|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NEPOTISMO
Ministro do TCU é forçado a renunciar à relatoria
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ministro do TCU (Tribunal
de Contas da União) Lincoln Magalhães da Rocha foi forçado ontem a renunciar à relatoria da representação que pede a exoneração de parentes de deputados que
foram contratados para a Câmara
sem concurso público.
O Ministério Público Federal,
autor da representação, e o presidente do TCU, Adylson Motta,
consideraram inaceitáveis as declarações feitas pelo ministro à
Folha dando a entender que iria
rejeitar o pedido sob o argumento
de que exonerar os parentes "discriminaria a família legalmente
constituída".
Sem entrar no mérito da representação, o procurador-geral da
República no TCU, Lucas Rocha
Furtado, pediu na sessão do Tribunal o impedimento do ministro
afirmando que ele contrariou a
Lei Orgânica da Magistratura.
Em seu artigo 36, ela diz que é
vedado ao magistrado "manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo
pendente de julgamento, seu ou
de outrem".
O presidente do TCU acatou o
questionamento e disse que Lincoln não falava pelo Tribunal.
"Quem fala pelo Tribunal é o presidente do Tribunal. Os ministros
poderão falar sobre assuntos de
sua alçada, não temos cerceamento, mas não pelo Tribunal", disse
Motta. "A publicação [na Folha]
não representa o pensamento do
Tribunal ainda porque é passível
de decisão do plenário", concluiu.
Lincoln pediu a palavra e renunciou à relatoria, se declarando
"suspeito". Argumentou ter dito à
Folha que seu pensamento era
contrário ao nepotismo sempre
quando se tratar de má-prática
administrativa. Lincoln disse que
teria feito as afirmações em "off",
jargão jornalístico para informações cuja fonte não é identificada.
Em momento algum da entrevista concedida por telefone anteontem o ministro pediu reserva.
"Eu acho que você não pode fazer
essa distinção, essa discriminação
contra a família legalmente constituída. A família é um dos grandes pilares da sociedade", afirmou na ocasião, argumentando
ser inconstitucional o pedido de
exoneração. O novo relator não
havia sido escolhido até o fechamento desta edição.
A representação foi motivada
por reportagens da Folha que
mostraram que o presidente da
Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), o corregedor, Ciro Nogueira
(PP-PI), e outros deputados tiveram parentes contratados sem
concurso pela Câmara nos últimos anos. O STF, que não comentou ontem as declarações de Lincoln, tem decisão de 1997 em que
manifesta não haver inconstitucionalidade na aprovação de leis
para coibir o nepotismo.
A decisão dos ministros vai no
sentido de que a nomeação facilitada pelos laços familiares afrontaria o princípio da isonomia, da
moralidade e da impessoalidade
na administração pública.
Com exceção do Judiciário Federal e de algumas leis estaduais e
municipais, não há restrição ao
nepotismo na legislação brasileira. As reportagens da Folha motivaram a reativação da tramitação
de projetos na Câmara. Na próxima terça-feira, vários deles devem
ser votados na Comissão de Constituição e Justiça.
Além disso, a OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil) pode decidir em encontro nacional que se
inicia hoje em Fortaleza o lançamento de uma "campanha nacional contra o nepotismo". "Não é
possível mais que persista no Brasil uma prática tão nefasta, retrógrada e contrária à modernidade", afirmou o presidente da entidade, Roberto Busato.
"O nepotismo não é ruim só por
privilegiar uma pessoa mas também por abrir espaço para acordos e acertos em cúpulas de poder, no sentido de que há, muitas
vezes, nepotismo cruzado", disse
o presidente da AMB (Associação
dos Magistrados Brasileiros), Rodrigo Collaço.
Colaborou SILVANA DE FREITAS, da Sucursal de Brasília
Texto Anterior: Procurador requisita ao Basa dados de operação Próximo Texto: Janio de Freitas: Governantes sem correção Índice
|