São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2004

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CIÊNCIA INÚTIL

Prêmio para pesquisas "que não deveriam ser reproduzidas" também contemplou a física da dança havaiana

Karaokê e flatulência de arenque ganham o Ig Nobel

DA REDAÇÃO

O inventor do karaokê, um estudo rigorosamente controlado mostrando a influência da música country nos índices de suicídio nos EUA e duas pesquisas independentes que afirmam que os arenques se comunicam por meio de flatulências ganharam ontem o Ig Nobel, o Nobel da ciência inútil.
O prêmio é concedido todos os anos na semana que antecede o Nobel de verdade pelos editores da revista humorística norte-americana "Anais da Pesquisa Improvável", para pesquisas "que não poderiam ou não deveriam ser reproduzidas".
A cerimônia de entrega dos lauréis aconteceu no vetusto Teatro Sanders, da Universidade Harvard, em Cambridge, e contou com a presença de cientistas ganhadores do Nobel real, além de uma chuva de aviões de papel.
Os "Ig Nóbeis" saíram do Japão, Canadá, Reino Unido, da Dinamarca, da Suécia e de várias partes dos EUA para a cerimônia. Por incrível que pareça, eles não se sentem ridicularizados.
"Eu me sinto muito honrado!", disse à Folha, por e-mail (o ponto de exclamação é dele), o biólogo dinamarquês Magnus Wahlberg, da Universidade de Aarhus. Ele foi laureado em Biologia, juntamente com colegas da Suécia, da Escócia e do Canadá, por mostrar -em estudos realizados independentemente- que os arenques se comunicam por... puns.
Apesar de se deliciar com a galhofa, Wahlberg conta que a razão inicial do estudo foi séria. Ele e o colega sueco Hakan Westerberg estavam trabalhando com a Marinha da Suécia para tentar achar explicações alternativas para um conjunto de sons que os militares acreditavam vir de submarinos russos em águas suecas.
"Acontece que os sons eram flatulências de arenques", diz Wahlberg. "O trabalho foi relatado em 1998, mas nós só o publicamos no ano passado. Por coincidência, foi a mesma época em que [o canadense Ben] Wilson e colegas fizeram descoberta semelhante."
Assim como o Nobel, que às vezes demora anos ou décadas, o Ig Nobel pode vir atrasado. Dois cientistas sociais dos EUA levam o prêmio na categoria Medicina por um trabalho publicado em 1992: um artigo na revista "Social Forces" intitulado "O Efeito da Música Country no Suicídio."
Jim Gundlach, da Universidade de Auburn (Alabama), que assina o trabalho juntamente com Steven Stack, da Universidade Estadual Wayne (Michigan), conta que tudo começou num curso que ele dava de pós-graduação em estatísticas sociais.
"Nós estávamos trabalhando com dados de suicídio nos EUA e a cidade com maior diferença entre a taxa prevista e a observada era Nashville, no Tennessee. Já que Nashville é conhecida como a capital da música country, todo mundo em classe pensou: "Música country'", disse. "Nosso modelo explica 51% da variância nas taxas de suicídio entre brancos."
Não é que Garth Brooks -ou Zezé Di Camargo e Luciano- seja capaz, em si, de induzir ao suicídio. Trata-se, segundo Gundlach, de uma questão estatística, e ligada a uma "subcultura country", e seu apelo a pessoas em risco.
"Publicamos um estudo mostrando o mesmo efeito com heavy metal", diz Gundlach. (CA)


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