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Robô no RH

Rastreamento de dados fica mais barato e passa a ser usado para recrutar candidatos a vagas

(FELIPE GUTIERREZ) DE SÃO PAULO

O trabalho que a neurocientista americana Vivienne Ming, 41, desenvolve na empresa californiana de tecnologia Gild tem ligação com a mudança de sexo pela qual ela passou há cinco anos.

Depois da cirurgia, Ming, que era professora da Universidade da Califórnia (Berkeley), percebeu que as pessoas de seu círculo profissional começaram a tratá-la de forma diferente --os alunos passaram a ignorar sua especialidade, a matemática, para falar sobre assuntos mais leves.

Na companhia onde trabalhava, ela deixou de ser chamada para eventos sociais e, consequentemente, fechou menos contratos e perdeu oportunidades.

Um fato da vida particular que não tinha relação com o trabalho começou a ofuscar suas habilidades no mercado profissional.

A Gild, onde Ming trabalha hoje, atua na busca de profissionais para outras corporações e tem como objetivo encontrar os candidatos que mais se encaixem no perfil da vaga, independentemente de sua vida privada. Para isso, usa uma ferramenta da moda: "big data" (busca e processamento de grandes quantidades de dados).

A empresa atualmente recruta profissionais especializados, principalmente programadores de software.

Para encontrar os melhores, vasculha a web para filtrar informações --desde a forma como a pessoa se descreve na página do LinkedIn, passando pela participação dela em fóruns do setor e por quantas vezes os códigos de software que ela desenvolve são copiados na rede.

A cada uma dessas métricas é atribuído um valor. No fim do processo, os candidatos são avaliados com uma nota que vai de 1 a 100.

"Pode parecer estranho contar uma história com dados matemáticos, mas funciona. Esses pequenos pedaços de informação sobre uma pessoa são a melhor maneira de descrevê-la", afirma Ming.

O uso de "big data" no mercado de trabalho é mais recente do que em áreas como o varejo digital, mas há pontos em comum.

Um exemplo conhecido de como a ferramenta funciona no comércio pela web são as recomendações de produtos que lojas como a Amazon fazem aos clientes, com base em itens que eles já compraram. De forma parecida, um usuário que navega pela rede social profissional LinkedIn irá topar com uma seção chamada "trabalhos que podem interessar".

"A rede social tem um algoritmo que entende a vaga e olha para a base de usuários para fazer um casamento'", explica Osvaldo Barbosa de Oliveira, 55, diretor geral do LinkedIn Brasil. Ele afirma também que esse algoritmo --uma fórmula matemática que compara e atribui relevância a dados a princípio "soltos"-- é constantemente atualizado.

QUEM PROCURA ACHA

Jamey Jeff, 37, cofundador da RemarkableHire, outra consultoria dos EUA que usa "big data", diz que o motivo pelo qual estão surgindo negócios assim é que a tecnologia permite que as companhias se aproximem da maioria dos profissionais --e não só dos que estão ativamente em busca de um emprego.

A empresa dele também busca dados sobre programadores espalhados em várias comunidades da web, como o Stack Overflow ou GitHub, sites onde desenvolvedores compartilham o código de programas que escreveram.

Analisando o código compartilhado nesses sites, é possível avaliar a qualidade do trabalho do profissional antes mesmo de conhecer seu currículo.

Depois, os escolhidos participam de um processo seletivo comum, com entrevistas, por exemplo.

Hoje, essas ferramentas funcionam quase exclusivamente para engenheiros de computação, mas Ming diz que a sua meta é ampliar o tipo de profissional que pode ser avaliado e quantificado com esse tipo de técnica.

Ela afirma que já é possível usar algoritmos para encontrar bons designers e prevê o mesmo para vendedores em um futuro próximo.

O problema é que informações extraídas de um site público (chamadas de não estruturadas) podem não ser muito confiáveis, diz Lisias Laurette, diretor-executivo para a América Latina da Serasa, que também lida com grandes volumes de dados.

"É difícil saber se uma informação pública, tirada da internet, é boa ou ruim", diz.

Mas Ming diz que o método corrige isso justamente por ser big', ou seja, por agregar centenas de variáveis pulverizadas para formar uma equação "robusta".

O que os algoritmos baseados em dados não estruturados (obtidos por terceiros) não conseguem captar tão bem são informações sobre formação escolar ou de comportamento, diz Peter Kazanjy, 33, fundador da norte-americana TalentBin, que também atua nesse mercado.

CIÊNCIA

A empresa norte-americana de sistemas de tecnologia Red Hat usa esse tipo de tecnologia para contratar. Lawrence Brock, vice-presidente de talentos da companhia, afirma que recrutar usando "big data" virou o procedimento padrão para achar engenheiros de softwares e que já se aproximou de centenas de profissionais dessa forma.

"As soluções antigas de recrutamento não dão uma perspectiva da qualidade do candidato do qual você está se aproximando. O big data' introduz um pouco de ciência nesse primeiro passo."

Segundo Brock, os candidatos oriundos desse tipo de rastreamento têm uma chance maior de se saírem bem nas fases seguintes do processo de seleção.

Mas ele não faz comparações com o desempenho dos que foram efetivados, pois todos os que passam pelo crivo da seleção, independentemente da maneira como chegaram à entrevista, foram considerados bons.

A Red Hat tem funcionários no Brasil e, pelo contrato com a consultoria de recrutamento, poderia usar as ferramentas para achar profissionais no país, mas isso ainda não foi feito.

Trata-se de algo muito novo --a Gild, uma pioneira nesse mercado, existe há apenas um ano e meio-- e ainda deve demorar para se tornar comum no Brasil.

O que existe por aqui é "big data" para avaliar em tempo real o desempenho dos funcionários.

LUZ VERMELHA

Gregory Marrufo, 48, vice-presidente do Walmart Brasil, explica que a empresa usa algoritmos cada vez mais sofisticados para avaliar os funcionários.

A diretora de RH Janaina Maia, 36, conhece bem como funcionam essas avaliações.

Ela entrou na corporação como operadora de caixa. O número de itens que escaneava por minuto, a quantidade de clientes que ela atendia por hora e o tempo que demorava para passar de uma conta para outra eram métricas que compunham a equação para avaliá-la.

Mais tarde, ela se tornou supervisora dos operadores de caixa e as métricas que passaram a compor o algoritmo da nota viraram as "quebras" (falta ou sobra de dinheiro em uma registradora quando ela é fechada) e a quantidade de vezes em que as luzes vermelhas acendiam (no supermercado, isso significa um caixa parado).

A avaliação, explica Marrufo, vem como uma nota. Mas os dados quantitativos não são os únicos que entram na avaliação.

O chefe imediato de cada um preenche um formulário dizendo, por exemplo, se a pessoa tem um comportamento adequado e condizente com o da empresa. Isso é computado na nota do funcionário.

Depois disso, traça-se um plano para aprimorar a maneira de o profissional trabalhar. Maia conta que, quando era supervisora, seu chefe disse que ela não lidava com os operadores de caixa de forma delicada. Juntos, fizeram um plano para melhorar esse ponto.

"As pessoas querem ser avaliadas e esperam isso da companhia [para crescer na carreira]", diz Marrufo.

É o oposto do que afirma o autor Kenneth Cukier, que considera que o trabalhador pode perder liberdade.

ESTÍMULO

Há quem diga que as avaliações em tempo real motivam. É o caso de Iuri Lima Ribeiro, 23, coordenador de relações com os consumidores da Mobly, que vende móveis pela internet.

Ribeiro começou como estagiário e era responsável por acertar a configuração da página da loja na web para que os usuários comprassem mais. Ele se destacou e o promoveram ao posto atual, no qual envia e-mails para consumidores. Quanto mais clientes abrirem as mensagens, melhor para ele.

Os pesos das variáveis da avaliação são alterados constantemente, diz o diretor de marketing, Cesário Martins.

"Temos que entender como funciona a operação de cada canal de comunicação para acertar a métrica dos funcionários."


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