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Remédio inócuo se espalha mais facilmente, diz estudo
Tratamento que nunca chega à cura ganha exposição pública por mais tempo
Simulação matemática explica por que as práticas clínicas sem comprovação continuam a se espalhar na era da medicina científica
Stephen Shaver-09.jun.2002/France Presse
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Feira chinesa vende barbatana de tubarão, suposto remédio
DA REPORTAGEM LOCAL
Com muita frequência, remédios alternativos falham em
mostrar sucesso ao serem submetidos a testes clínicos. Mesmo assim, produtos de eficácia
duvidosa -como extrato de
Gingko biloba (receitado contra demências) e raspas de barbatana de tubarão (contra câncer)- parecem estar proliferando cada vez mais. Segundo
um novo estudo, porém, não há
contradição aí: é justamente
pela qualidade de serem inócuas que essas "receitas milagrosas" ganham terreno.
Essa conclusão "contraintuitiva", conforme reconhecem os
autores do trabalho, saiu de um
modelo matemático que simula como a adoção de um determinado tratamento se dissemina numa sociedade. Em artigo
científico na revista "PLoS
ONE" (www.plosone.org) o
biólogo e matemático Mark Tanaka, da Universidade de Nova
Gales do Sul (Austrália) explica
com mais dois colegas como
chegou a esse resultado.
Segundo o pesquisador, a
disseminação de práticas médicas sem comprovação de eficácia é, por um lado, um fenômeno ligado à automedicação.
Por outro, inclui práticas de curandeirismo em comunidades
onde não há médicos. Como
pessoas tendem a aprender as
coisas por imitação, os remédios que são usados de maneira
crônica sem nunca levarem à
cura tendem a ganhar mais
propaganda, porque passam
mais tempo sendo usados.
"Nós mostramos que os tratamentos que proliferam não
são necessariamente aqueles
mais eficazes em curar a doença", escrevem Tanaka e colegas. "Explicamos por que "tratamentos supersticiosos" com
pouca eficácia e mesmo práticas inadequadas podem se espalhar em diversas condições."
Assinam também o estudo o
antropólogo Jeremy Kendal,
da Universidade de Durham, e
o biólogo Kevin Laland, da
Universidade de Saint Andrews, ambas no Reino Unido.
A união de três especialidades científicas em um mesmo
estudo ocorreu porque o trabalho é uma simulação estatística
aplicada a fenômenos evolutivos de comportamento.
Os pesquisadores partem do
princípio de que existe um tipo
de "seleção natural" entre boas
e más práticas. Quando se trata
de interação social, porém, práticas nocivas podem ser mais
"adaptadas" a sobreviver numa
comunidade, desde que consigam se disseminar rápido.
Para formular a equação que
levou a essa conclusão, os pesquisadores partiram do princípio de que o que torna um remédio popular é a "cópia não
enviesada", ou seja, quanto
mais um remédio aparece sendo usado por alguém, mais ele
tende a ser adotado por outros.
Propaganda prolongada
"A cópia não enviesada de
novos tratamentos pode frequentemente levar à prevalência de práticas ineficazes porque tais tratamentos são demonstrados com mais persistência do que as alternativas
eficazes", escreve Tanaka.
Segundo o pesquisador,
quando um remédio se mostra
ineficaz para uma pessoa por
longo tempo, é claro que tende
a ser abandonado. No caso de
alguns tratamentos, porém, a
"propaganda" que o doente faz
da droga inócua se prolonga
por tanto tempo que a desistência só ocorre depois de muitas pessoas terem sido influenciadas, indica a simulação.
É um efeito estranho, similar
às bizarrices descritas no best-seller "Freakonomics". A cópia
não enviesada, porém, é uma
"suposição simples" usada para
a simulação, reconhece Tanaka. Ele defende, contudo, que o
fenômeno "está próximo da
realidade". O mesmo se aplica à
popularidade de nomes de bebês e de raças de cachorros, diz
o cientista.
(RAFAEL GARCIA)
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