São Paulo, domingo, 09 de março de 2008

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Clínica não descarta células preservadas por temor de problemas com a Justiça

JOHANNA NUBLAT
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Três anos depois de sancionada a Lei de Biossegurança, são poucas as clínicas de reprodução que enviam embriões excedentes para estudo. Eles permanecem congelados por falta de autorização dos genitores, desconhecimento de quais são as pesquisas "sérias" no país e receio de problemas jurídicos.
O total de embriões conservados nas 15 maiores clínicas do país chegava a 9.914 em 2005, segundo o último levantamento da SBRA (Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida). Deles, 3.219 estavam congelados por pelo menos três anos -exigência necessária para encaminhá-los à pesquisa.
Seis desses embriões congelados são da agricultora Marta Helena Somilio, 45, de Olímpia (SP). Ela já teve dois filhos e afirma não querer mais engravidar. Mesmo assim, diz que vai "tomar coragem um dia" para inseri-los em seu útero.
"Não quero doar para pesquisa, não me sentiria sossegada com isso. É como se eu tivesse um pouco da minha família congelada", disse.
A posição de Somilio é repetida por muitas pacientes de clínicas de reprodução que optam por não mandar os embriões para pesquisa.
A médica Silvana Chedid, da clínica Chedid Grieco, diz que só conseguiu, até hoje, autorização de dois casais e que, por isso, nunca doou os embriões para estudo. "Conheço um grupo de pesquisadores sério, o problema é que os casais não querem fazer a doação, o que é uma pena. Os embriões estão aqui sem ajudar ninguém e dando despesa", afirmou.
O índice de doação para pesquisa também é baixo no centro de reprodução Franco Júnior, de Ribeirão Preto (SP), que reunia o maior número de embriões congelados em 2005. Até hoje, apenas 55 casais deram a autorização para que seus embriões fossem doados.
O diretor da clínica, José Gonçalves Franco Júnior, diz, no entanto, que a receptividade das pacientes à pesquisa é grande, o que falta é estímulo.
Maria do Carmo Borges de Souza, ex-presidente da SBRA, também reclama da falta de interesse por parte de grupos de pesquisa. "Temos vários casais que assinaram termo dizendo que doam para pesquisa, mas precisamos ter um grupo de pesquisa que diga que tem um trabalho registrado e que venha buscá-los", disse.
Uma última razão pela qual clínicas deixam de oferecer seus embriões para estudo é o medo de ser questionada legalmente -apesar de o casal ter de autorizar por escrito a doação. É o caso do Hospital Pérola Byington, em SP.
"É um serviço público, a exposição é grande e o gerenciamento disso é muito difícil. Preferimos nem ter embriões excedentes por questões administrativas. Já tivemos caso de uma paciente que nos acusou de ter perdido os embriões", afirmou Mario Cavagna, diretor de reprodução humana do hospital paulista.

Interesse nos embriões
Um dos poucos grupos de pesquisa que utilizam embriões brasileiros é o da professora Lygia da Veiga Pereira, da USP. Ela trabalha para desenvolver linhagens brasileiras de células-tronco -o que nunca foi feito no país.
Os embriões que ela utiliza saem da clínica Fertility, de São Paulo, onde, segundo o médico Edson Borges, a aceitação das pacientes à doação para pesquisa é grande.
Pereira diz que, nos últimos anos, descongelou "dezenas" de embriões, mas conseguiu que apenas onze se desenvolvessem até o estágio necessário à pesquisa. A maior parte dos embriões excedentes não resiste ao descongelamento e tem qualidade inferior aos utilizados no processo de reprodução.


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