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"Quero fazer coisas arriscadas agora", diz cientista brasileiro
DO ENVIADO A SAN DIEGO
"Procuram-se homens para
encarar jornada arriscada, salário baixo, frio de rachar, meses
em completa escuridão, perigo
constante, retorno duvidoso e,
em caso de sucesso, reconhecimento e honra." O texto foi publicado pelo explorador Ernest
Shacklelon num jornal para
formar a equipe de sua expedição à Antártida em 1914. Uma
cópia pendurada em um mural
na UCSD, porém, indica:
"Anúncio para pós-doutorado
no laboratório de Muotri".
A piada, exibida na sala do
próprio biólogo, faz jus à sua fama. O paulistano, após acumular experiência no vizinho Instituto Salk, assumiu aos 34
anos a missão de dar bom destino à verba que a UCSD recebera do governo estadual em
2008 para construir um novo
instituto. O aporte era parte
dos US$ 3 bilhões do programa
Cirm (Instituto de Medicina
Regenerativa da Califórnia), e
foi complementado com doações do setor privado.
"Aqui o dinheiro vem desses
caras de cabeça branca que você vê por aí passeando de Ferrari", diz o biólogo, que se considera privilegiado por empreender um projeto científico
de alto risco ainda no início da
carreira. Sua meta é usar as células-tronco para entender o
desenvolvimento inicial do cérebro humano. Entre os projetos conduzidos por seu grupo
está o de criar um roedor com
neurônios derivados de crianças autistas e outras para conduzir experimentos in vivo.
Como nas expedições pioneiras à Antártida, é um trabalho
de resultado incerto -mas de
benefícios potenciais enormes.
O esforço atraiu cartas mal-educadas de alguns críticos,
mas não foi só. Em setembro
passado, Muotri recebeu dos
NIH (Institutos Nacionais de
Saúde dos EUA) o "New Innovator Award", prêmio acompanhado de um fomento de mais
US$ 1,5 milhão para fazer pesquisa. Com as verbas atuais, o
pesquisador montou sua equipe de 12 cientistas -6 dos quais
brasileiros- para a missão.
Alguns, acostumados à vagareza da ciência no Brasil, levaram um susto. "Aqui em San
Diego a gente se sente no olho
do furacão", diz Paulo André
Marinho, um dos integrantes
da equipe. Cassiano Carromeu,
que que diz nunca ter entrado
num ambiente científico de
tanta concorrência, costuma
passar noites no laboratório:
"Não vim aqui para brincar".
Muotri sabe que é arriscado
apostar em pesquisa básica de
ponta antes de virar titular de
uma cadeira na universidade.
"Mas eu quero fazer coisas arriscadas agora, não quero ter de
esperar seis anos até lá."
(RG)
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