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Metade da Amazônia pode cair até 2030
Estudo indica que expansão da agropecuária, ação de madeireiras, seca e aquecimento juntos aceleram o fim da floresta
ONG que encomendou o trabalho engrossa o coro da pressão para que redução do desmate entre no acordo de redução do efeito estufa
CLAUDIO ANGELO
ENVIADO ESPECIAL A BALI
A mudança climática e o desmatamento já estão empurrando a floresta amazônica rumo à
transformação em savana, e até
2030 metade da mata será derrubada, explorada por madeireiros ou afetada pela seca. A
previsão é de um relatório feito
por um dos maiores especialistas em ecologia amazônica, o
americano Daniel Nepstad.
Intitulado "Os Ciclos Viciosos da Amazônia", o documento, encomendado pela ONG
WWF, tem dados científicos
novos e um objetivo político:
levar a agenda da redução das
emissões por desmatamento
(REDD, na sigla em inglês) para
as negociações do acordo que
substituirá o Protocolo de Kyoto após 2012. Espera-se que a
COP-13, a Conferência do Clima de Bali, aborde isso, e que a
manutenção da estabilidade do
clima pela conservação de florestas entre na pauta.
Mas mesmo a delegação brasileira, maior interessada em
incluir a redução do desmatamento no acordo, parece ter
posição contraditória. Apesar
de o governo já ter manifestado
a vontade de ver um fundo de
compensação por desmate reduzido funcionando antes de
2012, membros da delegação
têm expressado dúvidas.
Na terça, Thelma Krug, secretária brasileira de Mudanças Climáticas, havia dito que
era "prematuro" incluir florestas no acordo -foi corrigida
ontem pelo chefe da delegação,
Luiz Alberto Figueiredo Machado, para quem a secretária
fora "infeliz" na colocação.
Logo depois, Sergio Serra,
embaixador extraordinário para mudança do clima, disse que
o Brasil não quer ver as florestas na negociação. "Para a delegação brasileira, Bali não é o fórum de discutir se floresta entra ou não." Pare ele, é uma
"reunião de processo", ou seja,
não define modos de ação.
Cenário apocalíptico
O relatório do WWF dá um
tom de urgência ao debate ao
afirmar que o ponto de não-retorno da Amazônia -ou seja, o
momento a partir do qual a floresta se transforma em savana
e não volta mais- pode estar
mais perto do que se pensava.
Até agora, modelos de clima e
de vegetação têm mostrado que
o colapso da floresta deveria
acontecer só depois de 2080.
Cruzando um modelo de desmatamento com novos dados
sobre exploração madeireira e
sobre chuvas ao longo dos últimos dez anos, além de tendências recentes de expansão da
cana, da soja e da pecuária,
Nepstad produziu o que ele
chama de "um dos piores cenários que eu já vi em 23 anos de
Amazônia": a savanização
ocorrendo nos próximos 15 a
25 anos, com a emissão de 15 a
25 bilhões de toneladas de carbono até o final do período -algo como quatro vezes o que o
Kyoto se propôs a cortar.
A seca prevista para a Amazônia pode já ter se instalado.
No nordeste de Mato Grosso,
onde Nepstad mantém um projeto de pesquisa, 2007 foi um
ano atípico, muito seco e muito
quente. "Normalmente faz
32C na sombra da mata no verão [época de seca]. Neste ano
fez 38C", diz. A fumaça das
queimadas pode estar colaborando para secar a floresta, ao
inibir a formação de nuvens.
Nepstad assume que os cenários propostos por ele -a área
desmatada crescendo de 17%
para 31% e a área seca ou danificada pelo corte seletivo chegando a 24% da mata- são parciais, baseados em só cinco
anos de dados de desmatamento e dez de precipitação. Mas
afirma que "em vários sentidos
o relatório é conservador".
Políticas como a REDD poderiam ajudar a evitar a catástrofe. Com ela, seria possível,
por exemplo, pagar pecuaristas
para não desmatarem.
"Duas faces"
Em referência à cobrança para o Brasil reduzir suas emissões, o chanceler Celso Amorim disse ontem que países ricos possuem "duas faces".
"Há uma face de bom moço,
de quem está defendendo as
causas benéficas para o mundo
[o ambiente], e uma face, que
em geral fica escondida, que é a
face protecionista", afirmou,
aludindo às tarifas sobre biocombustíveis e à pressão da Europa de exportar pneus reformados. "É preciso saber com
que voz eles falam na Conferência de Bali e com que voz
eles falam na OMC [Organização Mundial do Comércio]."
Colaborou a Sucursal de Brasília
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