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POLÍTICA CIENTÍFICA
Sede de projeto em Uberaba tem irregularidades em obra de US$ 2,1 mi; responsável nega improbidade
Promotor investiga rede de paleontologia
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
O Ministério Público de Minas
Gerais está investigando irregularidades na construção da sede da
Rede Nacional de Pesquisa Científica em Paleontologia, um dos
maiores projetos já criados no
país para apoiar o estudo dos seres vivos fósseis. O próprio arquiteto que projetou a obra notou
que ocorreram modificações significativas na estrutura e nos materiais utilizados, por razões que
ainda precisam ser aclaradas -e
que poderiam estar ligadas a desvio de recursos públicos.
Em princípio, por ter passado
por licitação, a obra não poderia
ter sofrido tais mudanças. A sede
está sendo construída em Peirópolis, distrito rural de Uberaba,
no interior mineiro, perto de sítios famosos pela presença de crocodilos e dinossauros do Cretáceo
(de 90 milhões de anos).
Dos US$ 6,1 milhões que o governo deve destinar para a rede,
mais de 2 milhões deverão ir para
a construção da sede, dos quais
R$ 580 mil já foram gastos. A Sectes (Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
de Minas), responsável pela obra,
nega as irregularidades e diz que
as alterações foram feitas para
economizar (leia texto à direita).
Marcondes Nunes de Freitas,
arquiteto de Uberaba que assina o
projeto da obra ao lado de Maria
Elisa Costa e Marcelo Suzuki,
conta que visitou a obra a convite
da própria empresa vencedora da
licitação, a Sabre Engenharia, no
começo do mês passado. "Perguntei ao engenheiro da obra com
que direito eles haviam alterado a
concepção", disse Freitas à Folha.
Segundo ele, as próprias pranchas
com o desenho do projeto tinham
sido mudadas: em vez de cinco
pranchas, como o previsto, foram
apresentadas apenas três.
"Das pranchas que faltam, uma
se referia à cobertura do prédio e a
outra à concepção estrutural",
afirma Freitas. No segundo caso,
o arquiteto diz que foram utilizadas treliças metálicas, e não vigas
metálicas, o que poderia se converter numa redução substancial
dos custos -embora não esteja
claro o que foi feito com o dinheiro assim economizado.
Freitas comunicou o Ministério
Público sobre as mudanças por
meio de uma representação. Laércio Conceição Lima, da 5ª Promotoria de Justiça (Defesa do Patrimônio Público), disse à Folha que
está recolhendo documentação
sobre o caso. "A modificação existe realmente, houve uma mudança substancial na cobertura", afirma Lima. "Era para ter sido uma
obra artística, mas o que foi criado é um grande galpão."
Antes ou depois
A investigação do promotor
pretende descobrir se as modificações foram idealizadas antes ou
depois da licitação (informações
obtidas com a Sectes indicam a segunda opção). Segundo ele, a
ocorrência de licitação impede
que essas alterações fossem feitas
livremente depois que a obra foi
licitada. "Isso consolidaria a irregularidade. Se houve mudança,
há a possibilidade de que ela tenha sido feita para desviar recurso
público, para que houvesse sobra", afirma. O promotor espera
concluir a análise até a metade do
mês. Caso as suspeitas se confirmem, uma ação civil pública poderá ser instaurada.
Do ponto de vista científico, a situação da rede de paleontologia
continua empacada. Apesar dos
recursos volumosos, vários pesquisadores da área no Brasil reclamaram da criação da rede. É que
pouquíssimos foram consultados
antes de seu anúncio, no fim do
ano passado. Ficou acertado que
os objetivos de pesquisa da rede
seriam postos em discussão entre
a comunidade, mas isso ainda
não ocorreu -nem tem data para
ocorrer, lamenta Renata Guimarães Netto, presidente da Sociedade Brasileira de Paleontologia.
"Digo de antemão que isso é
uma pena. Chega a parecer que
não há interesse em discutir o tema", diz a pesquisadora. Ela criticou a visão de Diógenes de Almeida Campos, do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), coordenador técnico da
rede. Segundo ele, a instituição foi
criada para proteger o patrimônio
fossilífero, e não para financiar
pesquisas -esse seria o papel que
os órgãos federais e estaduais de
fomento já desempenham.
"Da maneira como ele colocou,
não acho que a idéia esteja errada.
Podemos fazer muito para proteger não só os sítios como também
as coleções de museus. Mas sabemos como é pouco o dinheiro para pesquisa", afirma Netto. "De
fato, quanto mais dinheiro para
pesquisa, melhor", diz Campos.
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