|
Próximo Texto | Índice
Grupo vê "berçário" de raios cósmicos
Observatório Pierre Auger identifica de onde partem os raros petardos ultra-energéticos que chegam até a Terra
Consórcio de 17 países, que inclui o Brasil, resolve um mistério que atormenta a física há 25 anos; descoberta é uma das maiores do século
EDUARDO GERAQUE
ENVIADO ESPECIAL A CAMPINAS
A fotografia de Albert Einstein (sem a manjada língua de
fora) na sala do físico Carlos Escobar, da Unicamp, serve como
aviso: o trabalho feito ali não
tem nada de trivial, nem envolve escalas triviais de grandeza.
Escobar passou mais de uma
década estudando os raros
raios cósmicos ultra-energéticos, misteriosos disparos naturais de partículas que fustigam
a Terra de tempos em tempos.
Agora, ele acaba de ajudar um
consórcio internacional formado por cientistas de 17 países a
decifrar de onde eles vêm.
A descoberta, que pode ser
considerada uma das mais importantes da cosmologia neste
início de século, está publicada
na revista "Science" de hoje.
"Agora sabemos que os raios
cósmicos de alta energia são
originários de galáxias próximas à nossa", explica Escobar.
Para se enquadrarem na categoria "alta energia", as partículas precisam ter pelo menos
16 joules, o que pode parecer
pouco, mas não é. Se partículas
com essa energia pesassem 1
miligrama, cada uma delas causaria um impacto sobre a Terra
semelhante ao de um monte
Everest viajando a 200 km/h.
Para nossa sorte, elas têm menos de um bilionésimo da massa de um grão de areia.
O que os cientistas fizeram, a
partir do Observatório Pierre
Auger, na Argentina, foi seguir
o trajeto contrário dos raios de
alta energia, compostos de prótons e outros núcleos atômicos
que viajam pelo Universo a
uma velocidade próxima à da
luz (veja quadro à direita).
Os petardos minúsculos perdem energia quando se chocam
com a radiação cósmica de fundo, um resquício do Big Bang
que banha todo o Universo, e
aterrissam como uma chuveirada. "A direção desses raios a
partir da fonte não é muito distorcida, o que permite segui-los", diz Escobar.
Todos os 27 disparos estudados e captados pelos tanques
(que medem a energia) e telescópios (que seguem a luz dos
raios) do Pierre Auger começaram, lá fora da galáxia, a uma
distância menor que centenas
de milhões de anos-luz (algo
próximo dos 9,5 trilhões de quilômetros) da Terra.
Batalha naval
A forma de saber de onde
partiu um raio cósmico é semelhante ao trivial jogo de batalha
naval. Os cientistas usam uma
espécie de mapa do céu, um catálogo sofisticado que contém
galáxias já estudadas.
Quando não dá "água!" é possível saber de onde vêm os
raios. "A galáxia Centauro A é
uma fonte, por exemplo", explica Escobar. "Todas elas estão
em núcleos ativos de galáxias".
Essas regiões são alimentadas
por buracos negros supermaciços, os glutões energéticos.
A origem da energia extrema,
lembra Escobar, sempre foi alvo de polêmica, além de ser
considerada um grande mistério científico. Alguns grupos
achavam que só seria possível
explicar o fenômeno, se uma
nova teoria física fosse feita.
Porém, para alegria do próprio Escobar, as fontes, como se
vê agora, não são obra de extraterrestres. "A origem pode ser
perfeitamente explicada. Ela
não viola, por exemplo, a relatividade de Einstein."
Próximo Texto: Observatório registra só 30 raios por ano Índice
|