São Paulo, terça-feira, 08 de setembro de 2009

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"Genoma" da superfície de célula ajuda busca de droga

Parceria entre Brasil e EUA mapeia proteínas usadas em "comunicação" celular

Estudo lista 3.700 moléculas achadas com técnica nova de genética informática; grupo já começou a buscar as presentes em tumores


RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um novo mapa do genoma humano, voltado apenas para o reconhecimento das proteínas que ficam na superfície das células, deve ajudar a busca de cientistas por novos medicamentos. Batizado de "superficioma", o trabalho feito em colaboração por cientistas brasileiros e americanos filtrou logo de cara uma lista de possíveis alvos para atacar tumores.
Proteínas que ficam nas membranas que recobrem as células são especialmente interessantes para farmacólogos porque é com elas que as células se "comunicam". Um medicamento que tenha como alvo específico algum tipo de célula tumoral que deve ser morta, por exemplo, reconhece sua vítima por meio dessas moléculas. Saber quais são essas proteínas, porém, não é algo trivial.
Para atingir esse objetivo, o novo trabalho adotou a estratégia de fazer a busca no DNA que está por trás da produção dessas moléculas, sem olhar para elas diretamente num primeiro momento. Realizado em sua maior parte por Júlia da Cunha e Pedro Galante no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo, o mapeamento foi coordenado pelo especialista em bioinformática Sandro de Souza.
"Começamos olhando para o genoma humano inteiro", disse o cientista à Folha. No início do trabalho, segundo Souza, foi simples achar candidatas a proteínas de superfície porque todas têm muitas regiões moleculares hidrofóbicas -que repelem água. "Essa região da proteína é hidrofóbica porque precisa interagir com a membrana, que é de gordura -lipídios- também hidrofóbica."
Sabendo qual o tipo de código genético codifica pedaços de proteína hidrofóbicos, o pesquisador começou a fazer a busca nos bancos de dados de genoma em computadores. Mas esbarrou num problema já previsto: as proteínas de superfície não são as únicas moléculas a contar com um grande componente hidrofóbico.
"Nós desenvolvemos então uma estratégia usando outros tipos de dado para tentar excluir esses casos e ficar só com os que eram de superfície celular", conta Souza. "Conseguimos nos livrar de quase todos aqueles que não eram."
O resultado, relatado em estudo na edição de hoje da revista "PNAS", foi uma lista de 3.702 proteínas e dos genes às quais estão relacionadas. "Nossos métodos estão de acordo com outras estimativas, segundo as quais pelo menos 20% de todos os genes humanos codificam proteínas da superfície celular", escreve o grupo. O trabalho também teve participação da Escola Médica de Harvard, de Boston, e da empresa de biotecnologia Fluidigm, de San Francisco, que forneceu o maquinário usado nas análises.

Foco nos tumores
Além de analisar células humanas comuns no trabalho, os cientistas já aproveitaram para aplicar sua técnica a células de tumores. As amostras incluem tecidos de câncer colorretal e glioblastoma, o tipo de tumor cerebral mais agressivo.
"Estamos procurando mutações nos genes do superficioma", conta Souza. "Vimos que muitos dos genes ligados à superfície das células tumorais que estavam alterados interagiam com uma família de proteínas envolvidas com o TNF -fator de necrose de tumores. Este é um composto importante em regular a taxa de sobrevivência do tumor. Ninguém ainda tinha ligado isso aos tipos de câncer que nós estudamos."
Nesta fase do trabalho, porém, o grupo optou por ainda não tentar patentear a descoberta e abriu os resultados. "Esperamos que esse catálogo que estamos disponibilizando vá estimular outros estudos, não só em câncer", afirma Souza.


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