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TCU vê abuso de fundações em pesquisas
Tribunal determina que repasses de verbas para projetos científicos públicos sejam feitos diretamente às universidades
Instituições de ensino usam entidades de apoio para agilizar gestão de recursos; prática abre brecha para driblar licitações, diz MEC
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
Um acórdão do TCU (Tribunal de Contas da União) que
aponta irregularidades na relação das universidades federais
com suas fundações de apoio
está provocando a reação de
pesquisadores, que temem que
as novas regras engessem seus
projetos. Para o TCU e para o
MEC (Ministério da Educação), porém, a decisão pretende
apenas pôr um fim no abuso cometido por entidades públicas
que, em muitos casos, podem se
beneficiar de seu regime jurídico diferenciado para burlar a lei
de licitações ou assumir tarefas
fora de sua competência.
A decisão surgiu após várias
denúncias de irregularidades, a
mais famosa delas de uma fundação da UnB (Universidade de
Brasília) que usou recursos para equipar o apartamento do
ex-reitor Timothy Mulholland.
O TCU fez então uma auditoria em 464 contratos e convênios de 14 instituições federais
que somavam R$ 950 milhões,
e identificou uma série de irregularidades. A partir deste levantamento, foi aprovado, em
26 de novembro, um acórdão
que determina providências
aos órgãos federais, dando prazo de 180 dias para adequação.
O ponto que está preocupando mais pesquisadores é a obrigação de que os repasses de
agências financiadoras de pesquisas federais sejam feitos para as universidades, e não mais
para fundações de apoio.
"Esse acórdão é um desastre
para a pesquisa. É uma mentalidade burra, de um país visto
pela lente de advogados que
não conhecem como funciona
um centro de pesquisas", diz o
diretor da Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da
UFRJ), Luiz Pinguelli Rosa.
Segundo o cientista, se suas
verbas caírem na conta da universidade, e não na de sua fundação de apoio, a instituição
não terá condições de gerenciar
seus 700 projetos. Alguns deles
precisam de agilidade para contratar pessoal, realocar recursos ou fazer compras, afirma.
Como as fundações têm regime jurídico privado, elas não
precisam seguir a Lei de Licitações. O argumento de muitos
cientistas é que a lei cria lentidão sem impedir a corrupção,
pois não garante que a compra
seja feita pelo menor valor de
mercado: há atuação de cartéis.
José Raimundo Coelho, tesoureiro da SBPC (Sociedade
Brasileira para o Progresso da
Ciência), diz que a entidade está preocupada: "As pessoas não
têm ideia do tempo que pesquisadores perdem com questões
burocráticas. Fundações foram
criadas para garantir alguma
flexibilidade. Qualquer ação
que limite isso nos preocupa".
Ele admite que há casos de
fundações de apoio que extrapolam suas funções, mas diz
que não se deve generalizar.
Pedido de autonomia
O acórdão do TCU gerou
também reações na Justiça. A
UFMG (Universidade Federal
de Minas Gerais) conseguiu no
Supremo Tribunal Federal liminar que a autoriza a financiar projetos via fundações.
Gustavo Balduíno, secretário-executivo da Andifes (associação de reitores federais), diz
que a entidade trabalhará para
adequar universidades ao acórdão, mas pedirá a revisão de alguns tópicos e mais debates sobre a autonomia dos reitores na
gestão dos recursos.
"Nunca confundimos autonomia com soberania, mas há
questões em que temos divergência de interpretação com o
TCU. O órgão nunca questionou, por exemplo, o repasse de
agências como a Finep para
fundações de apoio. Isso pode
trazer grandes transtornos".
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