São Paulo, segunda-feira, 04 de fevereiro de 2008

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Governo descarta reduzir reserva legal na Amazônia

Secretário rejeita negociar lei que impede produtor de desmatar 80% de sua terra

Mudança seria "catástrofe", diz João Paulo Capobianco, que defende a reação do presidente Lula ao aumento da devastação na Amazônia

José Cruz/Agência Brasil
O secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco


CLAUDIO ANGELO
EM BRASÍLIA

O secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, tem um recado para os produtores rurais da Amazônia: o governo não está disposto a negociar a redução da reserva legal nas propriedades rurais em área de floresta para menos de 80%.
É crescente a pressão da agroindústria para que seja "flexibilizada" a lei que determina que apenas 20% da área de uma fazenda possa ser desmatada. Segundo produtores, esse limite torna fazendas economicamente inviáveis.
Até o começo do segundo semestre de 2007 a derrubada na Amazônia vinha caindo. Na semana retrasada, no entanto, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais estimou que o desmatamento de agosto a dezembro poderia ter alcançado 7.000 km2, o que causou reações fortes por parte do do governo de Mato Grosso e fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandar o Inpe conferir os dados em campo.
Capobianco, no entanto, defende Lula e atribui as dúvidas do presidente às "informações que ficam circulando pela imprensa". Leia entrevista que o secretário concedeu à Folha:

 

FOLHA - Quando o Inpe dizia que o desmatamento estava caindo, ninguém questionava. Por que essa celeuma em torno do dado agora?
JOÃO PAULO CAPOBIANCO
- Primeiro, em função do fato de que existem mais dados atualmente. A Amazônia ganhou, nos últimos anos, dois novos sistemas [de detecção de desmate]. Em 2004 ganhou o Deter, do Inpe, e em 2005 ganhou o SAD, do Imazon. E os próprios órgãos estaduais também estão produzindo dados. Agora, independentemente de considerarmos que o debate é importante e que é bom que esses dados sejam discutidos, é evidente que existe um certo movimento para desviar a questão central do debate, que é uma mudança na curva descendente, e questionar dado neste momento é uma forma de tentar relativizar as ações do governo.

FOLHA - Certo movimento por parte de quem? Do setor produtivo?
CAPOBIANCO
- Eu acredito sinceramente que todos foram pegos de surpresa.

FOLHA - Mas no meio do ano o Imazon já tinha soltado o dado de que o desmate havia crescido.
CAPOBIANCO
- Nós operamos com o dado do Deter. Para nós, até 30 de julho, são dados computados no Prodes [sistema de detecção anual do desmate] do ano passado. Comparando agosto de 2007 com agosto de 2006 no Deter, tem redução. Comparando setembro de 2007 com setembro de 2006 pelo Deter, também tem redução. O aumento começa a aparecer em outubro.

FOLHA - Por que o presidente mandou rechecar os números?
CAPOBIANCO
- Não se trata de uma rechecagem. O que o presidente manifestou desde o início é que precisa olhar esse desmatamento e ver o que está acontecendo. Qual é o fator motivador desse processo.

FOLHA - Mas o fator estava claro.
CAPOBIANCO
- Para nós estava. Mas nós não tínhamos uma ida a campo do ministério que pudesse ser um tira-teima...

FOLHA - Mas nunca se precisou de tira-teima. Apesar de o Deter não servir para cálculo de área, ele tem sido usado para dar estimativas de desmatamento desde 2005, quando a taxa começou a cair. Por que agora é preciso checar em campo?
CAPOBIANCO
- Primeiro, quando a gente elaborou o Deter, foi para um monitoramento preventivo. Realmente não era cômputo de área. Mas, a partir de 2004, nas comparações que foram feitas com 2004, o Deter permitiu gerar uma estimativa. E a geração dessa estimativa passou a ser importante porque o Prodes não tem como ficar pronto a ponto de fazer projeções enquanto a coisa está ocorrendo. Nosso acordo com o governo foi que o Prodes passasse a dar uma estimativa no mesmo ano do desmatamento, e a confirmação no ano seguinte. Agora, o dado parcial do Deter nós nunca tínhamos lançado. Estamos lançando agora porque houve uma reversão.
Agora, com relação ao presidente, em nenhum momento ele falou: "Vai verificar primeiro e, depois, se confirmar, a gente assina decreto etc." Todas as medidas foram autorizadas e feitas. Agora, se você tem informações que ficam circulando pela imprensa de que um governador diz que o dado está errado, que tem gente burilando essa história...

FOLHA - A culpa é da imprensa?
CAPOBIANCO
- Não é culpa da imprensa. Você tem uma porrada de informações sendo veiculadas sobre isso. É natural que o presidente mande checar esse negócio. Mas não é checar primeiro para depois agir. É ação imediata. O vôo que fizemos não foi para conferir o Deter e sim para verificar o que estava ocorrendo. A pergunta que o presidente nos fez foi: essa situação do segundo semestre de 2007 implica que haverá aumento na taxa anual do desmatamento? E a resposta é não. Se as medidas forem adotadas, podemos manter a redução.

FOLHA - E a discussão de reserva legal? O governo não quer mexer nisso, mas está sendo pressionado...
CAPOBIANCO
- Primeiro é preciso saber qual é o ponto de partida. Se o ponto de partida é que a reserva legal é 80%, se esse é o entendimento, e o próprio governador Blairo Maggi disse que esse é o entendimento dele, se esse é o consenso, não tem mais o que discutir.

FOLHA - Então, para fins de novos desmatamentos, não haverá revisão de reserva legal?
CAPOBIANCO
- Para efeito de desmatamento, de forma alguma. Seria uma catástrofe. Seria legalizar o desmatamento.


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