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Babuíno aprende a 'ler' em experimento

Macacos conseguem distinguir entre palavras verdadeiras e sequências aleatórias de letras na tela do computador

Pesquisa sugere que capacidades mentais precursoras da leitura já estavam presentes em primatas primitivos

RICARDO BONALUME NETO
DE SÃO PAULO

Babuínos não falam inglês, é óbvio. Mas cientistas na França conseguiram treinar meia dúzia deles para que reconhecessem quando letras na tela de um computador formavam uma palavra de verdade e quando eram só sequência sem sentido.

Ao ler, uma pessoa usa dados sobre o posicionamento das letras em uma palavra, a "informação ortográfica", para ter acesso aos sons e ao sentido, dizem Jonathan Grainger e seus colegas da Universidade Aix-Marseille, em Marselha, na França.

Eles queriam saber se o processamento da informação ortográfica poderia ser feito mesmo na ausência de conhecimento linguístico. E foram atrás de primatas com boas habilidades visuais, mas sem conhecimento da linguagem humana.

"Nossos resultados demonstram que as aptidões básicas de processamento de ortografia podem ser adquiridas na ausência de representações linguísticas", escreveu a equipe na edição de hoje da revista "Science".

Os babuínos foram treinados para usar telas de computador sensíveis ao toque. Diante deles apareciam palavras sempre com quatro letras (por exemplo: "wasp", vespa) ou então combinações artificiais de quatro letras que não eram palavras.

Os macacos passavam por sessões de teste que incluíam 25 apresentações de uma nova palavra, 25 palavras já aprendidas e 50 pseudopalavras. Se acertassem uma palavra, recebiam uma recompensa de comida.

Após o treino, os bichos alcançaram precisão em torno de 75% nos testes.

A descoberta explode uma noção antiga entre os linguistas e biólogos: a de que a capacidade de reconhecer palavras seria inseparável da linguagem. Aparentemente, reconhecer combinações de objetos visuais em sequências é algo que pode ter surgido na evolução bem antes de os seres humanos divergirem de seus ancestrais comuns com outros primatas.

Comentando o estudo na mesma edição da "Science", Michael Platt e Geoffrey Adams, da Universidade Duke (EUA), lembram a hipótese de que circuitos cerebrais teriam evoluído para servir a um fim e depois teriam sido "reciclados" para novas funções.

"A ideia é que esses circuitos surgiram para apoiar o reconhecimento de objetos", disse Platt à Folha.

"Isso significa saber que uma figueira é uma figueira, e não um cafeeiro."

"Quando alguém aprende a escrever, um pedaço do circuito é cooptado para apoiar a função de leitura", afirma.

"Uma outra extensão dessa ideia é que os sistemas de escrita que melhor se conformam à maneira como o sistema visual quebra e remonta objetos têm mais chance de ser popularizados."

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