São Paulo, sábado, 03 de abril de 2004

Próximo Texto | Índice

POLÍTICA CIENTÍFICA

Pesquisador de país mais pobre tem desvantagem adicional com preços de equipamentos e materiais

Brasileiro paga até 70% mais por insumos

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Como se competir com os orçamentos milionários de americanos e europeus já não fosse ruim o bastante, cientistas dos países pobres têm outro adversário: o preço dos equipamentos e substâncias de laboratório. O mesmo produto pode custar até 70% mais para um pesquisador brasileiro do que para seu colega nos EUA.
A estimativa é de uma pesquisa publicada na última edição da revista britânica "Nature" (www.nature.com). Ela foi desencadeada, em parte, por reclamações dos próprios cientistas brasileiros.
"Felizmente os editores se animaram com a idéia", diz o neurocientista Stevens Kastrup Rehen, 32, que divide seu tempo entre a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e o Instituto de Pesquisa Scripps, na Califórnia.
O levantamento comparou o preço de aparelhos e reagentes de laboratório na Alemanha e na sua contraparte "subdesenvolvida" na Europa, a Polônia. Fez o mesmo na América, comparando os mercados americano e brasileiro.
Dos 12 produtos comparados entre EUA e Brasil, só um não era mais caro em território nacional. Na comparação germano-polonesa, os alemães pagam menos por 16 dos 18 produtos.
A "Nature" pediu que um cientista em cada país informasse o preço de produtos de uso comum em laboratórios da área biológica, que trazem a marca de oito grandes fornecedores do ramo.
A diferença é especialmente pronunciada entre Estados Unidos e Brasil. Uma centrífuga Eppendorf, usada para manter homogêneos os meios de cultura onde proliferam microrganismos de laboratório, custa US$ 1.950 para um cientista americano. Para o brasileiro, sai por US$ 3.110 -quase 60% a mais.
Quem quiser comprar um quilo de extrato de levedura da Sigma-Aldrich, por sua vez, paga US$ 202 nos EUA. No Brasil, US$ 340 -diferença de 70% para cima.
A Folha apurou que, na área das agências de fomento à pesquisa no país, esse desnível é atribuído a uma série de razões. Para alguns cientistas, nos países mais pobres as filiais e os distribuidores tentam compensar o risco maior de inadimplência com a prática de preços mais altos.
Além disso, o fato de terem clientes seguros e com receita garantida no mundo desenvolvido também faz com que a política de descontos seja mais generosa com os americanos e europeus ocidentais. Outro problema é o maior número de fornecedores competindo nos países ricos, o que tende a gerar preços mais baixos.
"É um grande problema, tudo é tão caro na Polônia que nós precisamos ter 75% mais dinheiro", reclamou à "Nature" Jan Potempa, microbiologista da Universidade Jageloniana de Cracóvia e da Universidade da Geórgia, nos EUA. "Conheço cientistas poloneses que sempre voltam dos Estados Unidos com as malas cheias de produtos científicos", conta ele.
Rehen, que se diz desanimado com a perspectiva de tocar um laboratório no Rio com as condições atuais de preços, sugere medidas: "Podemos negociar, através de nossas sociedades representativas, o abatimento dos preços ou a redução da margem de lucro, baseando-nos na comparação dos preços entre países", diz.


Próximo Texto: Outro lado: Imposto encarece os produtos, diz companhia
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.