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"Genoma" da superfície de célula ajuda busca de droga
Parceria entre Brasil e EUA mapeia proteínas usadas em "comunicação" celular
Estudo lista 3.700 moléculas achadas com técnica nova de genética informática; grupo já começou a buscar as presentes em tumores
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um novo mapa do genoma
humano, voltado apenas para o
reconhecimento das proteínas
que ficam na superfície das células, deve ajudar a busca de
cientistas por novos medicamentos. Batizado de "superficioma", o trabalho feito em colaboração por cientistas brasileiros e americanos filtrou logo
de cara uma lista de possíveis
alvos para atacar tumores.
Proteínas que ficam nas
membranas que recobrem as
células são especialmente interessantes para farmacólogos
porque é com elas que as células se "comunicam". Um medicamento que tenha como alvo
específico algum tipo de célula
tumoral que deve ser morta,
por exemplo, reconhece sua vítima por meio dessas moléculas. Saber quais são essas proteínas, porém, não é algo trivial.
Para atingir esse objetivo, o
novo trabalho adotou a estratégia de fazer a busca no DNA que
está por trás da produção dessas moléculas, sem olhar para
elas diretamente num primeiro
momento. Realizado em sua
maior parte por Júlia da Cunha
e Pedro Galante no Instituto
Ludwig de Pesquisa sobre o
Câncer, em São Paulo, o mapeamento foi coordenado pelo
especialista em bioinformática
Sandro de Souza.
"Começamos olhando para o
genoma humano inteiro", disse
o cientista à Folha. No início
do trabalho, segundo Souza, foi
simples achar candidatas a
proteínas de superfície porque
todas têm muitas regiões moleculares hidrofóbicas -que repelem água. "Essa região da
proteína é hidrofóbica porque
precisa interagir com a membrana, que é de gordura -lipídios- também hidrofóbica."
Sabendo qual o tipo de código genético codifica pedaços de
proteína hidrofóbicos, o pesquisador começou a fazer a
busca nos bancos de dados de
genoma em computadores.
Mas esbarrou num problema já
previsto: as proteínas de superfície não são as únicas moléculas a contar com um grande
componente hidrofóbico.
"Nós desenvolvemos então
uma estratégia usando outros
tipos de dado para tentar excluir esses casos e ficar só com
os que eram de superfície celular", conta Souza. "Conseguimos nos livrar de quase todos
aqueles que não eram."
O resultado, relatado em estudo na edição de hoje da revista "PNAS", foi uma lista de
3.702 proteínas e dos genes às
quais estão relacionadas. "Nossos métodos estão de acordo
com outras estimativas, segundo as quais pelo menos 20% de
todos os genes humanos codificam proteínas da superfície celular", escreve o grupo. O trabalho também teve participação da Escola Médica de Harvard, de Boston, e da empresa
de biotecnologia Fluidigm, de
San Francisco, que forneceu o
maquinário usado nas análises.
Foco nos tumores
Além de analisar células humanas comuns no trabalho, os
cientistas já aproveitaram para
aplicar sua técnica a células de
tumores. As amostras incluem
tecidos de câncer colorretal e
glioblastoma, o tipo de tumor
cerebral mais agressivo.
"Estamos procurando mutações nos genes do superficioma", conta Souza. "Vimos que
muitos dos genes ligados à superfície das células tumorais
que estavam alterados interagiam com uma família de proteínas envolvidas com o TNF
-fator de necrose de tumores.
Este é um composto importante em regular a taxa de sobrevivência do tumor. Ninguém ainda tinha ligado isso aos tipos de
câncer que nós estudamos."
Nesta fase do trabalho, porém, o grupo optou por ainda
não tentar patentear a descoberta e abriu os resultados. "Esperamos que esse catálogo que
estamos disponibilizando vá
estimular outros estudos, não
só em câncer", afirma Souza.
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