São Paulo, domingo, 05 de agosto de 2007

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Cabeças feitas

Novo estudo revela o poder da mensagem subliminar, mas não fornece o que publicitários querem ter

Karel Navarro-09.fev.2006/Associated Press
Visitantes de museu de ciências em Lima, no Peru, observam fragmentos de cérebros reais exibidos em exposição

BENEDICT CAREY
DO "NEW YORK TIMES"

E m um experimento recente, psicólogos da Universidade Yale alteraram o julgamento que as pessoas faziam sobre desconhecidos simplesmente entregando a elas um copo de café.
Os voluntários do estudo não faziam idéia de que seus instintos sociais estavam sendo manipulados deliberadamente. A caminho do laboratório, eles se deparavam com um assistente de pesquisa que carregava livros, uma prancheta, papéis e um copo de café quente ou frio. A pessoa pedia ajuda aos voluntários para segurar o café.
E bastava isso: os estudantes que seguravam o copo de café gelado classificavam outra determinada pessoa, sobre a qual liam depois, como sendo fria, menos sociável e mais egoísta do que seus fizeram os seus colegas que haviam segurado momentaneamente um copo de capuccino quente.
Descobertas como esta, por mais improváveis que pareçam, pipocaram em pesquisas psicológicas dos últimos anos. Novos estudos descobriram que pessoas se arrumam mais quando há um cheiro de perfume no ar; que elas se tornam mais competitivas num jogo se há uma misteriosa maleta de couro na mesa, e ficam mais cooperativas se observam as palavras "confiável" e "amparo" -tudo isso sem estarem conscientes da mudança ou daquilo que a causou.
Psicólogos dizem que "induzir" as pessoas dessa maneira não é algo como hipnose ou mesmo persuasão subliminar; pelo contrário, é a demonstração de como imagens, cheiros e sons podem ativar seletivamente objetivos ou motivações que as pessoas já têm.
Mais fundamentalmente, os novos estudos revelam um cérebro subconsciente que é muito mais ativo, cheio de intenção e independente do que se imaginava. Os objetivos -sejam eles comer, copular ou tomar café gelado- são como perfeitos "softwares" neurais que só podem ser ativados um por vez, e o inconsciente é totalmentecapaz de rodar o programa que escolhe.
O intercâmbio entre essas escolhas inconscientes e nossas metas objetivas e conscientes pode explicar algumas das realidades mais enganadoras sobre comportamento -por exemplo, como podemos ser generosos em um momento e mesquinhos em outro, ou adotar modos rudes num jantar se estivermos convencidos de que isso é algo encantador.

Ação antecipada
"Quando se trata de comportamento, de um momento para outro a grande questão é "O que fazer em seguida'?", diz John Bargh, professor de psicologia em Yale um dos autores do estudo sobre o café.
"Bem, estamos descobrindo que temos esses sistemas de direção comportamentais que estão continuamente fornecendo sugestões ao longo do dia sobre o que fazer em seguida", diz. "O cérebro as avalia e, com freqüência, age com base nelas, antes de acessar a consciência."
E Bargh acrescenta: "Às vezes essas metas estão alinhadas com nossos propósitos e intenções conscientes, às vezes não."
A idéia de influência subliminar têm uma reputação controversa entre cientistas por causa de uma história exagerada -aparentemente uma fraude.
Em 1957, um publicitário chamado James Vicary alegou ter tido sucesso com anúncios secretos num cinema de Nova Jérsei, mostrando no filme fotogramas com as frases "Coma pipoca" e "Beba coca-cola" -rápido demais para que fossem notadas conscientemente.
Anunciantes e autoridades duvidaram da história desde o começo, e, em uma entrevista em 1962, Vicary reconheceu ter "inflado" dados da descoberta na tentativa de atrair atenção para seu negócio.
Estudos posteriores sobre produtos prometendo aprimoramento subliminar -para coisas como memória ou auto-estima- não registraram efeito.
Alguns cientistas alertaram para exageros sobre as implicações das últimas pesquisas sobre metas inconscientes programadas. A nova pesquisa "não prova que a consciência nunca faz nada", diz Roy Baumeister, professor de psicologia na Universidade do Estado da Flórida. "É meio como mostrar que você pode fazer uma ligação direta em um carro para provar que pode ligar o motor sem usar as chaves. Isso é informação importante e potencialmente útil, mas não prova que as chaves não existam ou que elas sejam inúteis."
Mas as novas pesquisas sobre indução deixam claro que não estamos a sós em nossas próprias consciências. Temos uma companhia: um parceiro invisível que reage ao mundo de maneira forte -nem sempre de acordo com nossa maneira-, mas cujos instintos podem ser tão úteis e atentos a outros quanto podem atrapalhar.


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