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Bióloga que propôs célula "mestiça" morre aos 73

Americana Lynn Margulis criou tese sobre fusão evolutiva entre micróbios

Análise de DNA acabou comprovando ideia de que vida complexa surgiu da união de micróbios diferentes

REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR DE CIÊNCIA E SAÚDE
Javier Pedreira/Creative Commons
Lynn Margulis durante conferência na Espanha, em 2005
Lynn Margulis durante conferência na Espanha, em 2005

A ciência perdeu nesta semana a mulher que ajudou a mostrar como pessoas, árvores e outros seres vivos complexos são criaturas híbridas, tão improváveis quanto centauros ou sereias.

Trata-se da bióloga americana Lynn Margulis, da Universidade de Massachusetts em Amherst. Em comunicado oficial divulgado ontem, a universidade informa que Margulis morreu em casa, na última terça, aos 73 anos.

Durante toda a sua carreira científica, Margulis foi a principal defensora da teoria da simbiogênese, a ideia de que grandes transições da evolução envolveram a fusão de dois ou mais seres vivos completamente diferentes -daí a analogia com centauros e sereias do parágrafo acima.

Parece uma maluquice, mas pistas de que isso realmente ocorreu começaram a surgir quando cientistas verificaram que certas estruturas das células possuem DNA próprio, distinto do material genético "principal" que a célula guarda em seu núcleo.

PISTAS NO DNA

Isso foi em meados do século passado, quando começou a ficar claro que o DNA era a molécula da hereditariedade, ou seja, a substância responsável por transmitir as características dos seres vivos de pais para filhos.

O DNA independente achado no interior das mitocôndrias (os "pulmões" das células, responsáveis pela respiração celular) e dos cloroplastos (estruturas das células vegetais que comandam a fotossíntese) sugeria uma hereditariedade à parte.

As coisas estavam nesse pé quando Margulis, nos anos 1960, propôs que a explicação mais provável era uma fusão simbiótica. No passado remoto, dois micróbios totalmente diferentes um do outro, com estrutura parecida com a das bactérias atuais, teriam se fundido.

Um deles passou a ser o que consideramos como a célula "principal", enquanto o outro passou a levar uma vida semi-independente dentro da célula maior (o que seria o caso das mitocôndrias e dos cloroplastos).

Dessa forma, a célula maior ganharia a energia produzida pelos seus novos parceiros internos, enquanto a menor ficaria mais protegida de predadores microscópicos, por exemplo.

Hoje, poucos biólogos discordam da ideia, porque a comparação entre o DNA "normal" das células e o encontrado nas mitocôndrias e cloroplastos mostrou que, de fato, eles têm muito pouco a ver um com o outro.

Mais importante ainda: o material genético dos dois lembra muito o de certas bactérias (no caso dos cloroplastos, com o DNA de bactérias que fazem fotossíntese).

Margulis participou da elaboração de outra ideia famosa, que também enfatiza a cooperação entre organismos: a hipótese Gaia, que vê a Terra como um superorganismo.

Ela foi a primeira mulher do célebre astrônomo e divulgador de ciência Carl Sagan (1934-1996) e mãe de dois dos filhos do pesquisador.

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