São Paulo, quinta-feira, 11 de março de 2010

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Greenpeace Internacional se abre para o Sul

Sul-africano Kumi Naidoo, militante de direitos humanos, assume direção executiva da organização

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

Os ancestrais indianos de Kumi Naidoo (pronuncia-se "naidu") foram levados para a África do Sul nos anos 1860. Ele nasceu Kumaran, mas adotou o prenome africanizado Kumi - "dez", em suaíli- por se considerar mais africano. Qualquer uma das nacionalidades ajudaria, contudo, a dar uma nova cara para o Greenpeace.
"Somos todos negros", diz Naidoo, 45, repetindo um dos slogans contra o apartheid na época em que o governo sul-africano tentava dividir os grupos étnicos não-brancos.
Seus bisavós indianos nunca imaginariam que ele chegaria aonde chegou: à direção de uma das mais famosas organizações ambientalistas do planeta, com 3 milhões de doadores (só pessoas físicas e fundações) e 200 milhões de euros de orçamento. É o primeiro diretor executivo internacional do grupo a nascer no hemisfério Sul.
Além disso, Naidoo não faz o tipo tradicional do militante ambientalista. O ativismo verde é recente na sua biografia.
Toda a formação política foi obtida no movimento de direitos civis da África do Sul. A investigação da morte do ativista Steve Biko (1946-1977) nas mãos da polícia, parcialmente relatada na imprensa, atraiu o interesse do adolescente. Ele se tornaria um líder estudantil três anos depois, em 1980, na cidade de Durban, a terceira maior da África do Sul.
Entre risadas, Naidoo recorda as palavras de ordem que os estudantes sublevados cantavam. No começo da passeata, pediam igualdade ("We want equality"). Na rabeira da marcha, já reivindicavam TVs em cores ("We want color TV"), exclusivas das escolas de brancos.
Naidoo foi preso algumas vezes, por alguns dias. Terminou expulso da escola, mas completou a formação secundária como autodidata, em exames similares ao supletivo brasileiro.
Entrou para a Universidade de Durban-Westville, onde estudou direito. Quando recebeu sinais cifrados de colegas presos de que seria o próximo alvo, exilou-se no Reino Unido, em 1987. Com uma bolsa Rhodes -"a mesma de Bill Clinton"-, fez doutorado em ciência política na Universidade de Oxford.
Com a libertação de Nelson Mandela, retornou à África do Sul em 1990. Teve início aí uma longa militância na defesa de direitos humanos, com ênfase no combate ao analfabetismo e à pobreza, em várias ONGs.
Tornou-se integrante do conselho do Greenpeace da África do Sul. Com apoio entusiasmado da filha Naomi, 17, candidatou-se em 2009 ao cargo de diretor executivo. Foi o escolhido entre cerca de mil candidatos, em novembro.
"O Greenpeace já se movia na direção de [ouvir mais as] vozes do Sul", afirmou Naidoo durante visita a São Paulo (o Brasil é um dos países prioritários para a organização, assim como China e Índia). "Mas é uma mudança significativa."
Algumas ONGs brasileiras se ressentem do paternalismo de congêneres estrangeiras, que usariam o apelo da floresta amazônica para levantar fundos sem investir na capacitação de militantes locais.
"Todas as desigualdades e contradições globais se manifestam também na sociedade civil global", confirmou Naidoo. "Pôr o assunto sobre a mesa é o primeiro passo."


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