São Paulo, domingo, 31 de julho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ANISTIA FISCAL

Deputado petista afirma que iniciativa serve para repatriar recursos no exterior e vai beneficiar a economia e gerar empregos

Projeto de Mentor "blindaria" doleiros

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

Projeto de lei do deputado José Mentor (PT-SP), em tramitação na Câmara, propõe anistia fiscal -e não punição- aos titulares de recursos no exterior não declarados ao fisco brasileiro e, na prática, "blinda" doleiros que hoje são investigados pelo crime de lavagem de dinheiro.
O projeto tem recebido críticas de procuradores da República e juizes federais, que acreditam que a aprovação poderá encerrar ações que correm na Justiça Federal. Bastará que os investigados declarem valores mantidos no exterior ou repatriem esses recursos. O projeto prevê cobrança de Imposto de Renda de 3% do valor repatriado e 6% para o valor declarado, mas mantido no exterior.
Mentor admite que doleiros investigados podem ser beneficiados por seu projeto. "Se eles declararem os recursos no exterior, eles deixarão de ser doleiros e estarão legalizados."
O deputado diz que seu projeto tem interesse econômico e social. Ele estima que existam até R$ 150 bilhões de brasileiros no exterior. "Quem ganha com isso hoje são os banqueiros e os países onde estão estes recursos. Meu projeto facilita o repatriamento legal desse dinheiro e irá beneficiar a economia e gerar empregos."
O juiz da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, especializada em crimes contra o sistema financeiro, Sérgio Fernando Moro, afirma ser "lamentável" que, quando são conseguidas provas da atividade financeira ilegal no país, "alguém tenha a iniciativa de apresentar anistia, que pode prejudicar todo o trabalho desenvolvido até aqui".
O juiz federal cita, como exemplo, a conta Beacon Hill, que é mantida nos Estados Unidos e movimentou US$ 839,8 milhões. Nessa conta já foram identificados 3.310 contribuintes, entre eles as empresas DNA e SMPB, que têm o publicitário Marcos Valério -suposto operador do "mensalão"- entre seus sócios.

Inexplicável
A aprovação do projeto, na opinião dos procuradores e juízes, cessaria a investigação e a punição daqueles que requerem a anistia fiscal proposta por Mentor.
"É inexplicável um projeto desses neste momento e é absolutamente inócua a ressalva para dinheiro oriundo de crime. É um projeto sob medida para a atividade ilegal", diz Celso Antônio Três, procurador que conseguiu a quebra do sigilo das remessas ao exterior pelas contas CC5 (de não-residentes no país).
Durante o processo de organização da Operação Farol da Colina, procuradores da força-tarefa se reuniram com Mentor, então relator da CPI do Banestado. Mentor queria que a operação se restringisse a prender no máximo seis doleiros. Foram presos 63, em agosto de 2004.
A força-tarefa registrou os doleiros Antônio Claramunt e Reiginaldo Peres Chaves discutindo o projeto. Eles operavam subcontas na Beacon Hill. As gravações foram feitas antes de Mentor apresentar o projeto na Câmara. Chaves e Claramunt foram condenados e presos por crimes contra o sistema financeiro.
Ouvido pela Folha, Mentor disse não saber da gravação. "Mas o projeto é só de maio desse ano. E eles não estão presos?", perguntou. Informado de que a gravação ocorrera no ano passado, Mentor disse não saber o motivo de dois doleiros saberem que ele preparava o projeto de anistia fiscal.


Colaboraram PAULO PEIXOTO e THIAGO GUIMARÃES, da Agência Folha, em Belo Horizonte


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