|
Próximo Texto | Índice
PALEONTOLOGIA
Organismo com simetria bilateral, traço de seres mais complexos, viveu há mais de 580 milhões de anos
China tem animal "moderno" mais antigo
MARCUS VINICIUS MARINHO
DA REPORTAGEM LOCAL
A China está se confirmando
como o novo berço da evolução.
Segundo um estudo de chineses e
americanos, fósseis minúsculos
achados no país mostram que formas de vida complexas surgiram
bem mais cedo do que se imaginava -pelo menos 30 milhões de
anos antes.
Os cientistas descobriram em
rochas de fosfato a evidência mais
antiga de animais complexos o
suficiente para ter simetria bilateral -situação na qual o corpo pode ser dividido em duas metades
opostas e semelhantes. A característica está
presente em animais considerados mais "avançados", como insetos, peixes e seres humanos.
Os fósseis de um animal de dois
décimos de milímetro, encontrado na província de Guizhou, no
sul da China, têm de 580 milhões a
600 milhões de anos de idade. As
evidências apontam que esse minúsculo bicho, o Vernanimalcula
guizhouena, tinha uma boca,
uma faringe e duas proeminências que lhe serviam como sistema sensorial, apontando o caminho a ser seguido. Isso é uma surpresa para a comunidade científica, já que se achava que animais
assim só haviam surgido pouco
antes do período Cambriano, que
começou há 540 milhões de anos.
"Eram minúsculas estruturas
ovais que andavam no fundo de
águas rasas, sugando micróbios e
pequenas criaturas oceânicas",
disse um dos autores da pesquisa,
o americano David Bottjer, 52, da
Universidade do Sul da Califórnia, nos EUA. "Achamos pistas
importantes sobre a origem da vida e sobre como e quando os animais evoluíram na Terra. Pensávamos que a vida tivesse evoluído
depois, mas nosso estudo empurra para trás a fronteira."
A primeira forma de vida viveu
há mais de 3 bilhões de anos. Segundo Bottjer, o advento da simetria bilateral foi um marco evolutivo. "É uma coisa ligada à movimentação dos animais. Como
eles passam a ter um "eixo" que
delimita lados bem definidos, podem se mover em uma direção
determinada e em linha reta."
Para ele, deve ter existido um
animal ainda mais velho com esse
tipo de orientação corporal. "A
complexidade do organismo que
encontramos sugere que devem
existir organismos bilaterais ainda mais velhos, pelo menos mais
uns 100 milhões de anos. Aliás, é o
que tentaremos achar agora. Temos certeza que, se continuarmos estudando essas rochas,
acharemos mais alguma coisa."
Rochas e trilhas
As rochas da formação geológica de Doushantuo, onde foram
achados os microrganismos, escavadas minuciosamente pelos
colaboradores chineses de Bottjer, podem ter provocado uma reviravolta para a paleontologia.
Antes se achava que esse e outros
níveis de complexidade só haviam aparecido durante a chamada "explosão do Cambriano".
"A "explosão" foi um grande florescimento de animais, e há basicamente duas vertentes de interpretação. A primeira diz que foi
nessa época que as principais formas de complexidade, como a bilateralidade, apareceram. Nossa
descoberta dá mais subsídios para
a outra, que diz que esses fatores
de complexidade já existiam e que
tudo o que ocorreu foi uma ampliação da escala: os animais começaram a ficar maiores."
As descobertas, no entanto, já
provocam polêmica. Segundo
Stefan Bengston, do Museu Sueco
de História Natural, em Estocolmo, os supostos fósseis podem
nem ter sido originados de seres
vivos e ser apenas formações incomuns de minerais.
Bottjer rejeita a hipótese: "É
normal que algumas pessoas estejam céticas quanto a nossos resultados, já que é difícil pesquisar
coisas tão pequenas e tão velhas.
Mas temos dez espécimes do nosso animal e os investigamos de
tantas maneiras que posso dizer,
com certeza, que estavam vivos."
Segundo o americano, a existência dos microorganismos era
esperada. "Já havia evidências genéticas de que esse tipo de animal
devia ser mais antigo que os do
começo do Cambriano. Animais
bilaterais normalmente deixam
trilhas no solo, o que ninguém havia visto. Isso nos levou a pensar
que, se eles existissem, deveriam
ser microscópicos", diz Bottjer.
"Por isso, acho, ninguém descobria esses rastros", afirma.
Seu estudo sai hoje na versão
on-line da revista "Science"
(www.sciencexpress.org).
Próximo Texto: Panorâmica - Ambiente: Governo cria novas áreas de conservação Índice
|