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Canola transgênica "foge" de plantações nos EUA
Planta geneticamente modificada se tornou selvagem em grande escala
Variedades carregam
genes de resistência a
herbicidas; cruzamento
com ervas daninhas
pode ser preocupante
REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR INTERINO DE CIÊNCIA
"É como o ar escapando de
uma bexiga", compara a bióloga americana Cynthia Sagers, da Universidade do Arkansas. A imagem se refere à
colonização de larga escala
em beiras de estrada, estacionamentos e até cemitérios
dos EUA por variedades
transgênicas de canola.
No jargão dos cientistas,
as plantas viraram "ferais",
ou seja, passaram a se propagar sozinhas, sem ajuda humana, embora sejam formas
domesticadas. "A escala da
coisa é enorme, sem precedentes", conta Sagers, que
rastreou populações selvagens da planta ao longo de
quase 1.000 km de rodovias
no Estado da Dakota do Norte junto com Meredith Schafer, sua aluna de mestrado.
As pesquisadoras ressaltam que o achado não é apocalíptico nem deveria causar
pânico. "Do nosso ponto de
vista, é um experimento natural muito interessante que
está acontecendo", afirma
Sagers. Mesmo assim, monitoramento e prudência são
recomendáveis, dizem.
RESISTÊNCIA
Isso porque as formas de
canola transgênica detectadas por elas na natureza carregam DNA "estranho"
(oriundo de bactérias) que
lhes confere resistência a
herbicidas. E tal resistência
poderia muito bem ser transferida a ervas daninhas,
criando uma nova dor de cabeça para os agricultores.
A canola sai na frente na
hora de estabelecer populações ferais porque a planta se
vira relativamente bem sem
ajuda humana, diz Francisco
Aragão, especialista em
transgênicos da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia. "Isso dificilmente
aconteceria com milho transgênico. Mesmo com soja seria mais complicado", diz.
Além de rústica, a canola é
promíscua. Indivíduos da
planta trocam genes frequentemente entre si através
do sexo. As pesquisadoras
americanas detectaram, por
exemplo, a presença concomitante de dois genes diferentes de resistência a herbicidas em algumas plantas.
Como a indústria hoje não
produz transgênicos "duplos" desse tipo -basicamente porque as plantas são
criadas para aguentar o herbicida feito pela mesma empresa que fornece as sementes-, isso provavelmente
significa que duas variedades diferentes cruzaram e tiveram descendentes.
Como a promiscuidade da
canola se estende também a
espécies de ervas daninhas,
com as quais é capaz de se reproduzir, fica no ar a possibilidade de que isso produza
superervas, duras de matar.
"Precisamos de mais trabalhos sobre isso. Hoje há um
vazio de conhecimento",
afirma Cynthia Sagers.
Aragão, porém, diz que o
risco de o pior acontecer é
baixo. "Fora do contexto de
plantação, não há uma pressão natural para que o gene
de resistência aos herbicidas
seja mantido, porque, na natureza, obviamente não há
aplicação de herbicidas."
O risco só existiria se, de
modo aleatório, o gene fosse
transmitido a ervas daninhas
que estivessem perto de uma
plantação, por exemplo.
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