|
Próximo Texto | Índice
ENTREVISTA
ALDO REBELO
"Meio Ambiente age como organização paraestatal"
Deputado federal ataca ministério que defende preservação do Código Florestal
Aldo Rebelo (PC do B-SP) é relator de comissão especial que debate mudança na lei do limite para desmate; "Ele é pararruralista", diz Minc
Marcia Ribeiro- 04.fev.2010/ Folha Imagem
|
|
Aldo Rebelo em audiência pública realizada em Ribeirão Preto
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
Dois dias depois de dizer que
o Ministério Público age como
"braço jurídico" das ONGs ambientalistas, o deputado federal
Aldo Rebelo (PCdoB-SP) alvejou o Ministério do Meio Ambiente, chamando-o de "meio
governo" e "organização paraestatal". As críticas vêm a
propósito das posições dos dois
órgãos sobre o Código Florestal, a lei de proteção às matas.
Rebelo é relator da comissão
da Câmara que analisa as propostas de mudança na lei, que
data de 1965 mas foi alterada
por Medida Provisória em
2001. A MP é fonte de atrito entre ruralistas e ambientalistas,
pois alterou a chamada reserva
legal: aumentou de 50% para
80% a área de uma propriedade
rural que deve ser mantida como floresta na Amazônia, e de
20% para 35% no cerrado.
Ruralistas que tentam derrubar esse limite no Congresso
têm esbarrado no ministro do
Meio Ambiente, Carlos Minc.
Ontem, ele rebateu críticas de
Rebelo e o chamou de "pararruralista".
A novela pode acabar em
abril, quando deve ser votado o
parecer de Rebelo sobre propostas de leis para alterar o código. Uma delas, atacada por
ONGs, propõe que cada Estado
determine a própria reserva legal. Na sexta-feira à noite, de
Boa Vista, Aldo falou à Folha:
FOLHA - Por que reformar o Código
Florestal agora? Existe mesmo a necessidade de mexer na lei?
ALDO REBELO - O Código Florestal é de 1965. De lá para cá ele já
foi alterado várias vezes. Além
da modificação de 2001, dessa
medida Provisória, que aliás
nunca foi votada, há outras alterações de interpretação, como resoluções do Conama. Eu
fui indicado para apresentar
parecer sobre todos esses projetos. Há polêmicas em torno
de artigos da lei. Temos de ouvir todo mundo, colher informações não só de produtores e
de órgãos ambientais, porque é
preciso apresentar uma proposta que proteja as duas coisas: o código tem de proteger o
ambiente e ao mesmo tempo
assegurar que o país consiga
produzir e se desenvolver.
FOLHA - O país já não tem se desenvolvido e produzido com a lei
atual? O sr. deve defender mudanças no limite da reserva legal, é isso?
REBELO - Não tenho ideia ainda
do que possa propor. Aqui hoje
no Amazonas, por exemplo, as
pessoas que foram ouvidas
acham que 80% de reserva legal
não tem problema. É diferente
do Sul, onde as pessoas acham
que tem problema nos 20%.
FOLHA - Não é possível acomodar
essas reivindicações, por exemplo o
direito adquirido de quem produz
em uma área de desmatamento
muito antigo, sem mudar o código?
REBELO - É o que nós estamos
examinando. E a qual código
você se refere? O de 1965 ou a
Medida Provisória de 2001?
FOLHA - No meu entendimento,
como há uma alteração por Medida
Provisória que vem sendo reeditada
todos os anos, vale o texto de 2001.
REBELO - Pois é. Isso significa
que o Executivo alterou o código de 1965 sem ouvir ninguém.
FOLHA - O sr. foi aplaudido pelos
ruralistas e vaiado pelo MST na audiência pública de Ribeirão Preto na
última quarta-feira. Para um comunista, isso incomoda?
REBELO - O que são ruralistas na
sua classificação? Essa classificação é do movimento ambientalista. É a sua também? O jornal classifica qualquer produtor rural, mesmo representantes da federação de trabalhadores da agricultura e da agricultura familiar, como ruralista?
FOLHA - Falo de deputados da bancada ruralista e da Abag [Associação
Brasileira do Agronegócio], que representam grandes produtores.
REBELO - Mas isso não representava as centenas de pessoas
que estavam em Ribeirão Preto. O que o movimento ambientalista e a mídia influenciada
por ele querem colocar é o seguinte: que o produtor rural, o
pequeno e o médio proprietário, são iguais ao investidor rural, que é banqueiro, dono de
empreiteira. Vi no Paraná integrantes de uma cooperativa
que não conseguem tirar renda
de um salário mínimo da terra e
vocês classificam de ruralistas!
Existe um aspecto da questão
que é a competição entre a agricultura forte de um país frágil e
a agricultura frágil de países
fortes. E o movimento ambientalista que procura traçar uma
incompatibilidade entre a natureza e o ser humano... esse é o
ambientalismo neomalthusiano e neocolonialista, porque
são organizações estrangeiras.
O sujeito abre filial de ONG holandesa para ditar regras sobre
o ambiente no Brasil, regras
que não valem na Holanda nem
na França, e a imprensa acolhe
tudo de maneira acrítica, numa
visão também colonizada.
FOLHA - Não é lenda urbana essa
coisa do interesse estrangeiro? O
seu próprio partido, o PC do B, tem
origem numa organização estrangeira, a Internacional Comunista.
Grandes empresas do agronegócio,
como a Bunge, também são transnacionais, e ninguém diz que elas
prejudicam a soberania do Brasil.
REBELO - Elas estão aqui para
explorar economicamente o
Brasil, e fazem isso muito bem.
Basta olhar o preço dos insumos. E a outra coisa é a ação dos
governos. A não ser que você
ache que as batalhas na Organização Mundial do Comércio sobre a agricultura e as barreiras
aos produtos brasileiros sejam
ficção ou lenda urbana.
FOLHA - Não são, mas o que eu não
consigo é enxergar qual é a evidência de que o movimento ambientalista esteja ligado a essas barreiras.
REBELO - O que eles desejam é
que seja dissociado mesmo.
Existe uma parcela do movimento ambientalista que representa a preocupação das
pessoas com os crimes ambientais. A degradação que existe no
mundo e no Brasil, isso é verdadeiro. O que eu estou é destacando que uma parcela do movimento ambientalista é neomalthusiana e neocolonial. Como não existe mais floresta na
Europa, escolhe-se um país do
Terceiro Mundo para ser uma
espécie de jardim botânico europeu, e você submete a população da Amazônia, de camponeses, de caboclos e de ribeirinhos, ao regime de terror.
FOLHA - Parece haver um discurso
sobre conspiração internacional.
REBELO - Não há conspiração: é
tudo feito abertamente. Nenhuma dessas organizações está clandestina. Elas defendem
suas ideias inclusive nas audiências da comissão que trata
do Código Florestal. E os governos estrangeiros não escondem
a sua animosidade em relação à
agricultura brasileira.
FOLHA - Mas, daí a concluir que
ONGs estão a serviço de países ricos
não é dar um passo além?
REBELO - Não é propriamente a
serviço, é um processo integrado. A não ser que expliquem
por que esses países financiam
de maneira tão decisiva essas
organizações. Qual o interesse?
FOLHA - Brasileiros financiam
ONGs aqui, por exemplo, sem que
haja interesse do governo brasileiro.
REBELO - O governo brasileiro...
Você tem governo e governos.
O Ministério do Meio ambiente
é meio governo brasileiro, age
como uma organização paraestatal. A agenda do Ministério
do Meio Ambiente também é ligada a esses interesses. Há
muito tempo, aliás.
Próximo Texto: Frases Índice
|