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Cientistas fazem primeiro mapa geral de um ser vivo
Bactéria que causa pneumonia teve todos os genes, proteínas e reações descritos
Metabolismo da espécie se mostrou complexo como o de seres mais sofisticados; feito abre caminho para criação de seres artificiais
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma equipe internacional de
cientistas conseguiu mapear
pela primeira vez todos os processos bioquímicos que mantêm um ser vivo (no caso, uma
das bactérias mais simples do
planeta) em funcionamento.
Os cientistas detalharam a
receita toda: o conjunto de proteínas, os genes ativos e a cadeia de reações químicas que
constroem a Mycoplasma
pneumoniae, causadora, como
indica seu nome, de um tipo de
pneumonia em seres humanos.
O feito abre caminho para
um plano acalentado há anos
pelos biólogos moleculares:
criar vida artificial -ou, ao menos, uma forma "customizada"
dos micróbios atuais (leia mais
ao lado). E a análise de como a
M. pneumoniae leva sua vidinha unicelular derruba de vez o
velho preconceito de que bactérias funcionam de forma rudimentar quando comparadas
com seres de células complexas, como plantas ou animais.
A maior diferença entre micróbios como bactérias e organismos mais complexos tem a
ver com como o DNA se abriga
no interior da célula. Criaturas
como árvores e pessoas têm
seu material genético cuidadosamente empacotado no núcleo de suas muitas células, enquanto as bactérias não tem
núcleo em sua célula única.
Além do empacotamento no
núcleo, o DNA dos organismos
mais complexos também apresenta uma série de firulas na
maneira como é "lido", possibilitando variar a maneira como
as instruções contidas nele são
seguidas pela célula.
Complicada e perfeitinha
Pois o mapeamento da bactéria, apresentado em uma série
de artigos na revista especializada americana "Science", indica que não é preciso ter núcleo para desenvolver métodos
sofisticados de leitura do DNA.
O grupo coordenado por Luis
Serrano, da Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, mostrou que a bactéria usa um sistema flexível na hora de transmitir os dados codificados em
seu DNA para o mRNA, ou RNA
mensageiro, que inicia o processo de produção de proteínas
na célula (veja o infográfico).
Essa flexibilidade depende
dos chamados operons, conjuntos de genes cuja ativação é
controlada pelo mesmo "interruptor". Em tese, se esse "interruptor" fosse apertado, todos
os genes ligados a ele seriam
ativados. Mas não é o que acontece. "Existe uma regulação interna, de forma que alguns genes do operon podem se expressar [se ativar] mais ou menos que os outros", diz Serrano.
A mesma versatilidade aparece nas proteínas que a bactéria produz -apenas 689, contra
dezenas de milhares do organismo humano. É que esse punhado de moléculas consegue
desempenhar múltiplas funções, explica Anne-Claude Gavin, do Laboratório Europeu de
Biologia Molecular. "Muitas
enzimas [proteínas que aceleram reações químicas] são capazes de catalisar reações diferentes, de processar substâncias diferentes ou interagir com
várias moléculas parceiras."
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