São Paulo, quinta-feira, 11 de outubro de 2007

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"Há muitos problemas a resolver em ciência"

DA REDAÇÃO

"Não posso falar agora. A chanceler Angela Merkel está me ligando." Uma hora depois de receber a notícia de Estocolmo, Gerhard Ertl já sente o primeiro efeito do Nobel: virar o homem mais requisitado do mundo por um dia.
Inúmeras tentativas e quatro negativas depois, Ertl atende o telefone do escritório, no instituto berlinense que leva o nome de Fritz Harber, vencedor do Nobel de 1918 pela descoberta da reação que Ertl desvendaria décadas depois.
Dizendo-se "assoberbado" com o prêmio -e implorando ao repórter que fosse breve-, o cientista alemão concedeu entrevista à Folha, expressou ceticismo em relação a uma das maiores promessas da química de superfícies -as células de combustível para produzir energia a partir da quebra do hidrogênio- e deu um conselho aos jovens cientistas: "Há muitos problemas a serem resolvidos no futuro". (CA)

 

FOLHA - Nós freqüentemente vemos Prêmios Nobel serem concedidos a pessoas que desenvolvem novas ferramentas ou teorias. O seu foi por um modo de aplicar essas ferramentas. Há um conflito entre esses dois modos de fazer ciência?
GERHARD ERTL
- Não. São duas áreas completamente distintas. Sempre que você quer começar um novo campo, você precisa desenvolver novas ferramentas para responder às questões que você precisa fazer. A transformação contínua do desenvolvimento em experimentação e novos vislumbres são aquilo que permite que avancemos.

FOLHA - O sr. acha que os prêmios em Química estão ficando mais difíceis de conceder? Ainda há espaço na sua área de pesquisa para grandes revoluções?
ERTL
- Se você olhar para os últimos anos, vários desses prêmios foram para o campo da bioquímica e da pesquisa biomédica. Eu acho que a maioria das inovações virá dessas áreas nos próximos anos. Mas há várias coisas na química também, muita coisa em ciência de materiais. A descoberta de [Peter] Grünberg em física [sobre a resistência magnética de metais em escala nanométrica] é, de certa maneira, relacionada à química. Há muito espaço para mais inovação.

FOLHA - O sr. imaginava que seus estudos sobre monóxido de carbono e platina levariam a uma aplicação tão disseminada como os catalisadores de automóvel?
ERTL
- Isso era conhecido como catalisador desde a década de 1920, mas a aplicação prática em catalisadores só veio depois dos anos 1960. As aplicações práticas foram desenvolvidas muito antes que se entendessem os detalhes do processo. Isso acontece com freqüência: as aplicações funcionam, mas você não entende por quê.

FOLHA - Existe algum dos resultados da química de superfície do qual o sr. se orgulhe em especial?
ERTL
- Há muitos aspectos diferentes da química de superfície, e aquilo que nós fizemos sempre foi pesquisa básica. Eu tenho orgulho de poder ter contribuído um pouquinho para o nosso entendimento desses processos. Não é um processo particular que eu tenho em mente; foi todo o novo campo que se abriu.

FOLHA - Qual é o futuro da tecnologia das células de combustível, em sua opinião?
ERTL
- Há muitos problemas com células de combustível que ainda precisam ser resolvidos, e em minha opinião não tem havido muitos progressos nos últimos anos. Nós precisamos de um grande avanço nesse campo, mas francamente eu não vejo de onde ele poderia vir.

FOLHA - Que conselho o sr. daria a um jovem cientista que estivesse começando hoje?
ERTL
- A ciência é sempre interessante. Se você se interessa por ciência, persiga-a até o fim, porque há muitos problemas a serem resolvidos no futuro.

FOLHA - Como o sr. se sente ao ganhar o Nobel?
ERTL
- Assoberbado! Ainda não me dei conta inteiramente do que isso significa.


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