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Ação tenta barrar usina no Ceará
Termelétrica a carvão do grupo de Eike Batista ameaça o povo e o ambiente, diz defensor público
Pesquisadora alerta para o problema da falta d'água; cronograma mostra que obras vão começar ainda durante o mês de maio
KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM FORTALEZA
Uma ação da Defensoria Pública do Ceará tenta barrar, na
Justiça, o início das obras de
uma usina termelétrica a ser
construída no Pecém, litoral
cearense (a 60 km de Fortaleza). O motivo é o uso do carvão
mineral para a geração de energia, combustível fóssil poluente
que ajuda a provocar o aumento do aquecimento global.
A usina é mais um empreendimento do grupo MPX, do empresário Eike Batista, que pretende instalar no país nove termelétricas nos próximos anos,
seis delas movidas a carvão. A
do Pecém será a segunda
maior, com capacidade de gerar
1.080 MW, quando sua segunda
etapa estiver pronta, em 2014.
Além da emissão de gases e
metais poluentes, a queima de
carvão libera dióxido de carbono, o CO2, que contribui diretamente para o aquecimento global, fenômeno que poderá causar, entre outros problemas, o
aumento do nível dos mares.
Um documento recente, entregue ao Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis) pela Associação Brasileira
de Energia Nuclear, baseado
em dados europeus, demonstra
que termelétricas a carvão
emitem de 838 gramas a 1.231
gramas de CO2 por KWh a cada
ano, enquanto as movidas a gás
emitem de 399 gramas a 644
gramas. Há opções de energia
que emitem menos CO2: a
energia solar (de 78 gramas a
217 gramas), a eólica (de 10 gramas a 38 gramas) e a hidrelétrica (de 4 gramas a 36 gramas).
O carvão é a opção hoje preferida por empresários por ser
a mais lucrativa. A energia a ser
produzida pela usina do Pecém
já foi comercializada pela MPX,
em um leilão de energia promovido em outubro do ano
passado, com um preço de R$
125,95 por MWh.
Com esse preço, o faturamento anual previsto é de R$
417,42 milhões.
Impacto ambiental
Para tentar barrar o início
das obras da termelétrica, marcado para este mês, o defensor
público Thiago Tozzi está movendo ação civil pública para
anular a licença ambiental já
concedida pela Semace (Superintendência de Meio Ambiente do Estado do Ceará).
O licenciamento foi feito
com base em um EIA/Rima
(estudo e relatório de impacto
ambiental) produzido por uma
empresa contratada pela própria MPX. Para Tozzi, o estudo
é parcial e incompleto, mas ainda assim dá indícios dos problemas que poderão ser causados
pela usina a carvão.
O EIA/Rima diz que há possibilidade de poluição do ar,
contaminação, acidentes ambientais e de risco de falta d'água para a comunidade de São
Gonçalo do Amarante, onde fica a praia do Pecém.
Para Sônia Hess, pós-doutora em química orgânica e professora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul), os riscos à saúde e ao ambiente causados pela emissão
de gases poluentes podem até
ser minimizados com o uso de
novas tecnologias, mas não há
como superar o problema do
grande uso de água pelas termelétricas a carvão.
"Em uma região como o Ceará, onde não há, muitas vezes,
água suficiente até para o consumo humano, um projeto desses pode, sim, causar sérios danos, especialmente sociais, na
luta pelo direito à água."
Para a pesquisadora, o investimento em energias alternativas, como a solar e a eólica, poderia muito bem evitar a deficiência energética, sem comprometer o ambiente.
"Mas, como são fontes menos lucrativas, não há interesse
[por parte dos empresários]",
diz a cientista da UFMS.
Sem água
No projeto há a estimativa do
uso de 800 l/s de água quando
as duas fases da obra estiverem
prontas, o que significa 2.880
m3/h.
O volume total distribuído
para a própria São Gonçalo do
Amarante, município de 40 mil
habitantes localizado no litoral
do Ceará, é bem menor: segundo a Cagece (Companhia de
Água e Esgoto do Ceará), são
130 m3/h de água.
Em pleno período chuvoso,
como agora, a vazão disponível
nos 13 açudes instalados na bacia do rio Curu, onde está a
área da praia do Pecém, é superior ao que deverá ser usado
pela termelétrica, de 1.497 l/s,
de acordo com relatório da Cogerh (Companhia de Gestão
dos Recursos Hídricos) consultado na última sexta-feira. Em
períodos secos, esse volume total de água disponível cai.
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