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BIOLOGIA
Experiência faz peças menores montarem sozinhas em laboratório partes de proteínas, os tijolos dos organismos
Gás de vulcão é gatilho na origem da vida
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Se o célebre experimento de
Urey-Miller fosse um filme, esta
sem dúvida seria a continuação.
Usando gás de vulcão, pesquisadores nos EUA conseguiram fazer
com que um pedaço de proteína
-o tijolo básico usado na construção dos seres vivos- se construísse sozinho, a partir de seus
constituintes mais simples.
Verdade, a tarefa de reconstruir
todos os passos da origem da vida
em laboratório segue sendo um
sonho distante, mas trata-se de
um avanço no mínimo interessante. O sucesso veio de Luke Leman e Reza Ghadiri, do Instituto
de Pesquisa Scripps, e Leslie Orgel, do Instituto Salk para Estudos
Biológicos, todos na Califórnia.
O mais famoso experimento
que tentou reproduzir a origem
da vida foi executado em 1953,
por Harold Urey e seu estudante
de pós-graduação, Stanley Miller.
Eles reuniram num recipiente o
que se supunha ser a composição
da atmosfera terrestre nos primórdios de sua história e expuseram o material a raios ultravioleta, para simular a ação solar.
O resultado foi o surgimento de
vários aminoácidos, substâncias
orgânicas que estão na base da vida, a partir de compostos simples
como metano, amônia e água. A
partir daí, deu para começar a levar a sério a hipótese de que a
complexa química envolvida nos
processos vitais pudesse emergir
de um ambiente sem vida. Mas
esse era apenas o primeiro passo
de um longo caminho.
Até hoje, por exemplo, ninguém
havia conseguido dar direito o segundo passo. Sabe-se que os aminoácidos são encadeados em seqüência para formar as proteínas,
os tijolos dos organismos. Hoje,
com a vida já estabelecida, cabe a
fábricas especializadas dentro das
células, os ribossomos, a tarefa de
ler as receitas do código genético e
a partir delas montar as proteínas
encadeando aminoácidos, como
se brincasse com peças de Lego.
Mas, numa época em que não
havia nenhum ser vivo para brincar de Lego, alguma reação não-biológica precisou inventar o
brinquedo sozinha, para que ele
fosse depois incorporado à vida.
O experimento conduzido por
Leman, Ghadiri e Orgel dá um
passo tantalizante nessa direção.
Misturando aminoácidos a uma
substância chamada sulfureto de
carbonilo (a fórmula química, por
incrível que pareça, é bem mais
simpática: COS), eles conseguiram obter a formação de peptídeos, cadeias maiores de aminoácidos que consistem em pedaços
de proteína. E isso em apenas alguns minutos de reação, a uma
temperatura ambiente.
Os resultados foram relatados
na última edição do periódico
científico americano "Science"
(www.sciencemag.org).
O verdadeiro herói da façanha é
o COS, um gás comum produzido
por vulcões. Portanto, caso os
pesquisadores estejam na trilha
certa, a origem da vida deve estar
ligada a ambientes radicais, como
em fossas termais no oceano ou
próximo a terrenos vulcânicos.
"Esse é um cenário bem popular
agora", diz Orgel, quase oferecendo a porta da rua ao velho cenário
de que a vida teria surgido num
lago morno, como sugeriu o britânico Charles Darwin (1809-1882), criador da teoria da origem
das espécies pela seleção natural.
Ainda assim, o pesquisador diz
que é cedo para incluir seus resultados na lista de clássicos como o
experimento de Urey-Miller.
"Ainda não entendemos muito
dos primeiros passos na origem
da vida, então é difícil estimar a
relevância de qualquer conjunto
particular de experimentos."
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