São Paulo, sábado, 31 de agosto de 2002

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BALANÇO

Para presidente, resultados do governo rebatem críticas de opositores

FHC condena "manipulação demagógica de cifras sociais"

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Sem mencionar a campanha para sua sucessão e as críticas que vem recebendo no horário eleitoral, o presidente Fernando Henrique Cardoso denunciou ontem o que considerou uma "manipulação demagógica de cifras".
Disse que pode haver má nutrição, mas não a fome, a seu ver reduzida a uma ocorrência marginal. Disse que o analfabetismo caiu em nove anos, de 19% para 13%, e que no período a mortalidade infantil diminuiu de 47,8 para 29,6 por mil nascidos vivos.
A dívida pública, afirmou, é imensa, mas não derivou "do impulso gastador e irresponsável do governo central", mas do fato de o governo ter reconhecido dívidas preexistentes dos Estados e "esqueletos que ninguém reconhecia, mas que já estavam minando a credibilidade do país".
FHC discursou por 27 minutos em almoço promovido pela Câmara Americana de Comércio de São Paulo, durante o qual foi entregue o Prêmio Eco a cinco projetos sociais patrocinados pela iniciativa privada.
Eis trechos de seu discurso.

"CIDADANIA EMPRESARIAL" "Já faz tempo que o Estado deixou de ter o monopólio do público. Hoje os conceitos são outros. Aqueles que ainda pensam que só no âmbito do Estado as soluções são encontradas se equivocam. Certamente não será sem o Estado, mas não será exclusivamente com o Estado que as questões se organizam e se solucionam (...). No Brasil temos 465 mil empresas que prestam algum tipo de contribuição na área social. No ano de 2000 elas destinaram a seus projetos R$ 4,7 bilhões."

DÍVIDA PÚBLICA "Poucos países tiveram a coragem, como o nosso, de coibir o uso de recursos, a não ser dentro do estrito limite do Orçamento, forçando os governos a evitarem um endividamento crescente. Endividamento esse que existe, e que tantas vezes vejo nos jornais a respeito do meu governo, esquecendo-se de dizer que o que meu governo fez foi reconhecer dívidas preexistentes e assumir dívidas que estavam nas mãos dos bancos e que eram dos Estados, ou então esqueletos que ninguém reconhecia, mas que já estavam minando a credibilidade do país. Nós tornamos transparentes dívidas que já existiam, e que por serem vultosas elevam a taxa de juros, e isso contribui para a sua expansão. Mas não foram dívidas derivadas de um impulso gastador e irresponsável por parte do governo central (...). O governante não pode mais hoje passar a conta para o seu sucessor. Eu sei o quanto isso é importante porque recebi uma conta imensa de décadas, e hoje pago por essa conta. A Lei de Responsabilidade Fiscal veio no espírito da valorização da responsabilidade pública."

EDUCAÇÃO "Em todos os indicadores sociais -e eu repito, em todos- houve avanços. Foi possível graças ao esforço da sociedade. Pudemos reduzir o analfabetismo de 19% para 13%, de 1991 a 2000. E estamos podendo antever o fim do analfabetismo em pouco tempo, porque estamos antevendo nossas crianças com o resultado que desejamos, o de toda criança na escola. Já temos 97% ou 98%, o que nos permite dizer que em pouco tempo o analfabetismo será residual no Brasil. O acesso à escola foi dado aos mais pobres. Em 1995 nós ainda tínhamos 25% das crianças pobres fora da escola. Em 1999, entre os mais pobres, 93% estavam frequentando a escola. Não há indicador maior de inclusão social que o de a criança ter acesso à escola. Estamos lutando contra a exclusão social no Brasil. Houve também um aumento sensível na qualidade do ensino, o número de crianças que termina o ensino básico aumentou, e dobrou o número de alunos do ensino médio nos últimos anos."

MORTALIDADE INFANTIL "Os dados relativos à mortalidade infantil vão na mesma direção (...). Entre 1991 e 2000, a mortalidade infantil caiu de 47,8 por mil para 29,6 por mil. A cidade de São Paulo já tem 8 por mil, um dígito. Bom será o dia que o Brasil inteiro alcançar esse resultado. De qualquer maneira a redução foi muito significativa, sobretudo nas áreas mais pobres. No Nordeste, onde era de 73 por mil, e caiu para 40 e poucos por mil. A expetativa de vida aumentou e continua aumentando. Isso não se faz por milagre. Se faz pela mobilização da sociedade e pela ação do Estado. Agentes comunitários de saúde passaram de 29 mil para 160 mil, de 1995 até agora. Hoje podemos dizer que pulamos de 16 milhões de pessoas atendidas para 80 milhões, num programa desconhecido da classe média, porque beneficia os cafundós do Brasil, os grupos mais frágeis e carentes."

FOME E "MANIPULAÇÃO" "Vejo de vez em quando referências à fome no Brasil. Certamente existe. Mas os números, que são manipulados, não são verdadeiros. Se estamos com quase todas as crianças nas escolas, todas elas recebem ao menos uma refeição ou até duas, nas comunidades mais pobres... Pode haver má nutrição. Mas morrer de fome passa a ser casos mais marginais. E eu não acho que seja bom para o país manipular demagogicamente cifras que assustam. Estamos melhorando. Não estamos bem, mas o caminho está traçado para que seja melhor. Não me parece que aqueles que têm o espírito de "mudar o país" simplesmente insistam, olhando no retrovisor, repetindo cifras que foram verdadeiras no passado e que não encontram mais veracidade nos dias que correm."

SALÁRIO MÍNIMO "Com tudo o que se diga, o salário mínimo hoje, em termos de comparação com a cesta básica, ele cresceu significativamente. Em 1994 se comprava 60% de uma cesta básica com o salário mínimo. Hoje se compra uma e ainda sobra 20%. Isso não quer dizer que o salário mínimo seja alto. Mesmo em São Paulo, onde o salário médio é mais elevado, ele é de R$ 800. O que é ruim não é só o salário mínimo. É que o conjunto da produtividade no Brasil e os avanços na economia não permitiram um salário médio maior. Ele é muito baixo. A renda familiar nos últimos anos teve um aumento, mas isso não foi satisfatório, em razão da perda de ritmo de crescimento da economia. Ainda assim, há hoje 10% a menos de pobres."

AÇÃO SOCIAL DIRETA
"Nós não podemos descuidar de programas específicos de ação social. Todo o Imposto de Renda que os senhores pagam como pessoas físicas e que as suas empresas pagam como pessoas jurídicas... todo o IR na parte que vai para o governo federal, que é a metade do arrecadado, não foi suficiente para compensar o que nós distribuímos diretamente sob a forma de Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação, programa para a erradicação do trabalho infantil, atendimento aos idosos que não têm renda suficiente, programas para atender portadores de deficiências físicas ou para aqueles que não contribuíram para a aposentadoria, mas precisam dela para viver... Gastou-se então mais com a redistribuição direta de renda do que se arrecadou com o Imposto de Renda. São R$ 30 bilhões, sem intermediação política, sem clientelismo, e sim pelo direito de cidadania. Assim, quando ouço alguém perguntar não saber o que se faz com o imposto pago, é porque não olha nos dados que são públicos do governo federal."

DESEMPREGO "É preciso notar que a taxa de crescimento da oferta de empregos no Brasil supera em o dobro a taxa de crescimento demográfico. O que acontece é que nós estamos ainda tendo de empregar pessoas que nasceram numa época em que a taxa demográfica era muito elevada. Somente a partir de 2005, e nos dez anos seguintes, é que a pressão demográfica vai diminuir. Se o nível de emprego -num país em que a taxa de crescimento econômico não é tão alta- continuar crescendo na mesma proporção, vamos resolver o problema do desemprego. É o sistema de mercado, em que o desemprego fica em 2% a 4% por causa do "turn over". Mas não podemos perder de vista que a oferta de emprego tem crescido consistentemente."



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