São Paulo, domingo, 02 de março de 2008

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Para Mello, julgamento desta semana é o "mais importante" da história do STF

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) que decidirá sobre o destino no país de pesquisas com células-tronco de embriões humanos será o mais importante dos 180 anos de história da corte, segundo Celso de Mello, o mais antigo dos 11 ministros, e Carlos Ayres Britto, o relator da ação.
"Esse é o processo mais importante em toda a história do tribunal, porque envolve o direito à vida. Não cometo nenhum exagero ao afirmar isso", disse Mello à Folha. Ayres Britto concorda, mas aponta outro motivo. "A ação põe Igreja Católica e ciência em posições antagônicas."
Trata-se de uma ação direta de inconstitucionalidade movida pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles contra a Lei de Biossegurança (nº 11.105), de três anos atrás.
A decisão é considerada estratégica tanto pela Igreja Católica quanto pela comunidade científica. Em abril de 2007, Britto realizou uma audiência pública sobre o tema, a primeira na história do STF.
A CNBB vê nessa causa o risco de o STF abrir caminho para que no futuro novas formas de aborto sejam criadas -ou que o próprio aborto seja legalizado.
Isso porque, para extrair células-tronco embrionárias, é necessário destruir os blastocistos, embriões humanos com cerca de cinco dias de vida e formados por uma centena de células. Os católicos não enxergam diferença entre um blastocisto e um feto ou um ser humano adulto. Para eles, todos são "pessoas humanas" com direito inviolável à vida.
A CNBB vai além: "A manipulação e sacrifício de seres humanos embrionários são o primeiro grande passo para a clonagem e produção laboratoriais de seres humanos descartáveis, tema que os filmes de ficção científica já começam a explorar", diz, em memorial entregue aos ministros.
"Tenho certeza que essa Lei da Biossegurança abre caminho para a legalização progressiva do aborto e o desrespeito da vida humana. Tudo começa nessa primeira transigência, que significaria abrir as portas para outras formas de manipulação da vida humana nascente", disse na sexta-feira dom Dimas Lara Barbosa, secretário-geral da CNBB.
Já os cientistas dizem que, sem pesquisar células-tronco de embriões, o Brasil ficará a reboque de outros países e terá de pagar royalties altíssimos para aqueles que descobrirem a cura de doenças graves.
A Conectas Direitos Humanos, uma das organizações não-governamentais que atuam na ação em defesa da pesquisa, sustenta que há 19 teorias sobre o momento do início da vida, que variam da concepção ao parto. Tamanha divergência abriria brecha para o surgimento de convicções de ordem religiosa.
"Nem a ciência nem a religião foram capazes de oferecer um critério único para estabelecer quando a vida começa e, em um Estado laico, a interpretação constitucional não pode ser subordinada por dogmas de fé", diz a Conectas.
O advogado Luís Roberto Barroso, em nome da Movitae (Movimento em Prol da Vida), outra ONG que atua na mesma linha, traçou outra estratégia: tentará evitar que a polêmica fique em torno do início da vida para tentar desvincular esse julgamento do tema aborto.
"Um embrião que não possa ser implantado em um útero materno não pode ser considerado uma vida potencial. Portanto, a questão do momento do início da vida não se coloca aqui e constitui um falso problema", afirmou.
A questão a ser decidida é moral, segundo a pesquisadora Lygia Pereira, da USP, favorável ao uso das células-tronco embrionária em pesquisas.
"Não vou dizer que aquele embrião não é uma forma de vida humana; ele é, sim. Agora, um feto que resulta de estupro também é uma forma de vida humana, que a nossa lei deixa ser violada. Então é uma questão de a gente decidir se esse embrião, nas condições da Lei de Biossegurança, é uma forma de vida inviolável." (SF e JN)


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