São Paulo, sexta-feira, 03 de setembro de 2010

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Universo não precisou de Deus para surgir, diz físico

Britânico Stephen Hawking, 68, reacende polêmica religiosa em novo livro

Cientista-celebridade aposta em múltiplos cosmos para explicar leis da natureza sem recorrer a divindades

Valentin Flaraud - 9.set.2009/Reuters
Stephen Hawking antes de palestra em Meyrin, na Suíça, em setembro de 2009

SABINE RIGHETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR INTERINO DE CIÊNCIA

O físico-celebridade britânico Stephen Hawking aparentemente cansou de bancar o bonzinho com Deus. Em seu mais novo livro, ele afirma que o Criador é dispensável para explicar o Universo.
E isso porque a obra de Hawking, 68, recebeu o nome enganoso de "The Grand Design" ("O Projeto Grandioso"). Mas, junto com o físico e coautor Leonard Mlodinow, o que ele faz no texto é negar a existência de um projeto divino para o Cosmos.
"Uma vez que existe uma lei como a gravidade, o Universo pode e vai criar a si mesmo a partir do nada. A criação espontânea é a razão pela qual existe alguma coisa no lugar de coisa nenhuma, a razão de nós existirmos. Não é preciso invocar Deus para que o Universo tenha um começo", escreveu a dupla.
O trecho do livro, que só chega às lojas na semana que vem, foi publicado no diário "Times", de Londres.

RABINO REBATE
O bafafá em torno das frases fez com que Hawking fosse um dos temas mais comentados no Twitter ontem e levou até a uma réplica mal-humorada do rabino-chefe do Reino Unido, Lorde Jonathan Sacks. "A ciência que se disfarça de religião é tão perniciosa quanto a religião que se disfarça de ciência", disse.
A imprensa britânica chegou a pintar o livro como uma virada de casaca. "Parece que levaram ao pé da letra a afirmação dele sobre Deus na obra "Uma Breve História do Tempo", de 1988", diz o físico Leandro Tessler, da Unicamp. Nesse best-seller, Hawking disse que entender as leis do Universo seria como ler "a mente de Deus".
Mais tarde, porém, deixou claro que se tratava de uma metáfora e afirmou que não era religioso. Quase totalmente paralisado e com fama de gênio, Hawking tem aura de profeta da ciência, mas não há nada de realmente novo no que escreveu.
"A ideia de que o Universo surgiu do nada, de que as teorias físicas permitem isso, não é nova. Resulta da junção entre teoria da relatividade e mecânica quântica", diz Roberto Belisário, doutor em física pela Unicamp.
No livro, Hawking se diz defensor de uma das possíveis junções das duas teorias. Segundo ela, haveria um Multiverso -ou seja, infinitos universos, entre os quais este aqui seria só mais um.
A existência do Multiverso resolve, em tese, a estranha coincidência de que o Universo conhecido parece ter sido "regulado" para que estrelas, planetas e seres vivos pudessem surgir. Se há infinitos universos, um deles, inevitavelmente, teria condições pró-vida. Não há, contudo, indício direto da existência desses outros cosmos.
"No fim das contas, assim como não é possível provar pela ciência que Deus existe, também não é possível provar que não existe -e nem mesmo que ele é desnecessário", afirma Belisário.


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