tivemos todas as nossas contas
aprovadas pelo Tribunal de Contas. Também quero dizer que conheço Celso Pitta há 11 anos. E, no
meu partido tem, por exemplo,
colaboradores da Folha, como Roberto Campos e Delfim Netto. Pessoas honestas e reconhecidas.
Mas ninguém é mais honesto e
mais reconhecido do que Celso
Pitta. Portanto, nós não temos absolutamente receio de nada.
Agora, uma coisa é a investigação e outra coisa é perseguição política. Anteontem, o presidente do
Senado, senador Antonio Carlos
Magalhães, disse que a falta de objetivos e de rumos da CPI poderia
inviabilizar os resultados da CPI.
Ou seja, o que a CPI tem que pegar? Primeiro, aqueles que compraram os títulos com deságio de
Santa Catarina, de Alagoas, de
Pernambuco. Segundo, os bancos
ou fundos que compraram os títulos por valor de face. Ou seja, alguém ganhou dinheiro na ida e na
volta.
Segundo, a Folha publicou, há
questão de 20 dias, contas "fantasmas" em Foz do Iguaçu e lavagem de dinheiro. Esses lavaram,
não pagaram Imposto de Renda
ou tiveram ganhos com títulos
desses Estados de algumas centenas de milhões.
Agora, no momento em que o
próprio jornal está interessado em
quem falou com quem no telefone,
está interessado muito mais, vamos dizer, na parte adjetiva do que
na parte substantiva, são os próprios repórteres ou senadores da
CPI que vão inviabilizar os trabalhos. A falta de objetividade é que
pode prejudicar a CPI.
A CPI tem que botar os ladrões
na cadeia e não estar preocupada
em abrir a conta telefônica ou a
conta de fulano ou sicrano por mera suspeita sem suspeita.
Por exemplo, a própria Folha cometeu duas barrigas por meio de
artigos assinados pelo sr. Luís Nassif. Mas amanhã (hoje) estarei em
contato com Saulo Ramos, meu
advogado, para já verificar da possibilidade de processar o sr. Luís
por crime contra a imprensa e por
perdas e danos porque ele contou
duas mentiras.
A primeira mentira: que eu teria
pago uma operação de rins ao sr.
Wagner Ramos. Mentira. Ele é
funcionário da prefeitura, nem o
conheço, nem soube que ele foi
operado dos rins, mas, se fosse,
existem 16 hospitais da prefeitura
para operar gratuitamente não só
funcionários como também a população de São Paulo.
Segundo lugar, que eu teria pago
um jatinho. Mentira. Mentira. Absolutamente mentira. Agora, nós
estamos no império da desinformação ou da mentira em que o
próprio "Manual da Folha" não é
observado. O "Manual da Folha"
obriga a saber o outro lado. E, no
caso, o sr. Luís Nassif, ele não ouviu o outro lado.
Folha - Ele (Nassif) teria ouvido
isso do sr. Fábio Nahoum, que teria
repetido uma afirmação de Wagner Ramos...
Maluf - Eu não participei da
reunião. Quem participou da reunião secreta foi o sr. Luís Nassif. E,
para mim, é lamentável que o sr.
Luís Nassif participe de uma reunião secreta com alguém que possa eventualmente estar incriminado, como o sr. Fábio Nahoum. Eu
não julgo ninguém, mas o que se
diz é que ele é suspeito.
E junto com o senador José Serra. Então, você vê que existe uma
incoerência total. Primeiro, o sr.
Luís Nassif não consulta o outro
lado e mente quando transcreve,
porque ele assumiu e assinou. Então ele, Luís Nassif, mentiu.
Segundo lugar, quem tinha que
desmentir seria o Serra, que é
membro da CPI. Este se calou. E
agora quem veio em defesa da verdade é um suspeito, que é o Nahoum. Isso me parece uma total e
absoluta incoerência.
Eu sempre soube que a Folha estava com o rabo preso com o leitor.
No caso, o sr. Nassif esteve com o
rabo preso com a mentira.
Folha - A Folha revelou que o Tribunal de Contas do Município acusou que cerca de 60% do dinheiro
que sua gestão arrecadou com a
emissão de títulos para pagar precatórios não foi usado para isso.
Maluf - Nós temos que dividir a
pergunta em duas. A primeira é a
seguinte: a prefeitura, como fez
Santa Catarina, Alagoas e Pernambuco, usou uma empresa de consultoria ou consultoria entre aspas
para ganhar dinheiro, para conseguir a aprovação dos precatórios
no Banco Central? A prefeitura,
não. O prefeito Paulo Maluf foi diretamente na presença do então
presidente do BC, Pedro Malan, e
lhe entregou a proposta.
Segundo, o BC entregou um estudo para o Senado, e o Senado
aprovou. Aprovou com voto favorável dos senadores Fernando
Henrique e Mário Covas. Isso nunca foi dito. A aprovação de São
Paulo foi absolutamente diversa
da dos outros Estados.
Agora vamos para o segundo capítulo. Como foram vendidos esses títulos? Nós não demos para
nenhuma corretora vender os deságios que a Folha anunciou. Os
títulos foram todos custodiados,
todos, no Banespa e, posteriormente, com a intervenção do BC
no Banespa, uma parte deles foi
para o Banco do Brasil.
E eu chamo a atenção da Folha
porque foi a própria Folha que,
por volta de abril ou maio de 96,
criticou o prefeito Maluf dizendo
que havia um conluio entre o prefeito Maluf e o presidente Fernando Henrique, quando foi aprovada
a lei da Previdência. Foi março,
abril, quando foi assumido compromisso de federalizar os títulos
de São Paulo. Se o prefeito quis federalizar os títulos, quis justamente reduzir o custo financeiro.
O que foi feito com o dinheiro? O
dinheiro chegou aqui de maneira
sadia, ao menor custo financeiro,
sem comissão a ninguém e sem nenhum deságio pornográfico como
aconteceu com outras operações
estaduais ou municipais. A Prefeitura de São Paulo é a única, é o único dos grandes poderes, e nisso eu
incluo o governo federal e o governo do Estado de São Paulo, que está em dia com pagamento dos precatórios. A Folha nunca disse que
existem 327 ações de intervenção
no Estado por falta de pagamento.
Então, sobre o Tribunal de Contas. Quando lhe pedem um dado,
ele dá um dado que é uma fotografia, e não um filme. Perguntaram o
dado no dia 31 de dezembro de 96.
Isso não é válido. Tem que perguntar no correr do tempo.
Folha - Segundo o Tribunal de
Contas, entre 93 e 96, teriam sido
emitidos títulos que...
Maluf - Não é verdade. Não é
verdade. O que acontece é o seguinte. Quando você emite um título, o título está em carteira, ou
no Banco do Brasil ou no Banespa.
É muito provável que, num determinado dia, entrou dinheiro do
IPTU e naquele dia se precisou pagar um precatório porque a Justiça
mandou. Então, esse dinheiro do
IPTU paga o precatório. E é bem
possível que, no outro dia, o dinheiro que estava no precatório,
que não é carimbado, pagou algum outro tipo de conta. Ou seja, o
que eu quero dizer é que o dinheiro não é carimbado. Segundo, que
os precatórios estão em dia.
Folha - É verdadeira a informação de que parte desse dinheiro foi
usada em obras?
Maluf - Não, não, não. Mas aí
nós temos que dividir. Primeiro
lugar, saber o que aconteceu com
os outros Estados. Como é que eles
aprovaram, quem aprovou, quanto pagaram de comissão. Aí houve
crime. Houve crime. Houve venda
de títulos com um deságio, eu repito, pornográfico, que não é o caso de São Paulo.
Folha - Em São Paulo não houve
deságio?
Maluf - Não. Houve o deságio
do dia, do custo financeiro do dia,
e a Prefeitura de São Paulo brigou
como ninguém, até criticado por
jornais como a Folha, para federalizar os seus títulos.
O que quer dizer federalizar os
títulos? É fazer com que os títulos
tenham a mesma taxa de custo financeiro dos títulos do BC. Ou seja, nós brigamos para diminuir os
juros.
Este é o meu ponto de vista e ponho minha mão no fogo. O meu
ex-secretário das Finanças e hoje
prefeito de São Paulo é um homem
de bem. Ele foi austero, honesto.
Folha - Em 94, o sr. assinou um
pedido para emissão de títulos da
ordem de R$ 606 milhões para pagar precatórios posteriores a 88, o
que vai contra a Constituição...
Maluf - Quem julga isso é o Senado, que aprova ou não aprova.
Não é nem o jornal nem Maluf.
Se a CPI tiver que ir a fundo, tem
que ir na avaliação das propriedades a serem desapropriadas. Haveria uma CPI muito pior do que essa.
Segundo, o custo financeiro desse pagamento. Vamos supor um
pagamento que equivale a um índice 10. Depois de quatro anos, está em índice 60, com juros, juros
de mora, correção monetária,
multa. Então, a desapropriação,
em vez de ser hoje uma necessidade para a construção de obras públicas, torna-se um bilhete de loteria premiado para o proprietário.
Eu tenho absoluta convicção de
que a maioria das desapropriações
está em valor muito maior que o
valor de mercado o que, evidentemente, é uma injustiça social.
Folha - O sr. ressaltou que não
tem dúvidas quanto idoneidade
de Celso Pitta nesse processo...
Maluf - Ponho minha mão no
fogo pelo sr. Celso Pitta. Na campanha, ele nunca deixou de tirar
seu telefone celular e ligar para sua
mãe, para sua mulher e seus filhos
durante uma carreata. Ele é um
pai, um marido e um filho exemplar.
Folha - A CPI descobriu que quatro assessores diretos de Pitta estariam envolvidos no esquema...
Maluf - Cada funcionário público, e a prefeitura tem cerca de
140 mil, é responsável pelos seus
eventuais erros. Já existe uma comissão de inquérito instaurada na
Secretaria dos Negócios Jurídicos
que vai julgar. Eles já foram inclusive demitidos. O que democraticamente você não pode propor,
dentro do Estado de Direito, é pelotão de fuzilamento.
Folha - Eles eram assessores diretos de Pitta. Como ele não sabia,
por exemplo, que Nivaldo Furtado
de Almeida fez diversas viagens
pagas pelo Banco Vetor?
Mauf - Não conheço esse sr. Nivaldo. Mas se ele, fora do expediente, praticou crime de responsabilidade funcional, merece punição. Por isso, foi demitido pelo
próprio Pitta, que, se tivesse rabo
preso, não o demitiria. O Pitta só
tem rabo preso com a honestidade.
Folha - A Polícia Federal está investigando as possíveis ligações
entre o caso dos precatórios e o caso Paubrasil. Existem corretoras
que estariam envolvidas nos dois
casos?
aluf - Não há nenhuma prova,
nenhum processo judicial que diga
que houve financiamento de campanha eleitoral pela Paubrasil. Isto
é mera repetição da imprensa. Não
há processo nem na Justiça nem na
polícia.
Folha - A investigação, que aponta possíveis ligações dos casos...
Maluf - Você disse bem, são
possíveis ligações. Não tenho ligação com o caso.
Folha - E o pianista João Carlos
Martins, que se diz abandonado
pelo sr. depois do caso Paubrasil?
Maluf - Não comento.
Folha - Martins disse que foi um
laranja no Paubrasil e que Pitta seria um laranja nos precatórios.
Maluf - Não comento. Você está baixando o nível da entrevista. O
que eu desejo é que, no nosso país,
os ladrões vão para a cadeia. No
momento em que você deseja tirar
uma resposta sobre uma suposição de uma hipótese que não existe, não está contribuindo para que
esse assunto seja solucionado e
que haja justiça.
Folha - Por que o sr. assinou o
pedido de emissão em 94, se ele
não tinha sustentação jurídica,
conforme a prefeitura admitiu?
Maluf - Tanto tinha sustentação
jurídica que o BC aprovou cerca de
R$ 500 milhões, que, com a correção, deu R$ 606 milhões. O Senado
aprovou. Repito. Com os votos do
senador Fernando Henrique Cardoso, ex-ministro da Fazenda, na
ocasião já eleito presidente, e de
Mário Covas.
Foi aprovado por unanimidade.
Se você diz que o Maluf errou, você
teria que dizer, no mínimo, o Maluf e o Senado erraram, mas ninguém errou. As contas estavam
certinhas.
Folha - O sr. sabe de alguma empreiteira que tenha pressionado a
prefeitura a emitir precatórios?
Maluf - Quem conhece bem o
Paulo Maluf sabe que ninguém
força ele a nada. Quando eu tomei
a decisão, eu tomei junto com as
altas autoridades da República.
Repito: o presidente do BC, Pedro Malan, presente em um almoço junto com Alkimar Moura, diretor da Dívida Pública, ciente da
primeira emissão, que foi pedida
pela prefeita Luiza Erundina (PT).
A primeira emissão que foi aprovada na minha administração havia sido pedida pela Erundina.
Outra coisa que a Folha não explorou é que o sr. Wagner Ramos
disse à revista "Veja" que ele trabalhou na gestão Erundina, e ele
disse que em 92, quando foram
candidatos a prefeito Maluf e Suplicy, ele coordenou comitê do Suplicy. Ele disse que era petista.
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