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Pesquisa encerra debate de uma década
Evidência de mistura entre humano e neandertal surpreendeu até o líder da pesquisa, para quem espécies podem ser uma só
Estudo de DNA de fósseis
de 40 mil anos só foi possível
graças a técnica avançada de soletração, que permitiu
eliminar genes de bactérias
Frank Vinken/EVA-MPG
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O pesquisador Tomislav Maricic manipula osso neandertal em sala limpa, para evitar contaminação com DNA dos cientistas
DA REPORTAGEM LOCAL
A decifração do genoma do
neandertal é uma vitória tecnológica do sueco Svante Pääbo e
de sua equipe.
Desde 2006, eles tentam sequenciar o DNA dos fósseis da
Croácia, enfrentando dois problemas enormes: o fato de que
DNA antigo não costuma se
conservar bem e a altíssima
contaminação das amostras.
Cerca de 95% do DNA extraído vinha não dos ossos, mas de
bactérias. Para eliminar a contaminação, foi preciso usar técnicas que iam de enzimas que
picotavam DNA bacteriano ao
sequenciamento de um mesmo
trecho várias vezes.
O verdadeiro triunfo da nova
pesquisa, porém, talvez caiba a
alguém que não participou dela: o arqueólogo português
João Zilhão, da Universidade
de Bristol (Reino Unido).
Até ontem, Zilhão era um defensor quase solitário da mestiçagem homem-neandertal,
contestado pelo próprio Pääbo.
"Que quer que lhe diga senão
que é o que andamos a dizer há
já mais de dez anos?", brincou
Zilhão, ao responder à Folha se
estava se sentindo vingado pelo
novo anúncio.
Como todos os grupos humanos que vivem fora da África
parecem carregar o mesmo toque neandertal em seu DNA,
Pääbo e colegas propõem que a
mestiçagem ocorreu nos primeiros encontros das duas espécies, entre 80 mil e 50 mil
anos atrás, no Oriente Médio.
"Qualquer dispersão de populações da África para a Europa e Ásia Central tem de passar
por aí", concorda Zilhão.
Em princípio, não há nada
que impeça o nascimento de
híbridos férteis de espécies
muito próximas, lembra Pääbo.
Ele, no entanto, diz que a discussão sobre considerar ou não
os neandertais como espécie
separada é "infrutífera".
"Prefiro dizer que eles simplesmente eram um grupo de
humanos um pouco mais diferentes de nós do que nós somos
uns dos outros, mas não por
uma margem muito grande."
Outro membro da equipe,
David Reich, da Universidade
Harvard (EUA), diz que ainda
não é possível dizer o que predominou nos cruzamentos: homens modernos com mulheres
neandertais ou vice-versa.
Por enquanto, o que se sabe é
que não há traços neandertais
no DNA mitocondrial das pessoas de hoje. Presente nas mitocôndrias, as usinas de energia das células, esse DNA só é
transmitido da mãe para os filhos. No entanto, como basta
uma mulher não ter filhas para
não passá-lo adiante, é muito
fácil que esse tipo de linhagem
genética acabe sumindo.
(RJL)
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