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São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 2003

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CÂNCER

Grupo de hospital paulistano mapeou gene em 20 famílias brasileiras

Estudo acha variantes de tipo de tumor hereditário

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Pesquisadores do Hospital do Câncer, em São Paulo, estão ajudando a desarmar uma bomba-relógio genética, capaz de causar tumores no cérebro, na retina e nos rins. Eles mapearam no Brasil as alterações no DNA que causam um tipo de câncer hereditário, abrindo espaço para a prevenção e cura precoce da doença.
"Nossas alterações [genéticas] são diferentes das que aparecem em todo o resto do mundo", afirma José Cláudio Casali da Rocha, 38, diretor do Departamento de Oncogenética do hospital e coordenador do estudo. Mesmo assim, todas causam a síndrome de Von Hippel-Lindau (VHL), cujos portadores têm quase 100% de chance de desenvolver algum tumor até os 65 anos.
Da mesma forma que alguns cânceres de mama, a doença é transmitida de pais para filhos. A probabilidade de cada filho ser portador da síndrome, independentemente do sexo, é de 50%.

Problema de família
O mais comum é que os casos (um para cada grupo de 30 mil pessoas, em média) se acumulem dentro da mesma família, embora os próprios pesquisadores tenham detectado pessoas em que as mutações apareceram pela primeira vez, sem que houvesse uma história familiar do problema.
As mutações estudadas pela equipe não causam problemas em lugares tão diferentes à toa. As 14 mil bases ou "letras" químicas do gene ligado ao problema contêm a receita para a produção de uma proteína que ajuda a manter células de todo o organismo na linha. "É um gene supressor de tumores e ajuda a controlar a angiogênese [a formação de vasos sanguíneos]", conta Rocha.
Embaralhadas ou omitidas de uma sequência, as "letras" de DNA podem causar resultados indesejáveis na proteína que codificam. Foi atrás dessas mudanças que a equipe passou a estudar 20 famílias de vários Estados brasileiros que já tinham parentes com a VHL. Os 102 pacientes foram acompanhados de 1998 ao fim de 2002 e tiveram o DNA do gene da doença sequenciado (soletrado).
Ao combinar a análise genética com a verificação de tumores nos pacientes, a equipe percebeu duas diferenças importantes em relação ao que se conhecia sobre a VHL em outros países.
Nas moléculas de DNA, as mudanças mais frequentes apareciam no meio do gene (e não nas pontas), enquanto o resultado delas se refletia principalmente em tumores nos rins. Em 70% dos casos, a troca ou apagamento de uma só "letra" de DNA era suficiente para causar a síndrome.
As técnicas utilizadas por Rocha e seus colaboradores permitiram 100% de identificação dos portadores da síndrome. Isso deve possibilitar uma ação preventiva mais eficaz, antes que os tumores se tornem sérios (mesmo na versão benigna, eles podem comprimir o cérebro e a retina e causar hemorragias).
A análise genética abre espaço para essa detecção da moléstia antes dos sintomas. No futuro, poderia ajudar as famílias nas quais a síndrome está presente a ter filhos sem o problema por meio da seleção de embriões.
O trabalho foi publicado na edição on-line da revista científica "Journal of Medical Genetics" (www.jmedgenet.com) no mês passado e ganhou prêmio de melhor pesquisa da Sociedade Americana de Oncologia Clínica.

Instituição faz 50 anos
O Hospital do Câncer comemora 50 anos de existência no próximo dia 14. Para celebrar a data, a instituição organiza o encontro internacional "How Close Are We to Cancer Cure" (Quão perto estamos da cura do câncer), de 21 a 23 de agosto. As inscrições vão até 10 de agosto. Informações pelos telefones 0/xx/11/3079-0544 e 3079-2787.


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