São Paulo, domingo, 31 de julho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ HORA DAS PROVAS

Publicitário tomou R$ 47 milhões emprestados, mas repassou apenas R$ 30,6 milhões

CPI vê rombo de R$ 16,4 mi na versão Delúbio-Valério

RUBENS VALENTE
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A CPI dos Correios busca o paradeiro de pelo menos R$ 16,4 milhões que deveriam ter chegado aos cofres do PT e partidos aliados por meio dos empréstimos bancários supostamente contraídos pelo publicitário Marcos Valério de Souza com o propósito de formar um caixa dois partidário, segundo a versão apresentada por ele e pelo ex-tesoureiro nacional do PT, Delúbio Soares.
Essa é a diferença entre os empréstimos tomados por Valério (e que teriam partidos como destino declarado) e o valor já identificado pela CPI em saques na boca do caixa e transferências eletrônicas para parlamentares e assessores ou funcionários da empresa que teriam redistribuído o dinheiro sob orientação de Delúbio.
"A conta não fecha", disse um técnico da CPI que há mais de dez dias vasculha as contas de Valério e de suas empresas. Enquanto a conta "não fechar", os técnicos da comissão não darão por real a suposta operação financeira montada entre o PT e Valério.
Após checagens e rechecagens, a equipe técnica da CPI concluiu até agora três relatórios com listas de pessoas que receberam, ao todo, R$ 30,6 milhões das empresas de Valério. Foi detectado o destino de R$ 25,5 milhões da conta da SMPB no Banco Rural, de R$ 4,4 milhões da conta da DNA Propaganda no Banco Rural e de R$ 700 mil da conta da 2S Participações no Banco do Brasil.

Versão em risco
Esses valores colocam em risco a versão construída pelo publicitário e por Delúbio nos depoimentos que prestaram nos dias 14 e 15 de julho ao procurador-geral da República, Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
A versão é confusa desde o princípio. Só na última quarta-feira a imprensa teve acesso à íntegra dos depoimentos. Sabe-se agora que Valério disse ao procurador-geral ter repassado exatos R$ 39,2 milhões a Delúbio e ao PT. Listou seis empréstimos tomados para esse fim específico e disse que todo o dinheiro, sem exceção, foi enviado ao partido. Mas a soma dos empréstimos mencionados por Valério é de R$ 65,8 milhões: o procurador-geral nada perguntou sobre essa discrepância.
Após analisar as cópias dos empréstimos que Valério entregou ao procurador, a CPI concluiu que o valor dos empréstimos é bem inferior, R$ 47 milhões, mas ainda acima dos R$ 39,2 milhões mencionados por Valério.
Mais surpreendente ainda foi Marcos Valério ter entregue ao procurador cópia de outra operação de crédito no valor de R$ 30,5 milhões datada de 15 de outubro de 2004 e que tem como garantia o contrato de publicidade que sua empresa DNA Propaganda assinou com o Banco do Brasil em setembro de 2003. Esse empréstimo do Banco Rural não é citado pelo próprio Valério em seu depoimento como parte do caixa dois do PT. Também não é levado em conta pela CPI. Por ora, a comissão não sabe explicar a operação, da qual só tomou conhecimento quando a Procuradoria Geral da República encaminhou os papéis entregues por Valério.

Empresas
As contas estariam mais próximas da versão de Valério e Delúbio caso fossem considerados, como parte do mesmo esquema, repasses considerados "suspeitos" a duas empresas.
A Guaranhuns Participações, que tem como proprietários uma sociedade anônima do Uruguai, a Esfort Trading, e um "laranja" do interior mineiro, recebeu R$ 7 milhões, e a corretora de seguros paulistana Bônus-Banval, na qual trabalhou uma filha do deputado José Janene (PP-PR), obteve R$ 2,9 milhões. Com essas transferências, ainda restariam R$ 6,5 milhões sem destino identificado, considerando o repasse total avaliado pela CPI em R$ 47 milhões.
Até a última sexta-feira, a CPI dos Correios havia identificado ao menos nove parlamentares beneficiados com as transferências e saques. Diretamente, foram os deputados federais Josias Gomes (PT-BA), José Mentor (PT-SP), João Magno (PT-MG) e Romeu Queiroz (PTB-MG).
Por meio de assessores e parentes, foram relacionados ao escândalo os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Professor Luizinho (PT-SP), Paulo Rocha (PT-PA), Carlos Rodrigues (PL-RJ) e Roberto Brant (PFL-MG).
Sabe-se ainda que outros R$ 326 mil seguiram direto para as mãos do então diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolatto. Além dos valores cujo destino é incerto, há também os valores sacados por funcionários da SMPB, como a diretora financeira da empresa, Simone Reis Vasconcelos, que sacou R$ 5,5 milhões na boca do caixa mas declarou, em depoimento à Polícia Federal, não saber para quem entregou.
Somando-se os R$ 16,4 milhões não detectados pela CPI e os saques identificados, mas de destino ignorado, o rombo na versão de Marcos Valério e Delúbio Soares chegaria a R$ 28,4 milhões.


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