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Morre César Ades, mestre da mente animal

Psicólogo de formação, cientista da USP foi um dos fundadores do estudo do comportamento de animais no país

Cientista ajudou a unir biologia evolutiva com a pesquisa sobre a complexidade da mente; ele tinha 69 anos

Divulgação
O etólogo César Ades, morto anteontem em São Paulo
O etólogo César Ades, morto anteontem em São Paulo

REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR DE “CIÊNCIA E SAÚDE”
CRISTINA MORENO DE CASTRO
DE SÃO PAULO

César Ades, um dos fundadores do estudo do comportamento animal no Brasil, morreu anteontem no Hospital das Clínicas de São Paulo, após sofrer traumatismo craniano causado por um atropelamento. Ele tinha 69 anos.

Ades, professor do Instituto de Psicologia da USP, estava internado havia seis dias. Ele fazia caminhada quando foi atingido por um carro, na av. Brigadeiro Luís Antônio.

Foi levado, sem documentos, para o hospital. A família só conseguiu localizá-lo no dia seguinte.

Para ex-alunos e colegas, o pesquisador foi um homem intelectualmente versátil, um acadêmico que transitava entre os mais diferentes campos do conhecimento.

Formado em psicologia, Ades tornou-se etólogo (dá-se o nome de etologia à pesquisa sobre o comportamento dos animais). Interessava-se por filosofia, arte e ética, mas as várias linhas de pesquisa que abraçou tinham um objetivo em comum: entender a mente, tanto a humana quanto a animal, sob a perspectiva da teoria da evolução.

"Ele teve enorme sucesso em aproximar a psicologia da biologia", afirma Elisabeth Spinelli de Oliveira, pesquisadora da USP de Ribeirão Preto e presidente da Sociedade Brasileira de Etologia, que Ades ajudou a fundar.

Wagner Ferreira dos Santos, também da USP de Ribeirão e vice-presidente da sociedade, enumera as várias criaturas cujo comportamento foi alvo do interesse de Ades: preás, porquinhos-da-índia, primatas brasileiros (muriquis e bugios), cães, lobos-guarás -e gente.

ALEXANDRIA

As aranhas, no entanto, foram as primeiras a capturar a curiosidade científica de Ades, conforme ele contou em entrevista à revista "Scientiae Studia" no ano passado.

"Com 13 anos de idade, em um jardim de Alexandria [no Egito, onde nasceu], eu ia vendo como uma aranha caçava os insetos que eu depositava na teia e como se livrava de folhas ou gravetos", disse então o cientista.

Décadas depois, ele escreveria suas teses de doutorado (em 1973) e livre-docência (em 1991) sobre o comportamento e a capacidade de aprendizado da aranha Argiope argentata, mostrando que havia flexibilidade, além de instinto "cego", guiando as caçadas do aracnídeo.

Ele e seus colegas também descobririam sinais de complexidade simbólica nos chamados emitidos pelos muriquis, grandes macacos da mata atlântica.

Ex-alunos recordam a dedicação do antigo professor.

"Ele era muito generoso, muito próximo dos alunos, aberto para conversar", afirmou o psicólogo André Meller, que foi orientado por César Ades durante sua iniciação científica na faculdade, em 1992, numa pesquisa sobre a percepção que as pessoas tinham sobre a inteligência dos animais.

De origem judaica, Ades chegou ao Brasil aos 15 anos e se formou na USP em 1965. Até fevereiro, foi diretor do Instituto de Estudos Avançados da universidade.

Divorciado, o etólogo deixa duas filhas. Foi enterrado ontem, às 15h, no Cemitério Israelita do Embu.

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