São Paulo, segunda-feira, 11 de novembro de 2002

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QUÍMICA

Aparelho, cuja invenção ganhou o Nobel, foi feito no Instituto de Física e custou um décimo do preço de um importado

USP constrói "balança" de proteína a laser

Luciana Cavalcanti/Folha Imagem
O físico Eduardo Macchione verifica seu espectômetro na USP


CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Os físicos gostam de dizer que a biologia estaria perdida sem eles. Um grupo do Instituto de Física da USP está ajudando a inflar ainda mais o ego da categoria, ao construir o primeiro aparelho no país que usa laser para analisar moléculas biológicas.
O instrumento tem um nome indecifrável: espectrômetro de massa de ionização por dessorção a laser com auxílio de matriz (Maldi, na sigla em inglês). Mas sua função pode ser definida de um jeito bem simples: uma balança para pesar proteínas.
O Maldi, cuja invenção rendeu o Prêmio Nobel de Química deste ano para o japonês Koichi Tanaka, é a principal ferramenta dos estudos de proteômica, ciência que busca entender como as proteínas interagem para pôr um organismo em funcionamento.
Por ser de operação delicado, também é um aparelho caro: um espectrômetro de massa para proteômica custa, em média, cerca de US$ 500 mil.
A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que pretendia comprar Maldis para executar seu projeto proteoma, teve de desistir da idéia após a desvalorização do real, no começo do semestre. Precisou se contentar com um empréstimo de duas máquinas durante seis meses para iniciar o trabalho.
O Maldi feito pelo grupo do LIP (Laboratório de Instrumentação e Partículas), do Instituto de Física, também financiado pela Fapesp, saiu bem mais em conta: US$ 50 mil da concepção à construção. Mas que ninguém pense que o objetivo do grupo da USP é produzi-los em série para atender ao projeto proteoma.
"A nossa idéia é desenvolver a tecnologia e treinar pessoal", diz a física nuclear Suzana Salem Vasconcelos, do LIP. "Isso não é um equipamento que vise aplicação comercial", afirmou.
O aparelho de Maldi foi projetado e construído ao longo dos últimos dois anos pelo grupo de Vasconcelos, do qual também fazem parte os pesquisadores Olacio Dietzsch, Eduardo Macchione, Kiyomi Koide e José Hirata. Ele está sendo testado na análise de polímeros (longas cadeias de uma mesma molécula) e, dentro de seis meses, deverá ser usado rotineiramente com proteínas.
O Maldi "pesa" as moléculas bombardeando a amostra que se quer estudar com pulsos de laser. A energia faz com que a proteína fique carregada eletricamente (ionizada). Nesse estado, ela pode ser submetida a um campo elétrico num tubo de vácuo e "voar" por esse tubo até um detector.
A massa da proteína, então, pode ser calculada. Quanto mais leve a molécula, menos tempo ela leva para atravessar o tubo. A combinação de carga e tempo de vôo permite identificar a "assinatura" de cada proteína.
O grupo já tem em funcionamento um outro espectrômetro que também "pesa" moléculas orgânicas, mas usando uma técnica mais antiga: o bombardeamento da amostra e feito por partículas de califórnio (um elemento radioativo) em vez de laser. Ele tem sido usado com sucesso em colaboração com bioquímicos da USP para a identificação de pigmentos em algas e de peptídeos (pequenas proteínas) em feijão.
Nenhum dos aparelhos tem desempenho semelhante a um comercial. Mas o grupo do LIP não troca a sua traquitana por nenhuma outra. "Quando você importa um equipamento, está comprando uma caixa preta", diz Macchione. "Aqui podemos ajustar o aparelho às nossas necessidades."
O grupo diz de saída que não tem nenhuma intenção de montar uma empresa para fazer espectrômetros em série. "[Mas" não tenho restrição nenhuma em passar para a frente os desenhos e o conhecimento da tecnologia", diz Vasconcelos.


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