São Paulo, quarta-feira, 06 de outubro de 2010

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Fóssil do CE vai parar em leilão feito em Paris

Réptil voador saiu ilegalmente do Brasil, afirma agência reguladora

Restos pré-históricos pertencem à União, diz lei de 1942; casa de leilões não comenta procedência de peça

Reprodução
O crânio do pterossauro (réptil voador) brasileiro ‘Ludodactylus sibbicki’ incluído no leilão de ontem da Sotheby’s

GIULIANA MIRANDA
DE SÃO PAULO

A casa de leilões Sotheby's negociou ontem, em Paris, 11 lotes de fósseis brasileiros que, de acordo com o órgão do governo federal que autoriza as extrações, saíram de forma ilegal do país.
Além de insetos, peixes e plantas, o conjunto tinha um valioso crânio completo do pterossauro Ludodactylus sibbicki, o único conhecido com cristas e dentes.
Todas as peças são da chapada do Araripe (CE), um complexo paleontológico reconhecido pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
"Não há como esse material ter saído legalmente do Brasil. Nós não autorizamos", disse Walter Lins Arcoverde, diretor de fiscalização do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral).
Arcoverde está investigando como as peças saíram do Brasil. Ele enviou ofícios à Interpol (polícia internacional) e à embaixada da França pedindo esclarecimentos. O DNPM quer achar uma maneira de repatriar as peças.
Desde 1942, a lei brasileira determina que o órgão precisa autorizar a saída do país de qualquer fóssil com interesse científico.

NÃO DECLARADO
A origem das peças brasileiras não consta no catálogo oficial do leilão e nem no site do evento. O material se resume a propagandear a "beleza única" dos fósseis.
Procurada pela reportagem da Folha, a responsável pela filial francesa da Sotheby's não se manifestou sobre a origem do acervo.
A Sotheby's no Brasil disse não ter informações específicas sobre as peças, mas afirmou que, provavelmente, elas fazem parte de alguma coleção muito antiga e, por isso, pode ser mais difícil identificar sua origem.
Para especialistas, afirmar que os fósseis foram encontrados antes da promulgação da lei é apenas uma desculpa para dar "aparência de legalidade" ao contrabando.
"O pterossauro leiloado só foi descrito na década de 1970. Ninguém teria encontrado um fóssil inédito tão bem conservado e, simplesmente, "guardado no armário" para vender 70 anos depois", disse Felipe Monteiro, mestrando da Universidade Federal do Ceará, que participa de projetos no Araripe.
Segundo Alexander Kellner, especialista em pterossauros do Museu Nacional da UFRJ, os fósseis foram encontrados na chamada formação Crato, que só começou a ser explorada muito depois da regulamentação.
"Infelizmente, a saída de fósseis é um problema antigo. O Brasil perde verdadeiros tesouros. Agora, para estudar uma espécie nacional, os pesquisadores precisam ir para o exterior", afirmou.
Segundo ele, os contrabandistas têm "certeza da impunidade" no Brasil.
"Falta fiscalização e, principalmente, faltam verbas para que os pesquisadores brasileiros desenterrem essas relíquias. Precisamos de mais incentivos."

FUTURO INCERTO
Com valor estimado entre € 50 mil e € 70 mil (algo em torno de R$ 115 mil e R$ 161 mil), o crânio do pterossauro não aparece na lista dos itens arrematados no leilão. Outros sete fósseis brasileiros também não.
Isso, de acordo com a própria Sotheby's, não significa que eles não tenham sido comprados. De acordo com a representação no Brasil, existe a possibilidade de negociações após o leilão.


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