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ESPAÇO
Defeito durante primeiro lançamento do Projeto Microgravidade, domingo no MA, faz carga útil se espatifar no mar
Falha em foguete destrói experimentos
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Logo após o lançamento, domingo, Otávio Durão correu da
sacada para o centro de controle,
no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão. No
telão, a animação mostrava a trajetória prevista do foguete, sobreposta ao traçado real. Por 20 segundos, tudo pareceu estar indo
bem. Então o foguete começou a
se desviar. "Logo todo mundo viu
que algo estava dando errado."
Esse foi só o primeiro dos problemas que levaram ao fracasso
do primeiro vôo do Projeto Microgravidade. Dos oito experimentos, apenas três conseguiram
obter algum proveito científico.
Os outros cinco repousam, em
um ou vários pedaços, no fundo
do oceano Atlântico.
A euforia foi substituída pelo
desânimo não só de Durão, engenheiro do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que
trabalhou na seleção dos oito experimentos que voaram no domingo, mas dos cerca de 30 cientistas que acompanhavam ansiosos os resultados dos engenhos
embarcados no veículo.
A mudança inesperada na trajetória do foguete aconteceu por
uma falha na cinta que prende o
propulsor ao compartimento de
carga útil. Ele deveria se desprender após 61 segundos de vôo, mas
se rompeu aos 20, enquanto o
propulsor ainda estava queimando combustível. O resultado foi
que o compartimento de carga
útil levou uma trombada do propulsor, o que tirou o veículo completamente da rota planejada.
Em vez de atingir um apogeu
(altitude máxima) de 180 km, chegou apenas aos 119 km. Apesar de
a plataforma que equipa o módulo de carga útil ter feito um excelente trabalho para estabilizar o
compartimento, de modo a obter
o efeito de microgravidade (que
ocorre quando a curvatura descrita pelo objeto acompanha a da
Terra, como se ele estivesse temporariamente orbitando o planeta), a alegria não durou muito.
"A plataforma foi valente e funcionou além das expectativas,
mas não conseguimos mais que
30 segundos de microgravidade",
diz Mauro Melo Dolinsky, coordenador de logística da operação.
A expectativa era de três minutos
com aparente ausência de peso.
Salvos pelo rádio
Dos oito experimentos, três dependiam exclusivamente dos sinais de telemetria enviados pelo
veículo durante o período de microgravidade. Nesses casos, foi
possível obter algum resultado
científico. Os outros cinco, entretanto, só seriam verificados após
o resgate da carga útil. A queda do
compartimento não foi dentro da
área prevista originalmente, mas
perto o suficiente para permitir o
trabalho das equipes de resgate.
Graças a um instrumento de
GPS (Sistema de Posicionamento
Global) instalado no veículo, elas
sabiam exatamente onde procurar. Mas, quando chegaram lá, tudo que encontraram foi o pára-quedas, em frangalhos. "Houve
um problema com o pára-quedas", relata Dolinsky. "Ou ele não
aguentou o tranco ou não se abriu
corretamente."
Em vez de um pouso suave no
mar (suave em termos: dias atrás,
Dolinsky o havia comparado ao
pouso de um rei momo pára-quedista), a carga útil, com seus 220
kg, se espatifou no oceano e afundou. "Numa queda de cem quilômetros sem pára-quedas, o choque com a água é como se fosse
em concreto", descreve Durão.
Dolinsky e sua equipe ainda estão trabalhando sobre os dados
para descobrir exatamente o porquê das falhas. Eles estão trabalhando com os parceiros alemães,
que são os criadores das tecnologias da cinta e da plataforma que
permite o vôo de microgravidade
a bordo dos foguetes VS-30.
Recuperar a carga útil, entretanto, parece fora de cogitação. "Ela
afundou numa região do mar
com 25 metros de profundidade e
não é uma coisa leve. Só a Petrobras tem equipamento para tirar
isso do mar", diz Dolinsky. A
idéia original era reutilizar a plataforma em futuros vôos, mas,
depois do impacto, é improvável
que algo possa ser aproveitado.
Futuro do projeto
A Agência Espacial Brasileira
ainda não decidiu qual será o futuro do projeto. "Nós já estávamos até planejando um anúncio
de oportunidade para uma segunda rodada de experimentos,
mas agora não sabemos mais como vai ficar", afirma Durão.
Segundo Marta Carvalho Humann, responsável pelo projeto
na AEB, ainda é cedo para saber o
que o futuro reserva. "Antes de
mais nada, precisamos saber direito o que deu errado", diz.
Apesar do tropeço, a avaliação
de Humann tem um tom agridoce. "Nem todos os objetivos foram alcançados, mas alguns foram, como o treinamento de estudantes e a integração das equipes
-muitos dos cientistas nunca tinham visto um lançamento antes." A AEB gastou cerca de R$
800 mil no projeto, cuja meta é
preparar cientistas brasileiros para criar experimentos para a ISS
(Estação Espacial Internacional).
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