São Paulo, quinta-feira, 31 de julho de 2008

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Após licença, Gil volta ao país e pede demissão da Cultura

Cantor se reúne com Lula e diz que interino será seu sucessor; Planalto não confirma

Alvo de crítica por se dedicar à carreira de músico, ele diz que temia que o equilíbrio entre "artista" e homem de Estado pudesse "ficar crítico"


Alan Marques/Folha Imagem
AQUELE ABRAÇO
Gilberto Gil concede entrevista sobre sua saída do governo, no Palácio do Planalto, depois de se encontrar com Lula ontem à tarde


LETÍCIA SANDER
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dizendo ter "cumprido um ciclo", o ministro da Cultura, Gilberto Gil, anunciou no final da tarde de ontem seu afastamento do governo federal, após reunião de uma hora no gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele alegou temer que o equilíbrio entre o "artista" e o homem de Estado pudesse "ficar crítico".
Numa entrevista de 21 minutos em que mesclou frases saudosas e elogios ao presidente Lula, Gil anunciou o próprio substituto. Ele disse que Juca Ferreira, hoje secretário-executivo, assumirá a pasta, o que não foi confirmado oficialmente pelo Palácio do Planalto até o fechamento desta edição.
É a terceira vez que o ministro pede para deixar o cargo -nas outras duas, foi convencido pelo presidente a ficar. "Eu disse a Lula que estava dois a zero para ele. Hoje, eu fiz um gol", afirmou, após cinco anos e meio à frente do ministério.
Cantor e compositor, ele vinha sendo criticado por supostamente negligenciar o ministério em favor da música.
Ontem, Gil negou ter ficado incomodado com as cobranças, mas reconheceu que a "dose inicial" de 80% de dedicação ao ministério e 20% aos projetos pessoais não vinha sendo cumprida. "Essa proporção foi se desequilibrando um pouco, mas não foi nada absurdo", afirmou o ministro, que neste ano tirou os 30 dias regulares de férias e outros 40 dias de licença.
Gil voltou ao Brasil no dia 27 de uma temporada de shows na Europa e nos Estados Unidos. Ele está em fase de lançamento de um novo projeto, intitulado "Banda Larga".
Ao fazer um balanço de sua gestão, a única crítica a ele mesmo e a Lula foi não ter conseguido um orçamento "mais generoso" do Ministério da Cultura. "As dificuldades todas com as contas governamentais, o superávit e essas coisas todas que são conhecidas de todo mundo fizeram com que não atingíssemos a meta de 1% [do Orçamento Geral da União] que era o desejado por nós e o recomendado pela Unesco."
Gil teve atritos fortes com produtores e artistas durante sua gestão. Ao propor a criação da Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual), em 2003, foi acusado de querer interferir na liberdade de expressão. A idéia acabou arquivada pelo governo.
Por não reformar a Lei Rouanet, como prometia desde que assumiu, recebeu críticas duras de artistas como Paulo Autran e Marco Nanini. Estes, como outros colegas, também atacaram Gil por dedicar parte de seu tempo à carreira de músico. O fato de ter criado programas como os Pontos de Cultura e organizado os editais de patrocínio público não foi suficiente para reduzir essas críticas.

"Refazenda"
Para Gil, "Refazenda" é a música que simboliza seu ciclo na gestão petista. "O governo do presidente Lula significa uma refazenda extraordinária do país. Amanhecerá tomate e anoitecerá mamão...", disse, declamando trechos da canção.
Ele mesmo explicou: "O governo do presidente Lula teve esta capacidade de fazer o país compreender o processo da transmutação permanente que se deve fazer da vida, com todos os instrumentos, inclusive os da política, da gestão, da criação, do estímulo à produção, da responsabilidade gerencial (...) Refazenda é uma música que eu cederia como jingle."
Gil negou ter sofrido pressão de Lula ou do governo para se dedicar mais ao trabalho de ministro enquanto esteve à frente do cargo.
"Agora o presidente entendeu que eu já tenho condições de me afastar sem dificuldades maiores para ele, do ponto de vista também político como do ministério, que fica com equipe azeitada, treinada, adaptada", afirmou.


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