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GEOLOGIA
Cerca de 4.500 cones foram criados por fonte geotérmica, que impulsionava água através de "chaminé" submersa
Interior de SP tem gêiseres pré-históricos
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Quem der uma volta pela zona
rural de Anhembi, município que
fica 245 km a noroeste de São
Paulo, provavelmente não vai se
dar conta de que está andando sobre um campo minado de 250 milhões de anos. No longínquo Período Permiano, o lugar estava
cheio de gêiseres subaquáticos,
esguichando água a altas temperaturas sob influência do calor do
interior da Terra.
A prova disso ainda está lá, sob
forma de 4.500 cones que mais
parecem cupinzeiros para o olhar
destreinado. Um grupo de pesquisadores liderados por Jorge
Kazuo Yamamoto e Thomas Rich
Fairchild, do Instituto de Geociências da USP, diz ter desvendado a verdadeira natureza das estruturas e publica hoje sua análise
na revista científica britânica "Nature" (www.nature.com).
"Talvez seja um caso único no
mundo, principalmente quando
se leva em conta o grau de preservação das estruturas", disse Yamamoto à Folha. Além do mais, a
descoberta aponta para um novo
enigma: ninguém ainda sabe
muito bem como as estruturas teriam se formado ali, porque não
há um mecanismo óbvio para a
transferência de calor do interior
da Terra para o solo.
Alta densidade
Uma coisa é certa: as coisas estavam literalmente quentes em
Anhembi no Permiano, porque
os milhares de cones se espalham
por uma área restrita, de apenas
1,5 km2. Na época, todas as evidências geológicas indicam que a
região estava invadida por um
mar interior raso, mais ou menos
como o atual mar Cáspio, na Ásia
Central. "A profundidade máxima não deveria chegar a 150 m, e
água talvez fosse apenas salobra",
estima Fairchild. Há duas possibilidades para o contexto em que as
estruturas se formaram, segundo
a dupla. Elas podem ter "brotado"
numa região rasa, que seria inundada periodicamente pela maré;
ou em locais um pouco mais profundos e sempre submersos.
Antes do trabalho, houve quem
sugerisse que as formações eram
estromatólitos -estruturas muito antigas formadas por bactérias,
que geram verdadeiros "tapetes"
de limo nas águas onde crescem.
Mas a composição dos cones (sílica, em vez de substâncias à base
de carbono) e a falta de certas estruturas típicas do limo petrificado convenceu os pesquisadores
de que a origem dos "cupinzeiros" não era biológica.
Na verdade, há uma série de semelhanças entre os cones (os
quais podem chegar a quase 2 m
de altura) e os gêiseres, como os
famosos do Parque Nacional de
Yellowstone (Estados Unidos).
"Mas o termo gêiser se aplica, na
verdade, aos que ficam expostos
no ar", diz Fairchild.
Seja como for, o processo de
formação é parecido. A água desce por
fissuras na rocha e é aquecida,
voltando a temperaturas altas,
num esguicho, para a superfície.
Aos poucos, o mineral que os jatos d'água arrastam vai sendo depositado, formando a estrutura.
Até aí, tudo ótimo. Água e sílica
(o mineral da parede dos cones)
existiam em abundância por ali.
O problema é o terceiro elemento
da equação, a fonte de calor. Com
a exceção de Yellowstone, esse tipo de estrutura costuma se formar nos pontos em que as placas
tectônicas (as "balsas" de rocha
sobre as quais navegam os continentes) se tocam. São os mesmos
locais onde vulcões surgem e terremotos acontecem.
"Mas aqui nós temos ocorrências a 2.000 km da margem, com
pouca evidência de atividade tectônica", diz Fairchild. A intenção
dos pesquisadores agora, portanto, é elucidar o enigma. Uma das
chaves pode estar no fato de que,
nessa época, os continentes do
planeta estavam todos unidos
num só, a chamada Pangéia.
Acomodações internas dentro
desse imenso bloco de terras poderiam ter sido responsáveis por
uma atividade tectônica "interna". "As placas deviam ficar como
eu voando de classe econômica e
sentado no assento do meio: apertadas e se ajeitando", brinca Fairchild, que tem mais de 1,90 m.
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