São Paulo, quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

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Genômica não rende patentes ao país

Dez anos após cientistas brasileiros sequenciarem o genoma do amarelinho, ele continua atacando laranjais

Estudo inédito mostra que conhecimento teve dificuldade para sair da universidade e virar inovação tecnológica


SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO

O Brasil saiu na frente em biologia molecular quando sequenciou o genoma da Xylella fastidiosa, causadora do "amarelinho" da cana, em 2000. Mas os resultados do investimento, pelo menos em número de patentes, foram abaixo do esperado.
É isso que mostra um levantamento feito pelo cientometrista da USP Rogério Meneghini e pelo seu orientando Estêvão Gamba.
Em um artigo que será publicado em maio nos anais da ABC (Academia Brasileira de Ciências), eles revisaram dez anos de patentes de biologia molecular, de 1996 a 2007 (em geral, esse tipo de análise se debruça a partir dos últimos três anos).
A base verificada foi a americana USPTO, em que são registradas marcas e patentes de todo o mundo.
Nesse período, o Brasil teve um total de 279 registros de patentes em biologia molecular. O número é menos da metade do México (776) e de um terço da China (996).
Mesmo assim, o crescimento de patentes do país na área foi de 3.700%.
"É preciso lembrar que partimos praticamente do zero em patentes de biotecnologia. Sob esse ponto de vista, crescemos muito", explica o engenheiro agrônomo Sérgio Salles-Filho. Ele é especialista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) em política científica.
No entanto, o aumento da China no mesmo período foi de 5.275%. Em 1996, aquele país só tinha quatro patentes em biologia molecular.
"Os números do Brasil mostram que a atividade de produção tecnológica é baixa", explica Salles-Filho.

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De fato, em termos de produção científica em biologia molecular, ou seja, artigos publicados, os números são bem diferentes.
Num ranking feito por Meneghini a partir da base de dados bibliográfica "Scopus", o país teve um crescimento de 515% em artigos na área -e só perdeu para a China (que cresceu 1.243%).
"Isso se deve a uma questão cultural. Ainda temos pouca cultura de patenteamento", complementa Salles-Filho, da Unicamp.

PIONEIRISMO
Em 2000, o sequenciamento da bactéria do "amarelinho", que causa o entupimento dos vasos da planta e atinge cerca de 30% dos laranjais paulistas, foi capa da revista "Nature" e colocou o Brasil como protagonista na genômica internacional.
A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) investiu cerca de US$ 12 milhões nas pesquisas da Xylella, que reuniram quase 200 cientistas em 35 laboratórios do país.
Hoje, porém, a rede de sequenciamento foi desfeita, e a doença do citrus continua sem cura -apesar de que a "cura" não era um objetivo inicial das pesquisas. O foco, de acordo com a Fapesp, era formar pessoas na área.
Além disso, algumas empresas de base tecnológica emergentes acabaram mudando de percurso.
Exemplos disso são a Allelyx e a Canavialis, compradas pela multinacional Monsanto em 2008 por R$612 milhões. Ambas foram fundadas em 2002 com capital de risco da Votorantim.
Para o biólogo Fernando Reinach, fundador da Allelyx e diretor-executivo da Votorantim Novos Negócios, é esperado que empresas de fundo de risco sejam vendidas.
Mas, na época, a negociação foi criticada pelo governo e, conforme a Folha apurou, acabou retraindo os investimentos públicos em empresas de base tecnológica.
De acordo com Reinach, a Allelyx teve cerca de 30 patentes registradas na USPTO entre 1996 e 2007. "Mas não basta analisar número de patentes. É preciso ver o que elas geraram de lucro", diz.
Em editorial recente publicado na "Nature", a revista cobrou uma postura mais agressiva da ciência brasileira na área de biotecnologia. Mas afirmou: "A Xylella mudou a percepção do Brasil de si mesmo e seu lugar no mundo da ciência".


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