São Paulo, sábado, 01 de março de 2008

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Sob pressão, STF prepara voto sobre embriões

Ministros do Supremo recebem visitas de lobbies pró e contra células-tronco

Para CNBB, liberar pesquisa é abrir porta para o aborto; para ministro da Saúde, proibi-la é obscurantismo; julgamento será na quarta

SILVANA DE FREITAS
JOHANNA NUBLAT
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO

A Igreja Católica, de um lado, e cientistas e portadores de doenças graves, de outro, aumentaram nesta semana as pressões sobre os 11 ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar na última hora ganhar votos do julgamento que decidirá, na semana que vem, se o país pode ou não usar embriões humanos em pesquisas de células-tronco.
A polarização chegou ao auge ontem, com declarações feitas pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, e pelo secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), d. Dimas Lara Barbosa.
O último afirmou que a liberação das pesquisas é uma porta para a legalização do aborto (leia texto à direita). O primeiro previu que o Brasil pode viver "época do obscurantismo e do atraso" se o Supremo Tribunal Federal proibir os estudos com células-tronco embrionárias.
"É uma área em que o Brasil tem todas as possibilidades de chegar à fronteira do conhecimento em pé de igualdade com os países mais avançados. Podemos entrar em uma época de obscurantismo e atraso ou seguir o caminho da ciência e nos capacitar a enfrentar doenças", declarou Temporão, no Rio.
Em Brasília, no início da tarde de ontem, cerca de 30 pessoas portadoras de doenças graves fizeram uma manifestação em frente do prédio do STF pela liberação das pesquisas com células-tronco.
Elas soltaram 600 balões de gás e depositaram ao pé da estátua da Justiça gérberas laranja, para simbolizar a expectativa de julgamento isento.

Ação
Na próxima quarta-feira, o STF começará a julgar uma ação direta de inconstitucionalidade contra o artigo da Lei de Biossegurança que autorizou a realização de pesquisas com células-tronco de embriões. O julgamento poderá se estender ao dia seguinte.
Ainda ontem, o relator da ação, Carlos Ayres Britto, recebeu em seu gabinete representantes da CNBB, que atua formalmente como parte interessada. Na segunda-feira, falará com um representante da outra parte, o advogado Luís Roberto Barroso, do Movitae (Movimento em Prol da Vida), integrado por cientistas e portadores de doenças diversas.
Antes de quarta-feira, a CNBB vai enviar carta aos ministros defendendo que existe vida desde a fecundação, mas disse que não quer fazer pressão em cima dos ministros.
Até o início do julgamento, também será protocolado no STF um abaixo-assinado com 40 mil assinaturas pela liberação das pesquisas, colhidas pelas entidades de portadores de doenças e familiares.
Cientistas contrários ao uso de embriões também pretendem entregar um documento aos ministros. Alguns estiveram no STF nesta semana, para audiências. Cláudia Batista, da UFRJ, conversou com o ministro Ricardo Lewandowski e tirou dúvidas como "em que estágio se congela um embrião".
O STF irá reservar espaço no plenário para 20 cadeiras de rodas durante o julgamento. Paraplegias e distrofias musculares, que muitas vezes comprometem a locomoção, são algumas das doenças que podem supostamente, no futuro, obter tratamentos mais eficazes a partir do resultado de pesquisas com células-tronco.
As pressões sobre Britto começaram em abril de 2007, depois da audiência pública sobre o tema, a primeira da história do STF. Desde então, o seu gabinete recebe cerca de dez e-mails por semana, encaminhados tanto por fiéis católicos, contrários às pesquisas, quanto por portadores de doenças.
Anteontem, Eros Grau e Lewandowski receberam a geneticista da Universidade de São Paulo Mayana Zatz. Ela mostrou a cada um uma pequena vareta, mais fina que um palito. "Em um fiozinho como esse se congelam dezenas de embriões", disse para tentar evitar a comparação com pessoas. Barroso também esteve com eles e outros três ministros.
O autor da ação e ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles tem o apoio da CNBB. No campo adversário, estão a Advocacia Geral da União, o Congresso e três ONGs que representam cientistas e portadores de doenças: Movitae, Conectas Direitos Humanos e Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.
Para Temporão, o momento de debater a questão já passou. "Agora é a hora da decisão. Proibir as pesquisas teria um impacto difícil de mensurar."


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