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Cometas viram "vilões" do Sistema Solar
Encontro da União Astronômica Internacional começa hoje no Rio em meio a debate sobre impacto recente em Júpiter
População desse tipo de corpo celeste pode ser maior do que se pensava; estudos novos revelam colisões que a Terra sofreu no passado
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Filmes como "Impacto Profundo" e "Armageddon" popularizaram a ideia de que um dia
a Terra pode ser destruída por
um asteroide gigante. Se os roteiristas quiserem escrever algo mais realista, porém, estudos recentes sugerem que eles
deveriam pensar em outro tipo
de corpo celestial: os cometas.
"É muito mais frequente a
colisão de um asteroide que a
de um cometa, mas quando se
trata de cometas e asteroides
grandes, a história muda", disse
à Folha Julio Ángel Fernández, cientista que coordena um
simpósio nesta semana sobre o
tema. O evento faz parte da Assembleia Geral da IAU (União
Astronômica Internacional), o
encontro mais importante da
área, que começa hoje no Rio
de Janeiro e vai até dia 14.
Cometas já eram assunto
quente, mas ficaram ainda
mais de duas semanas para cá,
após o registro de um sinal raro
em Júpiter: a marca de uma colisão (provavelmente de um cometa), a segunda em 15 anos.
Em 1994, telescópios viram o
planeta engolindo um cometa,
o Shoemaker-Levy 9, num espetáculo jamais visto até então.
"Foi uma surpresa", diz Fernández, professor da Universidade da República, de Montevidéu. "Como Júpiter é muito
maciço, colisões de cometas
são mesmo mais frequentes lá
do que na Terra. Mas estimativas considerando a população
de cometas indicavam que um
choque desses ocorreria só a
cada mil ou 10 mil anos."
Choques como esse ocorrem
quando cometas mergulham
desde lugares distantes como o
cinturão de Kuiper (região orbital de Plutão) na direção do
Sol. Outro lugar de onde muitos cometas vêm é a nuvem de
Oort, uma região esférica que
engloba todo o Sistema Solar.
Abalo gravitacional
Para saber que tipo de perturbação tira cometas da região
de Oort e os injeta no Sistema
Solar interior, Marc Fouchard,
do Observatório de Paris, tem
feito simulações de computador. Uma delas indica que a
"maré galáctica" -efeito da
gravidade da Via Láctea nos
corpos em seu interior- provoca isso. E a nuvem de Oort também é perturbada pela passagem de estrelas perto do Sol.
"Elas agem em sinergia com a
maré de modo que a taxa total
de injeção fica bem maior do
que a soma das duas taxas", diz
Fouchard, que deve vir para a
assembleia da IAU no Rio.
Um estudo publicado sexta-feira passada também deve
aquecer o debate, mostrando
que cometas da nuvem de Oort
podem mergulhar no Sistema
Solar interior atraídos pela própria gravidade de Júpiter. O
trabalho, de Nathan Kaib, da
Universidade de Washington,
afirma que colisões de objetos
egressos de Oort com a Terra
são na verdade são muito raras,
pois Júpiter pode engoli-los antes. Mas ainda está em debate
se o planeta gigante atua mais
como escudo protetor da Terra
ou com vilão, atraindo cometas.
Um estudo recente, do Instituto Niels Bohr, da Dinamarca,
também deve ser alvo de discussão na IAU. O trabalho mostrou que o bombardeio de corpos celestes que castigou a Terra há mais de 4 bilhões de anos
não era uma chuva de asteroides, e sim de cometas.
Até a famosa explosão de
Tunguska, que destruiu 2.000
km2 de floresta na Sibéria em
1908, deve agora ser atribuída a
um cometa, diz o novo estudo
de um grupo de astrônomos da
Universidade Cornell (EUA).
Passando o cinturão
No limite, novas descobertas
podem até fazer com que faixa
orbital entre Marte e Júpiter
-o cinturão de asteroides-
mude de nome. Estudos têm
mostrado que muitos dos corpos celestes que habitam aquela região estão cobertos de uma
poeira que pode ser material
volátil: característica típica de
cometas, que dá a eles as suas
caudas quando se aproximam
do Sol. Asteroides têm composição rochosa mais compacta.
Um estudo publicado em
abril pela revista "Nature" indica que muitos dos objetos no
cinturão de asteroides são na
verdade "invasores" que saíram do cinturão de Kuiper e da
nuvem de Oort. Um dos autores do trabalho, Alessandro
Morbidelli, do Observatório de
Côte d'Azur, de Nice, também
deve vir para o encontro no Rio.
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