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"Há muitos problemas a resolver em ciência"
DA REDAÇÃO
"Não posso falar agora. A
chanceler Angela Merkel está
me ligando." Uma hora depois
de receber a notícia de Estocolmo, Gerhard Ertl já sente o primeiro efeito do Nobel: virar o
homem mais requisitado do
mundo por um dia.
Inúmeras tentativas e quatro
negativas depois, Ertl atende o
telefone do escritório, no instituto berlinense que leva o nome de Fritz Harber, vencedor
do Nobel de 1918 pela descoberta da reação que Ertl desvendaria décadas depois.
Dizendo-se "assoberbado"
com o prêmio -e implorando
ao repórter que fosse breve-, o
cientista alemão concedeu entrevista à Folha, expressou ceticismo em relação a uma das
maiores promessas da química
de superfícies -as células de
combustível para produzir
energia a partir da quebra do
hidrogênio- e deu um conselho aos jovens cientistas: "Há
muitos problemas a serem resolvidos no futuro".
(CA)
FOLHA - Nós freqüentemente vemos Prêmios Nobel serem concedidos a pessoas que desenvolvem novas ferramentas ou teorias. O seu foi
por um modo de aplicar essas ferramentas. Há um conflito entre esses
dois modos de fazer ciência?
GERHARD ERTL - Não. São duas
áreas completamente distintas.
Sempre que você quer começar
um novo campo, você precisa
desenvolver novas ferramentas
para responder às questões que
você precisa fazer. A transformação contínua do desenvolvimento em experimentação e
novos vislumbres são aquilo
que permite que avancemos.
FOLHA - O sr. acha que os prêmios
em Química estão ficando mais difíceis de conceder? Ainda há espaço
na sua área de pesquisa para grandes revoluções?
ERTL - Se você olhar para os últimos anos, vários desses prêmios foram para o campo da
bioquímica e da pesquisa biomédica. Eu acho que a maioria
das inovações virá dessas áreas
nos próximos anos. Mas há várias coisas na química também,
muita coisa em ciência de materiais. A descoberta de [Peter]
Grünberg em física [sobre a resistência magnética de metais
em escala nanométrica] é, de
certa maneira, relacionada à
química. Há muito espaço para
mais inovação.
FOLHA - O sr. imaginava que seus
estudos sobre monóxido de carbono
e platina levariam a uma aplicação
tão disseminada como os catalisadores de automóvel?
ERTL - Isso era conhecido como
catalisador desde a década de
1920, mas a aplicação prática
em catalisadores só veio depois
dos anos 1960. As aplicações
práticas foram desenvolvidas
muito antes que se entendessem os detalhes do processo.
Isso acontece com freqüência:
as aplicações funcionam, mas
você não entende por quê.
FOLHA - Existe algum dos resultados da química de superfície do qual
o sr. se orgulhe em especial?
ERTL - Há muitos aspectos diferentes da química de superfície, e aquilo que nós fizemos
sempre foi pesquisa básica. Eu
tenho orgulho de poder ter
contribuído um pouquinho para o nosso entendimento desses processos. Não é um processo particular que eu tenho
em mente; foi todo o novo campo que se abriu.
FOLHA - Qual é o futuro da tecnologia das células de combustível, em
sua opinião?
ERTL - Há muitos problemas
com células de combustível que
ainda precisam ser resolvidos, e
em minha opinião não tem havido muitos progressos nos últimos anos. Nós precisamos de
um grande avanço nesse campo, mas francamente eu não vejo de onde ele poderia vir.
FOLHA - Que conselho o sr. daria a
um jovem cientista que estivesse começando hoje?
ERTL - A ciência é sempre interessante. Se você se interessa
por ciência, persiga-a até o fim,
porque há muitos problemas a
serem resolvidos no futuro.
FOLHA - Como o sr. se sente ao ganhar o Nobel?
ERTL - Assoberbado! Ainda não
me dei conta inteiramente do
que isso significa.
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