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Cura com célula de embrião ainda levará décadas, diz biólogo
Americano Gerald Schatten, 60, diz duvidar que terapias em seres humanos sejam criadas durante seu tempo de vida
"Sobrevivente" de escândalo de fraude, cientista fará parceria com brasileiro; para ele, célula autorizada por lei nacional pode não ser útil
REINALDO JOSÉ LOPES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
O biólogo americano Gerald
Schatten compara o potencial
das pesquisas com células-tronco às façanhas sonhadas
pelos alquimistas, mas reconhece que os cientistas de hoje
estão longe da pedra filosofal.
"Rezo para que terapias com
base nessas células se tornem
disponíveis. Mas não sei mais
se isso vai acontecer no meu
tempo de vida", disse Schatten,
que tem 60 anos, a uma plateia
de estudantes e cientistas na
UFRJ (Universidade Federal
do Rio de Janeiro).
Professor da Universidade de
Pittsburgh (Estados Unidos) e
um dos principais especialistas
em células-tronco no mundo,
Schatten está no Brasil para
iniciar parcerias com os pesquisadores brasileiros da área,
como o grupo de Stevens Rehen, do Instituto de Ciências
Biomédicas da UFRJ.
Relaxado e desenvolto nas
piadas durante sua apresentação, Schatten parece ter superado o episódio mais polêmico
de sua carreira: a parceria com
o sul-coreano Hwang Woo-suk.
Durante a colaboração, a dupla
conseguiu criar o primeiro cão
clonado do mundo e também
publicou um artigo na revista
"Science" detalhando a produção de 11 linhagens de células-tronco derivadas de embriões
humanos clonados.
Vista como marco, a pesquisa
se revelou uma fraude. Como
os experimentos foram feitos
na Coreia do Sul, Hwang acabou sendo responsabilizado.
Schatten foi alvo de uma investigação em sua universidade,
mas foi inocentado de participação na fraude. Ele diz que fez
o possível para esclarecer a situação (leia texto à direita).
Fusão a frio
"As células-tronco podem se
revelar tão importantes para a
saúde humana quanto os antibióticos e as técnicas de anestesia. Ou podem ser como a fusão
a frio [suposta técnica de produzir energia quase ilimitada
via fusão nuclear em baixas
temperaturas, panaceia hoje
considerada impossível]. Nós
simplesmente não sabemos",
disse o biólogo à Folha.
Paradoxalmente, afirma o
pesquisador, a comunidade
científica deveria assumir um
papel duplo: manter o entusiasmo de pesquisa e, ao mesmo tempo, diminuir as expectativas do público em relação a
curas milagrosas.
Schatten elogiou os estudos
brasileiros com células-tronco
embrionárias (consideradas as
mais versáteis de todas, obtidas
de embriões com poucos dias
de vida) e também com as células adultas revertidas por manipulação genética a um estado
embrionário, as chamadas iPS.
"A juventude e o entusiasmo
de vocês são inspiradores",
afirmou ontem. Apesar da verba modesta do país -cerca de
R$ 10 milhões, contra os cerca
de R$ 5 bilhões investidos apenas pelo Estado norte-americano da Califórnia EUA-,
Schatten diz que os brasileiros
podem competir com os principais grupos de pesquisa do
mundo. "A chance de descobertas realmente impactantes
não depende só do dinheiro. E
boa parte dos bilhões da Califórnia estão sendo investidos
na construção de prédios novos", declarou o pesquisador.
Schatten também lançou dúvidas sobre a verdadeira utilidade das células-tronco obtidas de embriões descartados
pelas clínicas de fertilização
-os únicos que podem ser usados para pesquisa, segundo a
legislação brasileira.
Como os embriões descartados normalmente são os menos viáveis para gerar uma gravidez e têm a carga genética de
casais inférteis, pode ser que
eles sejam "anormais" por natureza, o que atrapalharia a atividade das células-tronco vindas deles. "Além disso, têm
DNA de casais capazes de pagar
pela fertilização in vitro -ou
seja, com maior chance de serem de origem europeia, sem
representar toda a diversidade
genética da população", diz.
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