São Paulo, quinta-feira, 01 de fevereiro de 2001

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AMBIENTE

Samambaia de origem africana é capaz de concentrar metal tóxico do terreno; na falta do veneno, vegetal definha

Planta retira arsênico de solo contaminado

Tara Piasio/Universidade da Flórida
Samambaia Pteris vittata doente (marrom) por falta de arsênio


CLAUDIO ANGELO
DA REPORTAGEM LOCAL

Está certo que gosto não se discute. Mas há uma espécie de samambaia que exagera: ela tem uma estranha predileção por arsênico, um metal altamente tóxico e cancerígeno, que contamina o solo e a água e pode matar.
A planta, cujo nome científico é Pteris vittata, origina-se da África e ocorre no mundo todo, inclusive no Brasil. Ela é o que os cientistas chamam de hiperacumulador. Ela concentra em sua folhagem até 126 vezes mais arsênico do que a quantidade encontrada no solo. Por isso, um grupo de pesquisadores de universidades estaduais da Flórida e da Geórgia, nos EUA, acha que ela pode ser usada como um instrumento natural para limpar resíduos tóxicos no solo.
Ela funcionaria como um biorremediador, ou seja, um organismo capaz de eliminar substâncias nocivas do ambiente.
A descoberta da capacidade de hiperacumulação da samambaia está na edição de hoje da revista "Nature" (www.nature.com). Segundo a autora principal do estudo, Lena Q. Ma, da Universidade da Flórida em Gainesville, a planta foi encontrada durante varredura num sítio contaminado.
"Nós estávamos procurando um acumulador, mas não esperávamos encontrar um, já que nunca houve notícia de uma planta hiperacumuladora de arsênico", disse Ma à Folha, por e-mail.

Contaminante natural
O arsênico que contamina o solo e a água pode ser subproduto de atividades como a mineração e a agricultura -alguns pesticidas contêm o elemento. Mas ele também ocorre naturalmente. Na Índia e em Bangladesh, contamina aquíferos e ameaça a saúde de até 60 milhões de pessoas, segundo um relatório da ONG Worldwatch Institute. No Brasil a contaminação não é significativa.
Alguns sintomas de intoxicação são feridas na pele que demoram a cicatrizar e gangrena.
"Há dezenas de milhares de sítios contaminados no mundo, com concentrações que ultrapassam 2.000 ppm (partes por milhão -o máximo admitido na água para consumo humano é 50 ppm)", afirmou Ma. "E as tecnologias existentes hoje para limpar solos contaminados são ou ineficientes ou muito caras."
A pesquisadora diz ainda não saber por que a samambaia exibe tanto gosto pelo metal. Segundo Ma, concentrações de até 100 ppm estimularam o crescimento da samambaia em mais de 60%. "Um dia podemos descobrir que o arsênico é um nutriente para ela."
Outra coisa que os cientistas não sabem é o que fazer com as samambaias "aditivadas" com arsênico depois da limpeza. "Estamos pensando na viabilidade de usar as plantas para gerar energia (por meio da queima em um reator) e, ao mesmo tempo, reciclar o arsênico", disse Ma.


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