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Físicos conseguem 'enxergar' antimatéria

Pela 1ª vez, experiência mediu propriedades de átomos da 'irmã gêmea' da matéria normal, similares ao hidrogênio

Estudo é primeiro passo para entender como as partículas que formam o Universo não foram destruídas no Big Bang

SALVADOR NOGUEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um grupo internacional de pesquisadores, com participação brasileira, mediu pela primeira vez as propriedades de átomos de antimatéria.

O feito é impressionante porque antiátomos precisam ser fabricados em laboratório. Além disso, têm de ser mantidos sem contato com matéria convencional. Do contrário, desaparecem.

O resultado, publicado na revista "Nature", é o primeiro passo para desvendar por que o Universo é feito de matéria, e não de antimatéria.

Os cientistas acreditam que o Big Bang -evento gerador do Cosmos como é conhecido hoje, ocorrido 13,7 bilhões de anos atrás- produziu partículas de matéria e antimatéria sem distinção.

Faz sentido. As antipartículas nem são tão diferentes da matéria normal. Exemplo: o antipróton é igual ao próton, exceto pela carga. Enquanto o primeiro tem carga negativa, o outro é positivo.

Um resultado de a antimatéria ser essa versão "espelhada" das partículas é o fato de que, quando colidem, ambas se aniquilam mutuamente, liberando energia.

Foi o que aconteceu no princípio do Universo: partículas e antipartículas colidiram às toneladas. Mas, se todas se aniquilaram mutuamente, como estamos aqui?

Por sorte, matéria e antimatéria são extremamente similares, mas não idênticas. Por conta disso, no Big Bang, depois da pancadaria entre as partículas, um excedente modesto de matéria foi criado, suficiente para fabricar tudo o que há no Cosmos.

O grupo do experimento Alpha, instalado no Cern (grande centro europeu de física de partículas), tem trabalhado na identificação dessas diferenças.

Seu primeiro grande feito foi demonstrar que era possível fabricar e aprisionar antiátomos, formados por um antipróton e por um pósitron (o "irmão gêmeo" do elétron). A cada 6.000 antiátomos criados, só um é capturado.

O aprisionamento já havia sido reportado no ano passado. O novo avanço foi a capacidade de medir as propriedades desse átomo em duas condições distintas.

DISPAROS

Com o auxílio de micro-ondas disparadas na direção da armadilha, os cientistas faziam com que uma das propriedades do pósitron mudasse. Isso tornava a captura impossível, e o antiátomo fugia da armadilha, colidindo com um detector.

Os pesquisadores então contrastaram essa medida obtida com uma similar, feita quando o átomo, em seu estado capturado, era "liberado" da armadilha. Assim, puderam comparar as características nos dois estados.

Os resultados revelaram o que se esperava: uma semelhança extrema entre o anti-hidrogênio e sua contraparte de matéria convencional.

"Essas medidas de micro-ondas são de baixa precisão", afirma Claudio Lenz Cesar, físico da UFRJ que participou do experimento. Além dele, Daniel de Miranda Silveira, também da UFRJ, fazia parte da equipe internacional.

"Para a rodada desse ano, que começa em maio, vamos instalar um novo equipamento para tentar a interação dos antiátomos com laser", revela Cesar. "Aliás, o laser está sendo desenvolvido no Rio."

Com ele, será possível aumentar em 100 milhões de vezes a precisão. "Aí já vai dar para colocar novos limites, por exemplo, na comparação da massa do pósitron com a do elétron", diz.

Contudo, as maiores surpresas só devem ser reveladas ainda mais adiante, com mais duas ordens de grandeza na precisão -10 bilhões de vezes mais que as medidas atuais. "Aí estaremos em território virgem, nunca antes testado nem indiretamente."

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