São Paulo, quarta-feira, 06 de janeiro de 2010

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Estudo cria roedor à prova de obesidade

Animal geneticamente alterado tem organismo menos eficiente no gasto de energia e não engorda com dieta calórica

Pesquisa aponta novo rumo na tentativa de criar terapia para obesos humanos; no entanto, animais são menos resistentes a exercício físico

DA REPORTAGEM LOCAL

Eficiência energética é a palavra de ordem para enfrentar o aquecimento global ultimamente. Mas, como arma contra a obesidade, um grupo de pesquisadores nos EUA aposta mesmo é na ineficiência. Eles conseguiram fazer com que os músculos de camundongos de laboratório virassem gastadores inveterados de energia, o que parece tornar os bichos à prova de engordar.
É como se o organismo dos roedores fosse originalmente um carro 1.0, um bocado econômico, e acabasse transformado num automóvel de luxo, com motor "beberrão". E, gastando mais energia durante atividades físicas, é muito mais difícil se tornar obeso, explica o grupo em artigo na revista especializada "Cell Metabolism".

Molengas
O grupo coordenado por Alexey Alekseev, da Clínica Mayo, um dos principais centros privados de pesquisa médica nos EUA, admite que há um porém na abordagem. Ocorre que os camundongos submetidos ao tratamento (na verdade, um tipo específico de alteração genética) perdem parcialmente a resistência física durante exercícios mais pesados.
Mesmo assim, eles apostam que se trata de uma avenida promissora contra o excesso de gordura, que tem chance de ser explorada em humanos com as devidas modificações. Afinal, em pontos tão básicos do metabolismo quanto o gasto de energia, a diferença entre pessoas e camundongos é bem menor do que se imagina.
Ao operar seu truque, Alekseev e companhia precisam brigar com milhões de anos de evolução. É que, num mundo onde a comida sempre foi escassa, o organismo dos seres vivos foi otimizado pela seleção natural para ser pão-duro, economizando o máximo de energia para continuar vivo.
Um desses mecanismos para evitar a gastança é o chamado canal de potássio sensível a ATP, ou canal KATP, para encurtar (veja infográfico acima). Trata-se de um sensor, especialmente importante nas células dos músculos, que está atento à presença de ATP, molécula que é o principal combustível do organismo. Os canais avisam as células sobre a disponibilidade de energia, impedindo que elas gastem mais do que podem obter do corpo.
Os canais KATP, portanto, são "salvaguardas da economia de energia corporal", escrevem os cientistas. A função é importantíssima porque, durante a atividade física, o gasto de energia nos músculos -que em repouso não ultrapassa 20% do total do corpo- pode aumentar até cem vezes. E se o organismo ficasse sem esses sensores?
Foi essa pergunta que os cientistas tentaram responder ao criar camundongos geneticamente modificados que não dispunham dos canais KATP em suas células musculares.
Os pesquisadores compararam o desenvolvimento e o metabolismo dos bichos com outro grupo de camundongos, sem alterações genéticas. As duas classes de cobaias foram acompanhadas durante cerca de um ano, por meio da comparação de parâmetros como consumo de oxigênio e presença de gordura corporal. Ambos os tipos de roedores receberam, em dado momento, dietas ricas em gordura, semelhantes às que levam à obesidade em pessoas.
O que acontece é que os dois grupos manifestam diferenças de peso a partir de 20 semanas de vida, e elas acabam permanecendo até o fim da vida. Os camundongos sem os canais KATP, quando submetidos à dieta "gorda", acabam com peso normal, equivalente ao dos camundongos não modificados com dieta mais regrada.
Por outro lado, quando se exercitavam em rodinhas instaladas nas suas gaiolas, os roedores alterados passavam só metade do tempo correndo, em comparação com os normais.
(REINALDO JOSÉ LOPES)


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