|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
+ MARCELO GLEISER
O bit e o buraco negro
Será que tudo que
cai nele desaparece para sempre?
|
Existe uma estranha controvérsia
na física teórica, o chamado paradoxo da informação. É tudo
culpa dos buracos negros, sem dúvida
os objetos mais peculiares que existem. Einstein não era um fã deles,
mesmo que sejam conseqüência direta da sua teoria gravitacional, a teoria
da relatividade geral. É que os buracos
negros abusam das leis da física, forçando-as a passar dos seus limites.
Antes de falarmos do paradoxo da
informação, convém lembrar o que
são buracos negros. Toda estrela tem
um ciclo de vida: ela nasce, evolui e
morre. Essa trajetória depende essencialmente da massa da estrela. Quanto
mais massa, menos ela vive e mais
dramática sua morte. Alguns dos
eventos mais energéticos que existem
no Universo, explosões de supernova,
talvez até dando origem às explosões
de raios gama, são os estertores de estrelas com massas dez ou mais vezes
maiores do que a do Sol. Pois bem, segundo a teoria da relatividade de Einstein, a massa encurva o espaço: quanto mais massa, maior a curvatura do
espaço à sua volta. O leitor pode imaginar o que ocorre se levarmos essa
idéia ao extremo. Se a concentração
de massa for muito grande, a curvatura será também enorme. E quanto
maior a curvatura, mais difícil é escapar de suas garras, como numa ladeira
com inclinação variável. O buraco negro nasce quando a curvatura é tal que
nada escapa de seu interior, nem mesmo a luz.
O tamanho de um buraco negro é
dado pelo seu "horizonte", a distância
que delimita sua influência irreversível. Se alguém ou algo atravessar o horizonte de um buraco negro, jamais escapará de dentro dele. O problema é
que ninguém sabe exatamente o que
ocorre dentro de um buraco negro.
Será que tudo que cai num buraco negro desaparece para sempre? Será que
os buracos negros duram para sempre? E se não durarem? Será que as
coisas que caíram neles reaparecem
misteriosamente?
Bem, as coisas que caírem num buraco negro serão certamente desmanteladas, trituradas pelas incríveis forças gravitacionais que residem nele.
Porém, as partículas mais elementares da matéria, as que não podem ser
destruídas pois não existe nada menor
do que elas, devem resistir à essa trituração toda.
Stephen Hawking, há vários anos,
propôs que os buracos negros não são
eternos. Usando as leis da mecânica
quântica, a que descreve a física dos
átomos e partículas, ele mostrou que
buracos negros perdem sua massa
bem devagarinho, como se estivessem
evaporando. Ora, se buracos negros
evaporam, o que ocorre com toda a
massa que engoliram enquanto existiram, inclusive a matéria da estrela que
deu-lhes origem? Esse é o paradoxo
da informação.
Uma das possibilidades é que a informação que desaparece é "devolvida", bem aos poucos, durante a evaporação do buraco negro. Outra possibilidade, bem mais exótica e improvável, é que buracos negros são passagens para outros pontos do universo,
como se fossem as entradas de túneis.
Nesse caso, a informação simplesmente sairia em outro ponto do espaço. Ainda outra possibilidade é que, ao evaporarem, buracos negros passam
por várias etapas, sendo que as últimas ocorrem em mais de quatro dimensões. A informação que entrou sai
na forma de vibrações de geometrias
com dimensões extra.
Recentemente, Tanmay Vachaspati, um físico indiano trabalhando nos
EUA e seus colaboradores sugeriram
que o problema da informação não
existe porque buracos negros não
existem! Claro, não sabemos ainda como resolver o paradoxo. Mas é óbvio
que muita informação a respeito está
sendo gerada.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"
Texto Anterior: Abóboras do Novo Mundo Próximo Texto: + Marcelo Leite: Cientistas despachantes Índice
|